Quando se fala em corrupção no Brasil, já se imagina milhões ou bilhões de reais surrupiados dos cofres públicos. É normal pensar assim, afinal é isso o que se mais vê no noticiário político nos últimos tempos. É Mensalão pra cá, Lava Jato pra lá…
Mas não é apenas a corrupção baseada em propinas e conchavos que está minando o nosso país. Muito dinheiro público, por exemplo, que deveria ser usado em benefício da sociedade simplesmente não chega aos cofres públicos devido à sonegação fiscal. São empresas que cobram dos consumidores os impostos em seus produtos e serviços e que não os repassam ao Fisco.
Há empresas que são baixadas, voluntária ou involuntariamente, no cadastro da Receita Federal, mas que ainda assim conseguem emitir notas fiscais. A Operação Política Supervisionada (OPS) identificou uma série de notas e cupons sem validade fiscal e que foram apresentadas por parlamentares à Câmara dos Deputados para fins de reembolso pela verba indenizatória. São documentos fiscais emitidos mesmo depois de as empresas terem sido baixadas na Receita.
Apenas na atual legislatura, nove notas estão nessa situação. Juntas, somam R$ 4.854,97. São despesas com combustível, locação de equipamentos de informática e alimentação. O valor é pouco se comparado aos escândalos financeiros citados no começo deste texto, mas que não deve ser simplesmente ignorado.
A OPS, da qual sou fundador e coordenador, solicitou ao Departamento Financeiro da Câmara (Defin), via Lei de Acesso à Informação, a apuração dos fatos e o estorno dos valores por parte dos parlamentares, caso comprovadas as irregularidades. Em comunicado, a Câmara informa que enviou ofício aos respectivos deputados solicitando esclarecimentos e, se for o caso, a devolução dos valores.
Veja o comunicado:
Especialista sobre o uso das verbas indenizatórias na Câmara e Senado, a OPS atua diariamente na fiscalização de gastos realizados por parlamentares, trabalho que já resultou em R$ 5,5 milhões em economia do dinheiro público.
Deputado Chapadinha
Há duas semanas, o “alvo” tem sido o deputado Francisco Chapadinha (PTN-PA). Um “e-mailzaço“, coordenado pela OPS, solicita a devolução de R$ 37,8 mil aos cofres públicos. O deputado utilizou de sua verba indenizatória para alugar um imóvel em Santarém, seu reduto eleitoral, para montar um escritório de representação política. Entretanto, o valor da locação, conforme apurado pelo Congresso em Foco, era quase cinco vezes maior que o praticado no mercado local. Além disso, o imóvel é de propriedade do genro, fato que impede a transação imobiliária, conforme determinam regras internas da Câmara. Chapadinha disse que desconhecia a norma e que, se ficar confirmada a irregularidade, devolverá o dinheiro aos cofres públicos.
Centenas de mensagens foram enviadas à caixa de mensagem eletrônica do deputado, emitidas de várias regiões do país por colaboradores na OPS. Entretanto, até a publicação deste texto nenhuma manifestação do deputado foi recebida. Se o silêncio do deputado persistir, ele será denunciado pela OPS ao Ministério Público.
Verba Indenizatória
A Câmara dos Deputados e o Senado adotam a CEAP (CEAPS, no Senado), que significa Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar. Trata-se de recurso público destinado a financiar o trabalho parlamentar, como o custeio de locações de imóveis, automóveis, barcos e aeronaves; da divulgação do mandato em material gráfico, de áudio, vídeo e por meio de redes sociais e sites; de telefonias, alimentação, segurança pessoal e hospedagem, dentre outras despesas. Conhecida também como cotão ou verba indenizatória (na verdade, a verba indenizatória faz parte da CEAP), o custo anual é astronômico: apenas em 2015, por exemplo, foram gastos quase R$ 240 milhões em ambas as Casas legislativas.
A verba não é vista com bons olhos até mesmo por quem a utiliza. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), diz-se contrário à sua existência. Segundo ele, a verba é uma “distorção” e só foi criada porque os deputados tinham receio de aumentar os próprios salários.
Usar a verba indenizatória é tão simples quanto comprar um pãozinho na padaria da esquina. Não é exigido tomada de preços ou licitações, o que contraria a Lei 8.666/93. O acesso a esse recurso financeiro público se dá por meio da simples apresentação, à Câmara ou Senado, de notas fiscais ou recibos. Se o documento não possui rasuras, por exemplo, ou se a despesa descrita é coberta pelo cotão, o parlamentar recebe o valor correspondente ao documento em sua conta corrente. Simples assim.
No Senado são disponibilizados entre R$ 21 mil e R$ 42 mil por mês a cada um dos 81 senadores. Para os deputados, esse valor varia entre R$ 30,7 mil e R$ 45 mil.
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