ÉPOCA
O Brasil em 2020
Por que vivemos num país mais adulto, mais rico e mais feliz
Onze anos é uma idade extraordinária. Uma explosão de hormônios inicia o processo de crescimento acelerado da adolescência. A formação de neurônios, que até então era caótica, começa a ser ordenada, e a camada de mielina que os envolve, responsável pelo transporte das informações, engrossa. Nessa época, esculpem-se os caminhos do raciocínio elaborado que marcará a vida adulta. E essas transformações vão tornar a pessoa mais rápida, inteligente, criativa, inovadora, idealista. Nós, de ÉPOCA, gostamos de acreditar que usamos todas essas qualidades para construir cada edição. Sabemos, é claro, que uma revista não é uma pessoa. Mas ela é feita de pessoas. Nesta semana, como qualquer criança de 11 anos, estamos eufóricos com nossa festa de aniversário – e ao mesmo tempo não conseguimos conter a expectativa pelo futuro que vislumbramos. Esses dois sentimentos, satisfação e esperança, nos guiaram a preparar um mapa das grandes transformações por que passaremos no país.
Será, é claro, um Brasil diferente sob vários aspectos. A maior parte deles, imprevisível. Uma década é um período longo o suficiente para derrubar certezas absolutas (ninguém prediz uma Revolução Francesa, uma queda do Muro de Berlim ou um ataque às torres gêmeas de Nova York). Mas é também um período de maturação dos grandes fenômenos incipientes – dez anos antes da popularização da internet já era possível imaginar como ela mudaria o mundo. Da mesma forma, fenômenos detectáveis hoje terão seus efeitos mais fortes a partir de 2020.
O primeiro deles será a mudança populacional brasileira. Nos anos 1960 e 1970, os estudiosos se preocupavam com a “bomba demográfica”: as altíssimas taxas de natalidade, de seis filhos por mulher, criavam uma pressão social que atrasava o progresso do país pela exigência de investimentos pesados em cuidados com a infância. Esse problema sumiu, quase por encanto. A urbanização, a entrada das mulheres no mercado de trabalho e os novos métodos anticoncepcionais fizeram a taxa de natalidade declinar, até o atual índice de 1,8 filho por mulher. A mudança do perfil demográfico (leia o quadro da próxima página) dá uma janela de oportunidade ao Brasil. Pela primeira vez, teremos mais gente no mercado de trabalho que fora dele. Mais trabalhadores que dependentes. Mais produtores que consumidores de riqueza. A janela se fechará a partir da década seguinte, com o aumento do número de idosos. Esta década é, portanto, aquela em que temos as melhores condições para resolver os problemas estruturais do país (o que o Brasil precisa fazer para crescer mais e melhor). É uma tarefa hercúlea. Mas, como disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva: “Se cada presidente deixar um conjunto de obras estruturantes para o sucessor, o país dará um salto de qualidade nos próximos 20 anos”.
Luiz Inácio Lula da Silva – “Quem vier depois de mim vai pegar o país mais preparado”
Se o Brasil é um país mais perto do futuro, não há dúvida de que pelo menos o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já chegou lá. Seu governo exibe os mais altos índices de aprovação popular de nossa história política. Nas aparições internacionais, Lula acumula sinais de prestígio crescente com os chefes de Estado e é personagem de reportagens elogiosas dos principais veículos da imprensa mundial. Graças a um sistema financeiro fortalecido por uma política de austeridade que contrariou os principais dogmas do PT, o Brasil de Lula enfrenta a crise global com um desemprego imenso e recessão em vários setores da economia – mas o ambiente é menos sofrido e menos pessimista que nos países centrais. De olho no futuro imediato de sua herança política, que defenderá nos palanques de 2010, Lula recebeu ÉPOCA para falar do Brasil de 2020. De bom humor, chegou à sala de reuniões de seu gabinete pessoal, montado no Centro Cultural Banco do Brasil – para onde foi transferido o governo enquanto o Palácio do Planalto está em reforma –, falando de futebol. Disse que seu sonho, ao deixar o governo, é virar cartola do Corinthians. Depois, Lula concedeu uma entrevista que durou uma hora e 18 minutos. Nas páginas seguintes, uma seleção dos principais trechos.
