O episódio em que uma jovem ficou presa por cerca de 25 dias com mais de 20 homens no Pará, aponta para o envolvimento de vários integrantes do sistema penitenciário do município de Abaetetuba. A conclusão é do relator da CPI do Sistema Carcerário, deputado Domingos Dutra (PT-MA), que acompanhou a comitiva de parlamentares que tomaram nesta última quinta e sexta-feira (7), o depoimento das principais autoridades envolvidas no caso.
"Já estou convencido da omissão de todos, dos juizes, dos promotores, dos delegados, de todo mundo", disse Dutra em entrevista ao Congresso em Foco. Para o deputado, foi montado um grande esquema para negar o fato. "Ao longo dos depoimentos verificamos um conjunto de omissões e tentativas de encobrir a verdade", acrescentou.
Um dos indícios apontados pelo parlamentar é a possível falsificação de documentos. Segundo ele, a juíza da 3º Vara Criminal do Pará, Clarice Maria de Andrade, no dia 20 de novembro, quando o caso veio a público, "fez um despacho com a data de 7 de novembro, em que autorizava a transferência da menor para um presídio feminino de Belém". O objetivo da juíza, segundo o parlamentar, era mostrar que ela não teria sido negligente com a situação da jovem. "Tudo o que a juíza disse [em depoimento] não vale nada", avaliou.
O presidente da CPI, deputado Neucimar Fraga (PR-ES), não destoa do colega. "Concluímos que a juíza tinha conhecimento do fato, mas não tomou nenhuma providência. Ela alega que o corregedor das Comarcas do Interior, Constantino Guerreiro, teria que se pronunciar sobre o caso para que ela pudesse tomar alguma medida. Ela está jogando a culpa nele" disse o deputado à reportagem.
Quanto à possível produção de documentos, Neucimar foi enfático: "É evidente que ela [a juíza] está montando uma farsa. Ela está se colocando como uma farsante".
Sem adiantar uma possível data, Domingos Dutra disse que dois servidores da comarca de Abaetetuba (PA) também deverão prestar depoimento. "Eles foram induzidos pela juíza Clarice Maria de Andrade a darem depoimentos falsos", afirmou.
Procurada pela reportagem no Fórum de Abaetetuba, a juíza não foi encontrada.
Informações alteradas
A polêmica sobre alteração de dados, na opinião de Neucimar, também pode recair sobre a Polícia Civil da capital paraense. Segundo ele, o delegado Celso Viana, de Belém, apresentou documentos em que a jovem ao ser presa por furto, em duas ocasiões, 24/6 e 5/9 deste ano, foi registrada com a data de nascimento do dia 10 de dezembro de 1987.
"Se esses documentos forem verdadeiros, ela é maior. Mas se forem falsos, é sinal de que o sistema da Polícia Civil é frágil, passível de alterações e que podem ter sido feitas pelo delegado ou por alguém que têm interesse nessa mudança. Também vamos averiguar isso", adiantou.
A questão sobre a verdadeira idade da menina, segundo o deputado Domingos Dutra, foi motivo de perseguição, por parte de delegados de Abetetuba, aos familiares da jovem.
"Um dos delegados da cidade foi até a casa da menina para induzi-los a confirmar uma nova data de batismo para que a menor passasse a ser considera maior", disse o petista.
Já Neucimar destaca que a confusão sobre idade de jovem se dá pela possibilidade dela ter nascido numa data e ter sido registrada em outra, o que, para ele, é comum acontecer no interior do país. "O pai dela disse que ela nasceu em 1987, mas só foi registrada em 1991 pelo padrasto como se tivesse nascido naquele ano", explicou.
Mulheres e homens
Ao longo dos depoimentos prestados pelas autoridades, Neucimar também ouviu de um carcereiro que o fato de uma mulher dividir cela com outros homens não era algo inédito em Abaetetuba. "Ele me disse que, durante os cinco anos em que trabalhou ali, de dez a 15 mulheres já ficaram presas por lá".
Neucimar constatou, ainda, que não existe uma carceragem feminina na cidade. "Não há espaço para mulheres lá. Outras quatro foram presas este ano na cidade, mas, segundo apuramos, elas foram rapidamente transferidas para um presídio feminino em Belém".
Segundo o deputado, a delegada, Flávia Verônica Monteiro Pereira, foi questionada porque tal procedimento também não teria sido feito com a jovem. "Ela me disse que a função dela é só prender, aonde o preso vai ser colocado não é problema dela".
Na próxima terça-feira (11) deverá ser realizada uma audiência entre os integrantes da CPI e o ministro da Justiça. Nela os parlamentares tentarão obter um acordo para poderem ouvir a jovem e o pai dela, que atualmente estão sobre a proteção da Polícia Federal.
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