Veja
Basta de folia com o dinheiro público
Da extensa lista das peculiaridades brasileiras, três itens se destacam: o samba, a jabuticaba e o PMDB. México e Argentina, para ficar em alguns exemplos, já penaram sob partidos tão fortes quanto corruptos, mas a agremiação nacional, a maior do país, é um caso à parte. Seu amor pelo dinheiro público – o nosso dinheiro, para ser mais exato – é tão grande, tão magnético, tão irresistível que o PMDB abdicou de almejar a Presidência da República, a aspiração suprema de qualquer partido político, para vender seu apoio a outras siglas e, assim, continuar a fazer negócios nos ministérios e demais repartições federais. Seja no plano federal, estadual ou municipal, o objetivo principal do PMDB tornou-se o mesmo: cair na folia com o dinheiro público, como se ele crescesse em jabuticabeiras.
Festa com dinheiro público não é uma novidade, tampouco é prerrogativa dos peemedebistas. O senador gaúcho Pedro Simon, do PMDB, um nome de respeito da agremiação, reagiu à entrevista de seu colega Jarbas Vasconcelos a VEJA com a explicação de que a corrupção transformou a política em uma "geleia geral" da qual pouquíssimos escapam, sejam eles de que partido forem. Do ponto de vista prático, a reação de Simon é conivente com os corruptos, pois em nada avança no seu combate. Mas ela é uma expressão da verdade. Nessa geleia, porém, o PMDB se destaca pela constância dos métodos e pela durabilidade da delinquência. O partido é hoje para a corrupção na política o que a "inflação inercial" foi para a economia até o advento do Plano Real – ou seja, a força motriz das malfeitorias de um regime ao seguinte, de um governante a seu sucessor, sejam quais forem suas cores ideológicas. Nas palavras do senador pernambucano Jarbas Vasconcelos, "boa parte do PMDB quer mesmo é corrupção" e "a maioria de seus quadros se move por manipulação de licitações e contratações dirigidas". Não se trata de percepção ou impressão, mas de uma constatação feita por um político com 43 anos de vida pública, fundador da agremiação e conhecedor de suas entranhas. Diante da bomba, o que fez a cúpula do PMDB? Limitou-se a lançar uma nota em que diz que não daria maior atenção a Jarbas Vasconcelos "em razão da generalidade das alegações", para depois recolher-se em silêncio, na esperança de que a explosão perca força na Quarta-Feira de Cinzas. Ninguém ousou assinar o texto. Individualmente, houve alguns simulacros de protesto, na maioria enviesados com cobranças por nomes, fatos e provas da corrupção. Como se não coubesse ao próprio PMDB realizar uma investigação interna. Uma das poucas demonstrações de apoio a Jarbas Vasconcelos partiu do ex-governador de São Paulo Orestes Quércia, seu colega de partido. Sim, você leu certo: Quércia. O senador pernambucano poderia ter aumentado a octanagem de sua denúncia se tivesse publicamente dispensado o apoio de Quércia. Dissiparia assim as insinuações maldosas de que agiu mais por motivação eleitoreira (Jarbas seria candidato a vice-presidente na chapa que seria encabeçada pelo governador paulista José Serra em 2010 e por isso teria interesse em poupar Quércia, de cujo apoio a dupla pode vir a precisar).
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Antes tarde…
O Tribunal Superior Eleitoral confirmou, na semana passada, a cassação do governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima (PSDB). Ele teve de dar lugar a José Maranhão (PMDB), o segundo colocado na eleição de 2006, depois que o TSE derrubou o recurso que o mantinha no cargo desde o fim do ano passado, quando o tucano teve o mandato cassado. Cunha Lima foi acusado de ter garantido os votos para sua reeleição, em 2006, por meio de um programa de renda mínima que distribuiu 35 000 cheques durante a campanha. A farra custou 3,5 milhões de reais aos cofres públicos. Entre os beneficiados – que receberam de 100 a 36 500 reais – havia até gente do alto escalão do governo. O ex-governador da Paraíba é o terceiro cassado desde 1999, quando a lei eleitoral estabeleceu a perda de mandato como punição para os casos de corrupção eleitoral. Antes dele, haviam sido afastados os governadores Mão Santa (Piauí, em 2001) e Flamarion Portela (Roraima, em 2004). O próximo da lista é Jackson Lago (PDT), do Maranhão, acusado de irregularidades como distribuição de centenas de kits de salvamento e cestas básicas a pescadores e criação de vários convênios com propósitos eleitoreiros. Há outros seis governadores com a cabeça a prêmio. Se todos forem cassados, no fim do ano quase um terço dos governadores do país terá perdido o mandato.
