Ricardo Ramos
Ignoradas pela opinião pública e por grande parte da imprensa, as comissões da Câmara, do Senado e do Congresso detêm um poder nada desprezível. Elas definem o destino da maioria das leis aprovadas no Congresso Nacional, ao largo do Plenário, palco mais visado da disputa política. É também por meio desses atalhos legislativos que se dão os mais intensos lobbies no parlamento. Em tempos de Plenários atulhados por medidas provisórias, que trancam a pauta, o exemplo mais evidente da força das comissões são os projetos que tramitam em caráter conclusivo (na Câmara) ou terminativo (no Senado).
Levantamento feito pela assessoria técnica das duas Casas a pedido do Congresso em Foco revela que, desde 2004 até o dia 22 de junho deste ano, 271 projetos de lei (PLs) foram aprovados na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara conclusivamente, isto é, com a possibilidade de se transformarem em lei sem passar pelo Plenário. Ao longo desse período, o Plenário só aprovou 79 projetos de lei.
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Os deputados são autores de mais de 78% dos 271 PLs aprovados em caráter conclusivo, com 213 propostas. "Com tanta medida provisória trancando a pauta de votações, as comissões são o caminho mais rápido para termos nossos projetos aprovados", afirma o deputado Marcelo Ortiz (PV-RJ), integrante da CCJ, que já teve vários projetos aprovados graças a essa tramitação especial.
No Senado, os números apontam um cenário bem próximo ao da Câmara. Lá, entre 2003 e 2005, de 228 projetos de lei do Senado aprovados na Casa, 176 foram acolhidos em caráter terminativo na CCJ. A assessoria do Senado não dispõe ainda dos dados referentes a este ano.
Os projetos aprovados com esse tipo de tramitação podem seguir para sanção presidencial após tramitar nas duas casas. Mas não é qualquer tipo de proposição que pode tramitar dessa forma. Entre outras restrições, propostas de emendas à Constituição, projetos de lei complementar, de iniciativa popular, que criam códigos, tramitam em regime de urgência ou que receberam, ao longo da sua tramitação, pareceres divergentes precisam, obrigatoriamente, passar pelo crivo do Plenário.
A matéria aprovada em caráter conclusivo ou terminativo também pode ser alvo de deliberação do Plenário se pelo menos 10% dos parlamentares da Casa na qual ela foi aprovada (52 deputados, na Câmara; e nove senadores, no Senado) formalizarem solicitação nesse sentido.
Saber jurídico
Advogado e professor universitário, Marcelo Ortiz acredita que, como a maioria dos integrantes da CCJ – comissão por onde invariavelmente passam os projetos conclusivos – tem conhecimento jurídico, a discussão sobre os projetos se torna mais eficiente. "Aqui, a gente estuda a matéria a fundo e sabe qual o impacto que uma determinada mudança legislativa terá", afirma. "É como se fizéssemos uma audiência entre advogados".
"No Plenário, a diversidade de deputados é muito grande e a maioria dos parlamentares vota com base no que a liderança indica", observa. "Muitas vezes, a matéria é de transcendental importância e é mal discutida lá".
Além de considerar importante esse rito especial de tramitação, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) afirma que a própria CCJ atua como um plenário em menor escala. Afinal, na Câmara, a CCJ é composta por 10% dos 513 deputados. "Os melhores projetos estão tramitando nas comissões, não têm como passar pelo Plenário", diz o deputado paranaense, que, assim como Ortiz, é advogado, professor universitário e integrante da CCJ.
Exemplos de matérias aprovadas
Desde o inicio do ano até o final de junho, a CCJ da Câmara aprovou 66 projetos de lei em caráter conclusivo, dos quais 49 de autoria de deputados. O Plenário da Casa, que teve a pauta trancada por medidas provisórias em três de cada quatro sessões para votação que realizou, só conseguiu votar 13 PLs.
Conheça alguns projetos aprovados em caráter conclusivo pela Câmara e enviados para o Senado:
Dia 14 de março:
PL 1.504/96, do deputado Edson Ezequiel (PMDB-RJ), que torna obrigatória a realização de exame de DNA nos casos de investigação judicial de paternidade.
Dia 5 de abril:
PL 7.298/02, do deputado Cabo Júlio (PST-MG), que dispõe sobre a proibição de regalias no Sistema Penitenciário Brasileiro. Entre as regalias, estão quaisquer aparelhos eletrônicos no interior das celas e os "jumbos", isto é, roupas e alimentos levados por parentes vizinhos e outros nos dias de visita.
Dia 30 de maio:
PL 3.648/04, do deputado Geraldo Resende (PPS-MS), que faculta a afixação na cédula de identidade do registro de deficiência do surdo.
Dia 7 de junho:
PL 591/03, do deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP), que dispõe sobre a regulamentação do exercício da profissão de ecólogo.
Dia 20 de junho:
PL 923/03, do deputado Assad Júnior (PSB-MG), que estabelece a obrigatoriedade de avaliação de aparelhos que emitam radiação eletromagnética, como celulares e fornos de microondas.
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