Fernando Henrique Cardoso – “O país do futuro já está aqui”
A sede do instituto Fernando Henrique Cardoso fica na região central de São Paulo, numa área que mistura o charme de prédios antigos a uma paisagem de degradação urbana que, aos poucos, vive um lento processo de recuperação. Ao receber a reportagem de ÉPOCA numa tarde chuvosa, Fernando Henrique primeiro se queixa da dificuldade de adaptação à rotina paulistana e dos problemas que afetam todo morador da metrópole. “Com essa chuva, o trânsito vai ficar um inferno”, diz ele. O senhor prestes a completar 78 anos pede então um café e começa a discorrer sobre o futuro do Brasil com a mesma paixão intelectual que o move há décadas. Apesar do tom otimista, ele vê dois grandes desafios para o país: educação e segurança pública. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Zoghbi tinha esquema também com seguros de vida
A grande família Zoghbi não para de causar espanto. Há um mês, ÉPOCA revelou o envolvimento de João Carlos Zoghbi, ex-diretor de Recursos Humanos do Senado, na criação de empresas que usavam testas de ferro para ocultar o recebimento de quantias milionárias pagas por bancos com autorização do Senado para fazer empréstimos consignados – com desconto em folha de pagamentos – para os funcionários da instituição. O principal laranja é uma senhora de 83 anos, Maria Izabel Gomes, que foi ama de leite e babá de João Carlos. Agora, ÉPOCA descobriu que o esquema com a ex-babá também foi usado por João Carlos para explorar outro filão de negócios feitos com funcionários do Congresso, além dos empréstimos consignados: o da corretagem de seguros de vida.
Os negócios envolviam a família Zoghbi, em uma ponta; o Sindilegis, o sindicato dos servidores do Senado, da Câmara dos Deputados e do Tribunal de Contas da União (TCU), em uma segunda; e a empresa Companhia Mutual de Seguros, em uma terceira. Eles foram feitos em 2005, quando João Carlos Zoghbi procurou a presidência do Sindilegis com uma proposta: contratar para 11 mil funcionários do Congresso e do TCU, filiados ao sindicato, um acordo coletivo de seguro de vida. Na ocasião, o Sindilegis era dirigido por Ezequiel Nascimento, atual secretário de Políticas Públicas de Emprego do Ministério do Trabalho. Ezequiel, que é filiado ao PDT e foi candidato em 2006 ao Senado no Distrito Federal, gostou da conversa e os detalhes da parceria entre o Sindilegis e a família Zoghbi foram acertados por um irmão de João Carlos – Luís Fernando Zoghbi, ex-funcionário do Senado demitido por nepotismo.
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Ela e os golpistas
A internação da ministra Dilma Rousseff provocou um grave efeito colateral na democracia: a volta do golpe do terceiro mandato para Lula
Desde a eleição do presidente Lula, em 2002, o PT trabalha com a meta explícita de se manter no poder por vinte anos. É uma aspiração justa e natural de um grupo que construiu uma história e se legitimou politicamente no Brasil. Antes de cair em desgraça no escândalo do mensalão, o candidato natural à sucessão de Lula era o ex-ministro José Dirceu. A segunda opção lógica recaiu sobre o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, também abatido na investigação sobre a quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Desde o ano passado, a opção vem sendo Dilma Rousseff, a gestora eficiente, gerente do governo e coordenadora das principais obras federais. Há um mês, porém, a ministra descobriu ser portadora de um câncer linfático. Como, ainda mais do que a natureza, a política abomina o vácuo, a quase certeza médica da cura total da ministra tem sido pouco para neutralizar os movimentos de busca de um novo candidato. Na semana passada, Dilma foi internada às pressas em São Paulo para tratar dos efeitos colaterais do tratamento quimioterápico a que se submete (veja o quadro). O apelo da ministra para que não misturassem sua saúde a questões políticas caiu no vazio. A notícia atiçou os aliados do governo, que, mais uma vez, se encarregaram de fundir as duas coisas, só que agora acoplando alternativas golpistas – como a de um terceiro mandato para Lula ou a simples prorrogação do atual mandato do presidente.
