A CPI das ONGs mal começou e já há tentativas de blindagem de aliados políticos dos senadores. Um parlamentar pediu que não entre nas investigações a Alfabetização Solidária (Alfasol), fundada pela mulher do ex-presidente Fernando Henrique, Ruth Cardoso.
Em outra frente de proteção, o ministro da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage, divulgou um comunicado para minimizar a participação do governo Lula em eventuais ilegalidades a serem apuradas pela CPI. Ele será ouvido hoje (30) pela comissão.
Segundo dados do Siafi (sistema que registra os gastos do governo), a ONG fundada por Ruth em 1997, recebeu R$ 336 milhões do governo federal entre 1999 e 2006. O valor é pouco inferior ao orçamento previsto para este ano do programa Brasil Alfabetizado, carro-chefe na alfabetização de jovens e adultos do Ministério da Educação, que é de R$ 362 milhões.
O Siafi indica que a Alfasol foi a terceira entidade do terceiro setor que mais obteve recursos federais no período, atrás apenas da Fundação Butantã (R$ 561 milhões) e do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (R$ 502 milhões).
A tentativa de blindar a ONG de Ruth ocorreu em uma das reuniões da CPI realizada reservadamente. Em contrapartida à proteção, haveria outro muro de contenção. A comissão não mexeria na Rede 13, entidade petista extinta em agosto de 2003 e que foi dirigida por Lurian Cordeiro Lula da Silva, filha do presidente Lula.
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Todos negam
Em público, porém, ninguém confirma o entendimento. O relator da CPI, Inácio Arruda (PCdoB-CE), rechaça qualquer combinação. “Se alguém fez acordo, esqueceu de conversar com o relator e com o presidente [da comissão]”, decreta.
O tucano Flexa Ribeiro (PA) também nega a existência de um acerto prévio. Entretanto, faz questão de ressaltar que a Alfabetização Solidária espera pela investigação de suas atividades. A ONG enviou a todos os senadores da CPI um documento para mostrar sua lisura. Nele, há uma série de informações, como a relação das auditorias às quais a ONG foi submetida desde sua criação.
Outro integrante da CPI, Sibá Machado (PT-AC) também nega que haja algum acordo. “Fazer troca? De jeito nenhum”, diz ele, às risadas. Segundo o petista, o entendimento não é proteger, mas apurar apenas entidades com indícios de irregularidades. “Por enquanto, não temos nada apresentado contra ela [a Alfasol]”, lembrou.
“Esse tipo de solicitação não chegou ao meu conhecimento. Não há politização na CPI e os primeiros requerimentos mostraram que o temor do governo, que não queria a criação da comissão, não são justificados”, concorda Flexa Ribeiro.
Heráclito Fortes (DEM-PI), autor do requerimento que resultou na criação da comissão, ressalta que a CGU investigou a ONG de Ruth. “A CGU investigou e não encontrou nada. Acho que até agora a CPI tem um encaminhamento correto", diz o senador, autor do requerimento que criou a comissão de inquérito.
Responsabilidade tucana
Na Esplanada, também há movimentos para proteger o Planalto. Um comunicado da CGU minimiza a participação do governo Lula em eventuais ilegalidades a serem apuradas pela CPI. Segundo o texto da pasta dirigida por Jorge Hage, em valores atualizados, FHC gastou mais com ONGs que a gestão petista.
“Acho feio o Jorge Hage fazer isso. Passa a imagem de petista dele”, condenou Gil Castelo Banco, coordenador da ONG Contas Abertas, que faz acompanhamento dos gastos públicos. Para ele, a CGU poderia fazer uma série histórica sobre os repasses, mas sem vincular isso a governos.
O Tribunal de Contas da União (TCU) considerou ilegal um convênio entre a CGU e uma ONG de amigos do ministro Hage. Para o tribunal, a entidade apenas terceirizava os serviços. Hage vai depor hoje (30) à CPI, mas sobre outros temas.
Para o relator da CPI, que é da base governista, “não tem relevância” a comparação feita pela CGU entre os recursos destinados pelos governos FHC e Lula. Inácio Arruda diz que o interesse hoje é saber o resultado de auditorias feitas pelos órgãos. “Não nos interessa se foi do FHC ou do Lula. Ambos mandaram recursos para ONGs”, disse ele.
O relator destacou que a postura de Hage é compreensível. “Claro que ele é um ministro do governo Lula. Então ele tem responsabilidades com esse governo. Mas a CPI não entra nisso”, enfatizou. “Não podemos permitir que a CPI se transforme num palco de disputa eleitoral”, afirmou Arruda.
Sem investigação
Ontem, a CGU negou a existência de nova auditoria para investigar a Alfabetização Solidária, conforme publicado pelo Jornal do Brasil. “A CGU repudia a intenção clara de fazer intriga política com seu trabalho”, diz o comunicado do órgão.
Procurada pela reportagem, a Alfasol informou ao Congresso em Foco que recebe 60% das doações da iniciativa privada. Ou seja, além da receita de R$ 336 milhões proveniente do governo federal, outros R$ 504 milhões vieram de empresas e cidadãos.
A entidade informou que de 2003 a 2006 – quando recebeu R$ 53,4 milhões do governo Lula –, alfabetizou 653 mil jovens e adultos, mais do que, segundo ela, foi combinado com o Ministério da Educação. Isso dá uma média de R$ 81,92 por aluno. No governo tucano, a ONG criada pela então primeira-dama do país era bem mais aquinhoada com recursos públicos. Entre 1999 e 2002, ela recebeu R$ 282,5 milhões.
A organização não-governamental disse que presta contas regularmente à CGU, ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Fundo Nacional para Desenvolvimento da Educação (FNDE), “que vêm atestando sua lisura na gestão de verbas públicas e privadas”.
ONGs sob suspeita
O Programa Brasil Alfabetizado do MEC – para o qual a Alfasol prestou serviços – tem orçamento de R$ 362 milhões para este ano. Segundo estimativas do governo, o Brasil Alfabetizado vai atender este ano 2,2 milhões de jovens e adultos com 15 anos ou mais. Somadas as turmas de 2003
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