Sim, era tudo mentira
Ao contrário do que havia afirmado ao namorado, à polícia e à família, a advogada brasileira Paula Oliveira, 26 anos, não foi agredida por três skinheads (tal ataque jamais aconteceu), não teve o corpo retalhado à força por estilete (ela se automutilou) e também não sofreu um aborto de gêmeos (simplesmente não estava grávida). A confissão foi feita à polícia de Zurique no último dia 13, mas só veio à tona na semana passada, depois que uma revista suíça divulgou a notícia e a promotoria de Zurique a confirmou. A semanal Die Weltwoche – que apoia o Partido do Povo Suíço, cujas siglas Paula gravou a faca nas pernas e no abdômen – publicou que a brasileira admitiu a mentira depois de ser confrontada com resultados médicos que indicavam que não esteve grávida recentemente. Perguntada sobre o motivo pelo qual teria inventado tudo, Paula, segundo a revista, respondeu: "Isso vocês devem perguntar a um psiquiatra". A reportagem sugere que a advogada montou a farsa para receber a indenização prevista na Lei de Assistência às Vítimas de Agressão. A reparação, que pode chegar a 200 000 reais, é destinada a vítimas de agressão física, sexual ou psicológica. O objetivo da lei é estimular as pessoas a comunicar à polícia as agressões sofridas, sobretudo nos casos de violência doméstica.
Istoé
Faltam idéias
A primeira etapa da corrida para suceder o presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou marcada por excesso de personalismo e carência de ideias. Com o frenético alarme do tempo tocando igualmente nas pretensas e prováveis candidaturas de José Serra e de Dilma Rousseff, estabeleceu-se o primeiro e perigoso axioma da campanha: se algum deles quer governar o Brasil, a oportunidade é agora. Ou nunca.
Serra está premido pelo encontro do tempo físico com o político. Uma derrota em 2010 o deixaria flutuando durante quatro anos no vácuo da ausência de mandato, o que nas implacáveis leis da política equivale à aposentadoria forçada. Se não for agora, o governador de São Paulo só voltará à disputa presidencial com 72 anos de idade, quando não poderá mais ser apresentado como o primeiro da fila.
Em 2014, Dilma terá a idade que Serra tem atualmente. Sua dificuldade para um segundo voo, portanto, é antes uma questão de clima do que de tempo. Hoje nem os funcionários da base de lançamento da nave Dilma-2010 comprariam um bilhete para outra tentativa, quatro anos mais tarde. A ministra do PAC tem 18 meses para ganhar o partido, construir um programa e, em caso de derrota, preservar eleitores fiéis. No entanto, como ficou provado no encontro do presidente e da candidata com cerca de 3.500 prefeitos, na terça-feira 10, em Brasília, só existem "dilmistas" neste momento porque Lula quer. E eles precisam ser autênticos para que Dilma venha a ter futuro político quando o padrinho se for.
O plano de Aécio para 2010
Pela primeira vez desde o início das discussões em torno da sucessão presidencial de 2010, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), admitiu que é candidato a presidente da República. Em entrevista exclusiva à ISTOÉ, Aécio revelou que se lançará na disputa, assim que forem confirmadas as prévias para a escolha do nome do PSDB ao Palácio do Planalto. “Aprovadas as prévias, é natural que eu seja uma alternativa para o partido e para o País”, disse. “Estou disposto a disputar as prévias e discutir com as bases do partido um projeto novo para o Brasil.”
A entrevista ocorreu na quarta-feira 11 (leia as declarações à pag. 38), quando ele fechou uma rodada de reuniões políticas em Brasília, aberta na sexta-feira anterior em audiência no Palácio do Planalto com o presidente Lula. Em todos os encontros, Aécio avisou que vai iniciar uma campanha pelas prévias no ninho tucano. “A tradição do PSDB de optar por uma decisão centralizada nos levou nas duas últimas eleições a duas derrotas”, disse ele à ISTOÉ. “É hora de mudar essa tradição para mudarmos o resultado da próxima eleição.”