O deputado Jackson Barreto, do PMDB de Sergipe, que se diz amigo de Lula desde os tempos do sindicalismo, anunciou que vai apresentar na Câmara um projeto de emenda constitucional que prevê a realização de um plebiscito para que a população decida se Lula poderá concorrer a um terceiro mandato. O deputado Sandro Mabel, líder do PR, outro partido aliado do governo, apareceu com uma novidade de arrepiar: ele quer aprovar um projeto de sua autoria prevendo a prorrogação por mais dois anos dos mandatos do presidente, dos governadores, senadores, deputados federais e estaduais. A justificativa oficial é permitir a coincidência do calendário eleitoral em 2012. Até o fim da reeleição com a adoção de mandatos de cinco anos, o que daria mais um ano de Presidência para Lula, voltou a ser discutida como alternativa em reuniões de congressistas aliados do governo.
Começou bem mal
A CPI da Petrobras, criada para investigar contratos suspeitos, é tomada de assalto pela turma que gosta de cargos – principalmente na própria estatal
Se fosse um país, a Petrobras, a maior empresa brasileira e uma das maiores petrolíferas do mundo, seria uma nação mais rica que a Nova Zelândia. Com um faturamento anual de 284,8 bilhões de reais e guardiã das economias de 200 000 acionistas privados, a estatal é um patrimônio e, na visão do nacionalismo exacerbado, até um símbolo da pátria. Na semana passada, não bastasse estar sob o crivo de uma comissão de investigação, a Petrobras virou objeto de uma vergonhosa disputa política entre parlamentares cobiçosos de cargos e riquezas. Nos próximos 180 dias, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) investigará especificamente sete negócios realizados pela empresa nos últimos anos. Não se sabe o potencial inflamável das suspeitas que motivaram a instalação da CPI, tampouco se haverá combustível político suficiente para extrair delas alguma medida saneadora na hipótese de se materializarem mesmo algumas irregularidades. Fosse isso, seria o caso de celebrar o bom funcionamento das instituições. Mas não se subestime a esperteza do atual Congresso. Instalada a CPI, as raposas trataram de lucrar pessoalmente com ela.
Proposta pela oposição, a CPI é, no entanto, controlada pelo partido aliado do governo, o PMDB, aquele que, conforme o desabafo de um de seus próceres mais ilustres, o senador Jarbas Vasconcelos, “só pensa em cargos e corrupção”. Nas mãos do PMDB, a CPI vira uma incógnita, e seu eventual desfecho dependerá da tradicional barganha por cargos e privilégios, matéria-prima política do partido. Para se ter uma ideia do tipo de manobras em curso, o candidato a investigador-mor da CPI é ninguém menos que o ex-presidente Fernando Collor, derrubado da Presidência da República em 1992 por corrupção graças justamente aos trabalhos de uma CPI. Secundando Collor, aparece outro notório parlamentar, o senador Renan Calheiros, um tipo que só se move por interesse próprio e de seu nebuloso grupo político-empresarial. Estão o tempo todo em busca de cargos e acesso ao Erário. Renan encara a CPI da Petrobras, cuja instalação ele apoiou, como uma excelente oportunidade de negócio. Seus representantes na CPI, como sempre, vão apoiar o governo em troca de favores. O grupo já colocou no pano verde sua principal reivindicação: a nomeação de um aliado para o cargo de diretor da Petrobras responsável pelo pré-sal, a bilionária reserva encontrada a 7 000 metros de profundidade no litoral sudeste. “Ninguém tem o direito de se surpreender com as práticas fisiologistas do PMDB”, afirmou Jarbas Vasconcelos. Mas ainda assim o senador Pedro Simon ficou chocado: “Isso é um escândalo. Sinto-me envergonhado. Eles pelo menos deveriam fingir alguma decência”. Isso, sim, seria novidade de espantar os mais incrédulos.
