Camilla Shinoda
Sem estardalhaço, a Câmara se movimenta para aprovar uma proposta de emenda constitucional (PEC) que deve acelerar a conclusão dos cerca de 150 mil processos de divórcios que passam por ano pelos cartórios brasileiros. Uma comissão especial analisa o fim da separação judicial, etapa à qual os cônjuges devem se submeter antes de chegar ao divórcio propriamente dito.
Atualmente, existem duas maneiras de se divorciar. A primeira é provar que o casal já está separado há mais de dois anos. A segunda exige que os cônjuges passem pela separação judicial e, somente um ano depois disso, venham a realmente se divorciar. A separação judicial tem o poder de dissolver a sociedade conjugal e os seus efeitos civis, mas não é suficiente para dissolver o casamento. Ou seja, as pessoas envolvidas não podem se casar de novo.
A PEC 33/2007, do deputado Sérgio Barradas (PT-BA), busca encurtar esse caminho. Ela altera o parágrafo 6° do artigo 226 da Constituição, suprimindo a separação judicial. Assim, as pessoas podem passar diretamente ao divórcio, sem ter de provar há quanto tempo estão separadas ou se submeter a um processo prévio.
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Sofrimento reduzido
Segundo Barradas, a agilidade não é a única vantagem que a proposta traz. “Muitas pessoas deixam de fazer a conversão da separação judicial para o divórcio, pois não querem voltar a um assunto que lhes traz tanta dor. A PEC evita o prolongamento de um sofrimento que pode ser evitado”, explica. Além disso, argumenta, os custos financeiros também serão reduzidos, já que o casal precisará passar apenas por um processo judicial.
A vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM), Maria Berenice Dias, desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), concorda com o deputado. “Isso é um avanço no sentido de que abandona uma interferência do Estado na vida das pessoas, que nos dias de hoje já não se justifica mais”, aponta.
A desembargadora ainda explica que o Judiciário não vai ter perda de verbas por perder uma etapa processual, já que, com a agilização das etapas, mais pessoas poderão ser atendidas.
O presidente da União Internacional dos Advogados, Paulo Lins e Silva, também acredita que a proposta tem apenas pontos positivos. “Grande parte dos países que possuem um direito de família avançado, já fazem o divórcio de forma imediata, sem ter que passar por nenhum tipo de separação anterior”, afirma. “Essa proposta vai estimular o desenvolvimento do direito de família no Brasil e, quem sabe, uma posterior reformulação do Código Civil nessa área”, completa o advogado.
Questão histórica
A atual Lei do Divórcio, de autoria do ex-senador Nelson Carneiro, fez 30 anos no último dia 15 de junho. Até 1977 prevalecia o Código Civil de 1916, que ditava que a sociedade conjugal só poderia ter um fim com o desquite, o que equivale à separação judicial.
Nesse caso, os indivíduos não precisariam mais dividir o mesmo teto nem cumprir deveres de fidelidade ou partilhar todos os seus bens. O casamento, no entanto, não era dissolvido. Ele só poderia ser rompido com a anulação, a morte de um dos cônjuges ou a chamada “declaração de ausência”. Apenas com a Lei do Divórcio é que esse vínculo conjugal pôde ser definitivamente rompido.
Mas, para conter os ânimos daqueles que eram contra a proposta, o Congresso incluiu no texto o artifício da separação judicial. Hoje, no entanto, essa medida é considerada ultrapassada. “A boa lei é aquela que consagra a prática social”, afirma Barradas. “A minha proposta acaba incentivando o casamento, pois com o divórcio imediato, as pessoas ficam livres para um novo matrimônio”, completa.
Tramitação na Câmara
A PEC 33/07 já foi aprovada por unanimidade na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Agora ela será analisada, em seu mérito, por uma comissão especial.
Segundo o deputado Sérgio Barradas, a receptividade à proposta é a melhor possível. Ele acredita que o texto será aprovado dentro de um mês. Depois disso, ela estará pronta para ir ao plenário, onde precisará do apoio de 308 deputados, em dois turnos de votação. “Espero que até o final do ano a PEC seja aprovada. O único problema que encontramos é o excesso de medidas provisórias que trancam a pauta da casa”, explica o parlamentar.
A desembargadora Maria Berenice acha que a proposta não vai criar muito polêmica, já que hoje o divórcio é uma prática aceita socialmente. “Em 1977, a separação judicial foi criada para diminuir a resistência de que o divorcia ia acabar com a família. Agora nós já sabemos que isso não acontece”, finaliza.
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