Dois fatores animam o governador a encarar uma disputa contra o governador paulista, José Serra. A primeira é a aceitação nacional de seu nome. Na mais recente pesquisa, realizada pela CNT/Sensus, em que aparece como candidato tucano, Aécio lidera, em qualquer cenário, a disputa contra a pré-candidata do governo, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, ou contra o deputado Ciro Gomes (PSB). A outra é baseada numa análise política.
"O PSDB não pode ter medo de debater"
Durante sua passagem por Brasília, na quarta-feira 11, o governador Aécio Neves, apesar da agenda superlotada de compromissos, reservou um espaço para uma entrevista exclusiva à ISTOÉ.
Por sugestão dele, o diálogo ocorreu no trajeto do escritório do ex-ministro Pimenta da Veiga, no Lago Sul, onde os tucanos tiveram reuniões políticas, até o aeroporto.
ISTOÉ – O sr. é candidato à Presidência da República?
Aécio Neves – Só posso ser candidato a presidente se o partido me indicar candidato. Mas estou disposto a disputar as prévias e discutir com as bases do partido um projeto novo para o Brasil.
Linha dura com os doutores
A concessão de uma bolsa de estudos no Exterior é um prêmio ou um investimento? Quando se trata de verba pública, é um contrato de prestação de serviços entre o Estado – que garante bolsa integral e auxílio financeiro – e o pesquisador. Este deve concluir a pós-graduação e retornar ao País para contribuir com o desenvolvimento do Brasil durante o mesmo prazo de duração da bolsa. As exigências estão no Termo de Compromisso assinado pelo bolsista. Mas, mesmo cientes da obrigação, alguns pesquisadores descumprem o contrato por entenderem que receberam o benefício por mérito próprio e, portanto, teriam autonomia. Outros, concluem os estudos e decidem morar no Exterior em busca de melhores oportunidades na carreira. Em ambos os casos, o Brasil está fora dos planos. Por isso, o Tribunal de Contas da União está cobrando o que é devido ao Erário.
Levantamento da Controladoria-Geral da União (CGU) revela que, entre os anos de 2002 e 2008, houve 272 processos contra bolsistas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – equivalente a 8% do total de bolsas oferecidas no período (3.500). Os pesquisadores devem aos cofres públicos mais de R$ 71 milhões. A lista dos irregulares é ainda maior, pois os processos que chegam à CGU são aqueles nos quais se esgotaram as tentativas de acordo.
Indo para o espaço
Ao saber que o Irã lançou seu primeiro foguete ao espaço, o presidente da Agência Espacial Brasileira, Carlos Ganem, teve uma reação inesperada. "Quando vi a notícia, chorei no meu quarto, sozinho", conta, inconformado com o fato de o Brasil ser ultrapassado por nações sem tradição na corrida espacial. Segundo ele, o País está entre os principais players do mercado de foguetes e satélites, que movimenta mais de US$ 350 bilhões por ano. Mas falta visão sobre a importância do programa espacial. Em entrevista à ISTOÉ, Ganem enumerou os obstáculos que enfrenta para lançar o Cyclone, um foguete de 50 metros de altura e 198 toneladas, que será construído em parceria com a Ucrânia. Entre as dificuldades para desenvolver os principais projetos do Centro Espacial de Alcântara (CEA) estão o corte no orçamento da AEB, a demarcação de terras quilombolas em Alcântara, a ação de ONGs e processos no TCU. "Os ucranianos acham que eu administro um sanatório geral", afirma.
Relator da Comissão Mista de Orçamento, o senador Delcídio Amaral (PT-MS) é criticado pelo presidente da AEB, que não perdoa o corte de 22,5% nos recursos da agência. A dotação de 2009 caiu para R$ 280 milhões, mas seria necessário pelo menos o dobro para o projeto Cyclone. "É uma escolha burra. Praticamente se disse adeus a um programa como o Amazônia 1", lamenta. Com lançamento previsto para 2010, o Amazônia 1 seria o primeiro satélite totalmente nacional. "Ou o Brasil aposta num programa espacial completo, autônomo e suficiente, ou jamais poderá exercer o papel protagonista que a história lhe reservou", diz o executivo. No novo mapa espacial que está na mesa do presidente da AEB, a Europa, os EUA, o Japão e a Coreia "crescem" este ano, enquanto o Brasil "perde espaço" e a África "desaparece".