Melhor uma governadora nas mãos…
Por que os políticos gaúchos preferem desprezar os indícios de que Yeda Crusius usou caixa dois na sua campanha ao governo do estado
A governadora gaúcha, Yeda Crusius, do PSDB, está conseguindo evitar que a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul instale uma CPI para apurar indícios, revelados por VEJA, de que sua campanha ao governo foi abastecida com recursos de caixa dois. Até sexta-feira da semana passada, só dezesseis deputados haviam assinado o requerimento da CPI – três a menos do que o necessário. É provável que a comissão jamais seja instalada. Não pelo apoio que a governadora angariou, mas porque é mais conveniente para muitos políticos do estado. Os partidos que a sustentam – e mesmo parte da oposição – preferem que Yeda se mantenha fragilizada no cargo. Assim, ela seria obrigada a apoiar um aliado à sua sucessão, em 2010. Tudo indica que esse candidato será o prefeito de Porto Alegre, José Fogaça, do PMDB. O cenário agrada ao PSDB nacional, que está mais preocupado em garantir o apoio do PMDB a seu candidato a presidente, o governador paulista José Serra.
Esses cálculos quase foram por terra na quinta-feira passada, depois que aliados mais afoitos de Yeda na Assembleia pediram o impeachment do vice-governador Paulo Feijó, do DEM. Feijó rompeu com a governadora ainda durante a campanha eleitoral de 2006 e é acusado de usar o cargo para celebrar um contrato entre uma de suas empresas e uma universidade local. O vice alega que a universidade é privada e, por esse motivo, não cometeu nenhuma irregularidade. O pedido de impeachment levou dois deputados ligados a Feijó a engrossar o coro a favor da CPI, e a comissão quase foi viabilizada. Para impedir a sua instalação, os assessores de Yeda pressionaram até prefeitos.
CARTA CAPITAL
Nossos 15 anos
Nesta edição comemorativa de 15 anos de CartaCapital, os personagens, as empresas e as ideias que fizeram história. No Brasil e no mundo
A arena de 2010
Sem o apoio cego do DEM, o PSDB emplaca a comissão para investigar a Petrobras
Com os oponentes praticamente definidos, faltava uma arena para os safanões e golpes baixos comuns à sucessão presidencial. A eleição de 2010 está cada vez mais perto e o PSDB decidiu escolher o campo de batalha. Os tucanos conseguiram instalar a CPI da Petrobras, sem contar com a anuência cega do velho parceiro, o DEM, e agora tentam impedir que a comissão já nasça falida e falecida.
O governismo, por seu lado, procura dar o troco. As lideranças petistas e movimentos sociais simpáticos ao governo Lula trabalham para grudar no PSDB a pecha de privatista. Para esse grupo, o interesse da CPI é apressar o processo de privatização da estatal petrolífera. Alguns tucanos acusaram o golpe e passaram boa parte da semana a negar a acusação e ameaçam processar os “difamadores”.
As dores e o fair play da ministra
Dilma Rousseff deverá, contra a vontade, mas a conselho dos médicos, reduzir o ritmo de trabalho
Apesar do próprio otimismo, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, começou a sofrer os efeitos do tratamento quimioterápico a que se submete devido a um linfoma. Na segunda-feira 18, sentiu fortes dores nas pernas e teve de ser levada durante a madrugada para o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. “Tenho uma reação forte se tirar a cortisona”, explicou, ao receber alta, na quarta-feira 20.
A ministra deverá, contra a vontade, mas a conselho dos médicos, reduzir o ritmo de trabalho. Em relação às fotos em que aparecia segurando o cabelo, publicadas por alguns jornais, ela demonstrou fair play. “Estou usando uma peruquinha básica.”
Os escolhidos
Corpo estranho na privatização da Telebrás, em 1998, a dupla comanda agora a maior empresa do setor
À época da privatização do Sistema Telebrás, em 1998, dizia-se que Sérgio Andrade e Carlos Jereissati, os dois empresários que assumiram a maior fatia da telefonia brasileira, ao menos geograficamente falando, não permaneceriam muito tempo no negócio. Tanto o primeiro, dono da construtora Andrade Gutierrez, quanto o segundo, do Grupo La Fonte, tinham pouca ou nenhuma experiência na atividade. Emergiram vitoriosos sob críticas por terem levantado com o BNDES a maior parte dos recursos necessários a honrar o arremate.
Dez anos depois, a dupla de empresários não só permanecia à frente da Telemar, já com o nome mudado para Oi, como conseguiu tornar inequívoco o reinado na telefonia nacional. Com a aquisição da Brasil Telecom, tornaram-se os acionistas majoritários da maior empresa de telecomunicações do País, dona de 65% da telefonia fixa, 42% do mercado de banda larga e 17% dos assinantes da telefonia celular.
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