As suspeitas da Polícia Federal de que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) pode estar repassando informações sigilosas para a família Sarney, como mostra matéria publicada ontem (8) pelo jornal O Estado de S. Paulo, deve aumentar a pressão sobre as ações dos órgãos de inteligência do Executivo. Foi o que disse há pouco ao Congresso em Foco o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), para quem a Abin – e não o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) – deve responder pelo suposto vazamento.
Autor de um projeto que cria uma comissão externa de controle da Abin e torna mais rigorosas as restrições investigativas, Demóstenes diz que é justamente o Parlamento o fórum adequado para estabelecer limites à agência. Em tramitação no Senado, mas sem previsão de data para votação, a proposta deve integrar um conjunto de projetos debatidos pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário chamado "pacto republicano", a ser encaminhado em março ao Congresso.
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“O que vai acontecer é em relação à Abin, e não diretamente à questão do presidente Sarney", disse Demóstenes, mencionando os "desvios históricos" da Abin em relação às investigações sigilosas. Defendendo um "controle mais efetivo" sobre a atuação da agência, o senador goiano diz ser de conhecimento geral que funcionários "desviados" da Abin "há muito tempo trabalhando de forma particular". O senador diz considerar que a Abin é "essencial" como órgão federal, mas que, caso tenha sua estrutura usada para fins escusos, "é uma praga".
Mesmo com o potencial mal-estar que as suspeitas contra a família Sarney podem causar no Senado, Demóstenes não acredita que a gestão do cacique peemedebista, bem como as atividades parlamentares, seja prejudicada. "Acho que não. O presidente Sarney acabou de ser eleito. Isso [o vazamento de informações sigilosas] é alguém trazendo à tona uma coisa já conhecida", opinou. "O próprio Sarney terá oportunidade de dar suas explicações."
A matéria publicada ontem pelo Estadão mostra parte do conteúdo de uma gravação autorizada pela Justiça na qual Sarney e seu filho Fernando fazem intrigante menção à Abin. Registrado em 17 de abril do ano passado, o diálogo mostra Fernando perguntando ao senador peemedebista se ele tinha notícias de um processo sob segredo de Justiça ajuizado na 1ª Vara da Justiça do Maranhão. “Não, até agora não me deram nada”, diz Sarney, no que é emendado pelo filho. “Muito bem, mas aqui eu já tive notícia, aqui do Banco da Amazônia”, responde Fernando, para ouvir do pai a menção à agência: “É, né? Da Abin?”, quer saber o senador. “Também”, arremata Fernando.
Sem comentários
"Provável" próximo presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado ("Mantendo-se o entendimento, é bem provável"), Demóstenes comentou com cautela o suposto envolvimento da família Sarney com o repasse de informações sigilosas da Abin. "Essa questão de Sarney não tem como comentar. Apareceu em páginas de jornal, ninguém sabe o que é isso direito", ponderou Demóstenes.
Parcimônia semelhante à de Demóstenes teve o adversário de Sarney na eleição do último dia 2, o senador petista Tião Viana (AC). À reportagem, Tião disse preferir não comentar o assunto, em respeito ao processo sucessório "respeitoso e decente" por que acabava de passar na disputa com Sarney. "Acho que não seria adequado a mim fazer qualquer manifestação sobre isso. Seria no mínimo deselegante dar minha opinião sobre esse assunto. Prefiro não comentar", disse o senador acreano.
O Congresso em Foco tentou contato com José Sarney, mas ele não atendeu às ligações. Sua assessoria, no entanto, informou que ele não daria, por enquanto, declarações à imprensa. A reportagem tentou ainda obter declarações do líder do PMDB no Senado e principal articulador da recondução de Sarney à presidência da Casa, Renan Calheiros (AL), mas ele disse que estava em uma "reuniãozinha" e não poderia falar. Depois disso, não atendeu aos demais telefonemas. (Fábio Góis)
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