Carta Capital
Guerra no Rio Grande do Sul
Dez sindicatos de servidores estaduais, liderados pelo Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS Sindicato), desencadearam em janeiro uma campanha publicitária contra a governadora Yeda Crusius (PSDB). Outdoors espalhados por todo o estado anunciavam: "Dia 12/02 conheça a face do autoritarismo, da corrupção, do arrocho salarial" etc. Cada tabuleta trabalhava um conceito negativo ao lado de um rosto coberto por uma máscara. Antes mesmo do dia 12, o governo do Estado e a governadora reagiram solicitando suspensão judicial da campanha por ameaça à honra de Yeda Crusius. Os cartazes com a face de Yeda colados na madrugada foram cobertos pela manhã. Na imprensa, Yeda Crusius já posava de vítima e a direção do CPERS fazia o papel de algoz.
Não foi feita (ainda) nenhuma pesquisa, que seja de conhecimento público, sobre a opinião dos professores e servidores a respeito da atitude das suas direções, mas é perceptível que a sociedade gaúcha, assim como rechaça o governo tucano, também não apoia a linha adotada. O CPERS hoje é dominado por uma auto-intitulada "esquerda sindical" composta por militantes da Conlutas, Intersindical e CSD (CUT Socialista e Democrática, ligada à DS, uma das correntes mais fortes do PT gaúcho). A CUT, o PT, o PCdoB e outros setores que apoiam o governo Lula foram alijados da direção da entidade. Entretanto, para o grande público o CPERS ainda é uma entidade ligada ao PT e à oposição ao governo Yeda. Na opinião pública, a disputa entre o CPERS e o governo é vista como uma guerra entre os petistas e os tucanos.
Nos bastidores das telecomunicações
Nos últimos três anos, a advogada Flávia Lèfevre acompanhou de perto o surgimento das novas regras do setor de telecomunicações que permitiram, entre outras novidades, a compra da Brasil Telecom pela Oi, como desejava o governo federal. Nesse período, Flávia fez parte do Conselho Consultivo da Anatel, um órgão de aconselhamento da direção da agência, sem poder deliberativo. Foi para o conselho, composto por 12 integrantes, em uma das duas vagas destinadas aos representantes dos usuários.
Antes de deixar o conselho, como representante da Pro Teste, uma associação de defesa dos direitos dos consumidores sediada em São Paulo, Flávia abriu um processo contra a Anatel. Segundo a advogada, a agência agiu inconstitucionalmente ao fechar um acordo de troca de metas com as concessionárias de telefonia fixa do País. Pelo acordo, ficou acertado que as operadoras terão de levar banda larga a todas as cidades onde atuam. “Isso é totalmente ilegal. Elas não podem usar receitas da telefonia fixa para investir em um negócio em regime privado, como é o da banda larga”, afirma. Além disso, Flávia critica a exclusão de uma cláusula que garantia o retorno à União, ao fim da concessão, da infraestrutura que terão de construir até 2010.
Robinson, Chávez e Lula
Ocorre-me Robinson Crusoe, o herói de Daniel Defoe. Que se deu com ele quando, finalmente retirado da ilhota no meio do oceano, voltou para casa? O escritor baseava-se em uma história verdadeira, de um marinheiro de sobrenome Selkirk que vivera a mesma aventura. Não sei que aconteceu quando do retorno.
Brasil e Venezuela são mares de desigualdade e Lula e Chávez são Robinsons resgatados pelo povo em lugar de um barco de Sua Majestade. Robinson/ Selkirk, ouso imaginar, logo no regresso frequentou alguns lupanares e entornou copos e copos de rum. A olhos aristocráticos, caiu na gandaia, mesmo para aqueles senhores que não deixavam por menos.
E Lula e Chávez? Exageraram? Exorbitaram? Este, na visão da elite venezuelana, certamente. Aquele, esforçou-se para aparar arestas e agradar aos senhores, sem resultados notáveis, de inúmeros pontos de vista. Neste nosso país de democracia oligárquica, como diz Fábio Konder Comparato, o ódio de classe é sentimento insopitável.
Robinson/Chávez espraiou-se de um lado. Com o apoio popular, vai lançar ao mar uma ditadura de fato. Cuidado com os ditadores, mesmo que simpatizemos com eles, porque, de alguma forma, atormentam o império americano. Muitos, de resto, ascenderam ao poder em meio à euforia das massas.
Lula/Robinson navegou na rota oposta, embora conte com aprovação popular bem mais consistente do que a do colega venezuelano. Não se esperem dele atentados à democracia. Favores, porém, à oligarquia.
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