Sem o habeas-corpus que lhe garantiria a prerrogativa de permanecer calado diante de perguntas que pudessem incriminá-lo, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares abusou do direito de responder com negativas e evasivas os questionamentos feitos ontem pelos senadores na CPI dos Bingos. E em nada lembrou o dirigente que um dia comandou as finanças do partido do presidente da república. Por orientação dos advogados, ele se negou a assinar o termo de compromisso de falar somente a verdade.
Ao responder a uma pergunta do senador Alvaro Dias (PSDB-PR), o ex-petista afirmou que jamais pediu R$ 40 milhões ao banco Opportunity, conforme denunciou Verônica Dantas, irmã do banqueiro Daniel Dantas, à Corte dos Estados Unidos. "Não solicitei nem a (Carlos) Rodenburg nem a (Daniel) Dantas qualquer pedido de recurso financeiro", afirmou.
Mas confirmou ter participado de uma reunião no dia 22 de julho de 2003 com o banqueiro e seu então sócio no Opportunity, Carlos Rodenburg, junto com Marcos Valério. A reunião no hotel Blue Tree, em Brasília, foi anotada na agenda de Karina Somaggio, ex-secretária de Valério.
Segundo o ex-tesoureiro, a reunião teria acontecido a pedido do empresário mineiro. "O conteúdo foi que o Partido dos Trabalhadores não gostava do Opportunity. Eu não disse que gostava nem que não gostava, o PT não tinha nenhuma restrição", contou. "E o pedido de dinheiro?", insistiu o líder da oposição. "Não solicitei, nunca houve pedido de recursos para o PT", respondeu Delúbio. "Assumo o que fiz: não pedi dinheiro ao Opportunity", frisou.
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"Só soube pela imprensa”
Convocado para esclarecer denúncias de irregularidades no financiamento da campanha de Lula ao Palácio do Planalto em 2002, Delúbio repetiu diversas vezes a frase: "Não tenho conhecimento disso. Só soube pela imprensa". O expediente foi usado, por exemplo, para rebater a acusação feita pelo advogado Rogério Tadeu Buratti de que a campanha de Lula teria recebido R$ 1 milhão de empresários angolanos que mantêm casas de bingo em São Paulo. Assim como a denúncia da revista Veja de que o PT teria recebido ilegalmente 3 milhões de dólares de Cuba naquele ano.
Delúbio negou conhecer Buratti, ex-assessor de Antonio Palocci em Ribeirão Preto (SP), e o empresário Roberto Carlos Kurzweil, apontado como intermediário da negociação com os angolanos. Ele afirmou desconhecer também o plano do PT de arrecadar R$ 1 bilhão, conforme declarou o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira, em recente entrevista ao Globo. Disse ainda que não tinha qualquer contato com o ex-assessor da Casa Civil Waldomiro Diniz e que jamais manteve qualquer relação com a prefeitura de Santo André, comandada pelo petista Celso Daniel, morto em janeiro de 2002.
"A responsabilidade é minha"
Apesar da insistência dos senadores, Delúbio não respondeu se recebeu autorização da direção do PT para contrair empréstimos nos bancos BMG e Rural, por intermédio de Marcos Valério. Os empréstimos bancários são o principal argumento para justificar a origem dos recursos distribuídos para petistas e parlamentares da base aliada do governo. "Eu tinha uma autorização política. A responsabilidade é minha", disse ele há pouco, em depoimento à CPI dos Bingos.
Os integrantes da comissão questionaram por diversas vezes o ex-tesoureiro se ele teve autorização ou não de uma terceira pessoa para negociar as operações bancárias com Marcos Valério. "O Genoino tinha conhecimento das dificuldades do PT", respondeu ele, sobre as responsabilidades do então presidente nacional do partido."Eu era responsável pela gestão financeira do PT e tinha autorização da diretoria para fazer a gestão das contas", disse.
Relação de confiança
O ex-tesoureiro do PT afirmou que Valério não teve qualquer participação na campanha de 2002, ao contrário do que disse Silvio Pereira em entrevista ao jornal O Globo. Ele afirmou que foi apresentado ao empresário mineiro em outubro de 2002, depois das eleições. "Eu autorizei o Marcos Valério, numa relação de confiança, a fazer esses empréstimos", completou.
A resposta não convenceu o presidente da CPI, o senador Efraim Morais (PFL-PB): "A conclusão que eu chego é que o senhor teve delegação para fazer esses empréstimos, sozinho". "Essa é a conclusão do senhor", retrucou Delúbio, que chegou a ser repreendido pelo pefelista.
O ex-petista minimizou ainda a participação do presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, nas finanças do PT. A CPI suspeita que Okamotto assumiu o pagamento de uma dívida de Lula, no valor de R$ 24 mil, com o PT que teria sido quitada com recursos do valerioduto. "O PT apresentou algumas dívidas não saldadas. Okamotto pagou a dívida. Cobrei de Okamotto e ele pagou."
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