Marcela Thaís Panke, de Porto Alegre, especial para o SOS Concurseiro/Congresso em Foco
O aumento no número de reclamações contra concursos municipais registradas na Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac) alerta para a fragilidade na segurança e o despreparo das organizadoras para selecionar funcionários para as prefeituras. “O problema dos concursos municipais é muito sério”, alerta a diretora-executiva da Anpac, Maria Thereza Sombra. “Em 15 dias, recebi pelo menos 50 e-mails referentes somente a reclamações de concursos em prefeituras”, completa. Centenas de municípios realizaram concursos em 2012 e homologaram os resultados até julho, em respeito à legislação eleitoral, para garantir que os novos prefeitos assumissem com mais servidores.
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O que está acontecendo, em muitos casos, é que nas cidades em que os prefeitos não foram reeleitos, os novos ocupantes do Executivo municipal “estão criando ‘mil e uma’ justificativas para anular os concursos”, explica Maria Thereza. “Entre aqueles que nos procuraram, houve um caso de tentativa de anulação em que o prefeito disse que não vai chamar nenhum aprovado porque não tem dinheiro. Só que isso não é possível, porque, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal, a prefeitura tem de ter previsão orçamentária para contratar caso queira realizar um concurso”.
A diretora-executiva da Anpac destaca ainda que os erros e fraudes são muito comuns nos concursos municipais. “Nas esferas estadual e federal não vemos isso acontecer com tanta frequência. A maioria das prefeituras não tem condições de contratar boas bancas organizadoras. As empresas que eles contratam muitas vezes não estão preparadas para fazer as seleções. Boa parte delas nem tem fiscais suficientes; às vezes, acontece até de candidatos usarem celulares e trocarem informações durante a prova”. O professor Ernani Pimentel, do grupo Vestcon, conta que não é raro empresas serem constituídas para a realização de apenas um concurso e depois desaparecerem.
Suspeitas
Um dos exemplos de concursos municipais com problemas está no Sul do país. Em maio de 2012, a prefeitura de Santa Cruz do Sul (RS) realizou concurso público para o provimento de 346 vagas em todos os níveis de escolaridade. Embora 60 já tivessem sido preenchidas, o Ministério Público ingressou com ação civil pública solicitando a suspensão da lista de aprovados e das contratações feitas até o momento, além da anulação do concurso, organizado pela Consultoria em Concursos Públicos e Pesquisas Sociais (Consesp), empresa de São Paulo. A ação do MP deve-se à denúncia de vazamento do gabarito de algumas provas teóricas antes da divulgação oficial.
De acordo com o advogado Cássio Ferrugem, que representa 20 aprovados no concurso, o que aconteceu não pode ser configurado como “vazamento”. O gabarito seria divulgado às 18 horas do dia seguinte à realização da prova. Entretanto, as respostas referentes às questões aplicadas a três dos 187 cargos foram divulgadas antecipadamente, às oito horas. “Seria vazamento se tivesse ocorrido antes ou durante a prova”, explica Ferrugem.
Por enquanto, a Justiça determinou a suspensão provisória do concurso e de novas nomeações. O advogado fez um pedido de reconsideração que, acredita, culminará em decisão favorável à prefeitura, Consesp e aprovados. “Existe uma deficiência grave de concursados em Santa Cruz do Sul. A Câmara de Vereadores aprovou a contratação emergencial de servidores com o aproveitamento dos aprovados. Mas essa contratação é temporária, válida por seis meses, podendo ser prorrogada por mais seis. Então percebemos que há um clima político favorável à manutenção do concurso público. A atual administração é francamente favorável”, relata Cássio Ferrugem.
No ano passado, o trabalho do Ministério Público foi essencial para evitar abusos e irregularidades em seleções de servidores municipais. Só no primeiro semestre, os Ministérios Públicos foram responsáveis pela investigação de centenas de processos e suspeitas de fraudes. Entre os mais recentes, estão os processos seletivos em Japoatã-SE, em que duas filhas da secretária de Saúde foram aprovadas em primeiro lugar e outros parentes de integrantes do alto escalão da prefeitura também tiveram mérito destacado. No mesmo estado, em Neópolis, a falta de documentação essencial da banca organizadora provocou a suspensão do atual concurso para as áreas de saúde e educação do município, a pedido do Tribunal de Contas do Estado.
Preocupação
A falta de experiência das empresas que organizam os concursos preocupa. “Eu não sei como resolver esse problema”, desabafa Maria Thereza. Em proposta apresentada pela Anpac ao Congresso para regulamentação do “Estatuto do Concurso”, há previsão de aferir a qualidade dos serviços prestados pelas bancas, entretanto, atualmente, não existem regras definidas.
Para ela, o ideal seria que as bancas organizadoras se fixassem em um município. Porém, observa ela, não haveria demanda de concursos suficiente para sustentar a empresa. A diretora projeta uma situação mais viável. “Se fosse possível a banca se estabelecer em uma região na qual pudesse atender a quatro, cinco municípios próximos, poderia se estruturar melhor para garantir uma prestação de serviço sem tantos erros”.
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