Reclamando do excesso de recursos judiciais, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, rejeitou nesta quinta-feira (21) pedido da defesa do deputado Paulo Maluf (PP-SP), preso desde ontem (quarta, 20) e condenado a mais de sete anos de prisão, para que a execução de sua pena fosse suspensa. Andando com dificuldade e com o auxílio de uma bengala, o parlamentar de 86 anos se apresentou a uma unidade da Polícia Federal em São Paulo depois que o ministro do STF Edson Fachin determinou, na terça-feira (19), o cumprimento imediato e definitivo da pena (sete anos e nove meses, em regime fechado).
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A defesa de Maluf já avisou que recorrerá da decisão da ministra e que cabe ao plenário do STF dar a última palavra sobre o pedido de suspensão da pena. Os defensores disseram ainda que acolhem com respeito o despacho de Cármen Lúcia, mas a veem com “apreensão” devido ao estado de saúde do deputado, alvo de um câncer, segundo a própria defesa.
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A decisão de Cármen Lúcia é eivada de críticas ao caráter meramente protelatório dos recursos. Lembrando que o caso remete à década de 1990, e que a denúncia do Ministério Público só foi formalizada em 2006, “exatos 11 anos e três dias atrás”, a ministra descartou a tese de urgência processual para justificar a suspensão da prisão em pleno recesso do Judiciário. Caberá à magistrada estar de plantão durante o intervalo das atividades, iniciado na terça-feira (19) e a ser encerrado em 1º de fevereiro.
“[…] condenado em 23.05.2017, persiste o autor da presente ação a opor recursos buscando esquivar-se do cumprimento da pena na forma imposta por este Supremo Tribunal! […] Bom direito não arrasta processos por décadas sem conseguir provar sequer sua existência! Mesmo em um sistema processual emaranhado e dificultoso como o vigente no Brasil…”, exclamou a ministra, acrescentando que o deputado condenado teve a oportunidade de se defender por dez anos desde a sentença em primeira instância.
“[…] a ética constitucional impõe que a parte não transforme instrumentos legítimos de defesa em atalhos espúrios a tolher o Estado de atuar e fugir do acatamento à lei e às decisões judiciais. Recorrer é legítimo, abusar deste direito pode configurar fraude processual”, acrescentou a juíza.
Ontem (quarta, 20), o juiz Bruno Aielo Macacari, da Vara de Execuções Penais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), determinou a transferência de Maluf para o Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. Já folclórico no noticiário político-policial, a penitenciária abriga, entre outros nomes, o ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB) – aliado de Michel Temer investigado no caso do apartamento com R$ 51 milhões em malas de dinheiro –, o “deputado-presidiário” Celso Jacob (PMDB-MG), que foi proibido de voltar ao mandato, e o ex-senador Luiz Estevão (PMDB-DF), ambos já cumprindo sentença.
Câncer
Ontem (quarta, 20), depois que Maluf foi levado à PF em são Paulo, a defesa do deputado já havia avisado que requereria ao Supremo a transformação da pena em prisão domiciliar, alegando que ele padece de câncer na próstata. A solicitação foi adiantada por um dos advogados de Maluf em São Paulo, Ricardo Tosto. Cármen Lúcia faz menção ao assunto em seu despacho.
“Quanto às alegações de questões relativas à saúde do Autor, suscitadas pela defesa, que demonstrariam o perigo da demora da decisão sobre o cumprimento da pena em regime de prisão domiciliar, é de se anotar que o exame e o juízo quanto a esta circunstância dependem de análise específica e objetiva das circunstâncias fáticas, a demandarem verificação da unidade prisional à qual encaminhado o condenado. As condições necessárias para a sua segurança física e psicológica, o atendimento de eventuais necessidades específicas em razão de moléstias de que seja acometido devem a ser comprovadas”, anotou a ministra.
“O quadro clínico do sentenciado deverá ser objeto de perícia pelo órgão competente e intercorrências comprovadas na saúde do condenado deverão ser averiguadas segundo determinado pelo juízo competente no estabelecimento prisional, que será ouvido sobre as condições de prestar a assistência médica necessária”, acrescentou Cármen Lúcia.
Perda de mandato
Maluf espera a conclusão de detalhes logísticos e burocráticos para ser transferido para o presídio da Papuda. A Câmara foi notificada sobre ordem de cumprimento da pena na noite desta quarta-feira (20).
Devido a dispositivo da Constituição, a Casa legislativa correspondente deve declarar a perda de mandato de parlamentar que tenha recebido condenação criminal com trânsito em julgado. Presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) já disse que a questão será judicializada nos próximos meses, após o recesso parlamentar. Ele lembra que as duas turmas especiais do STF divergem sobre quem deve deliberar sobre a perda de mandato – uma diz que cabe à Secretaria-Geral da Mesa declarar vaga a cadeira do condenado, enquanto outra diz que a decisão cabe ao plenário da Casa, em votação.
“A nossa interpretação é que cabe ao plenário da Câmara essa decisão. Eu vou estudar direitinho [o assunto]. Já pedi para a área jurídica da uma olhada, porque se houver mesmo uma divergência entre as duas turmas, vou entrar com um recurso para que o plenário tome uma posição conjunta. O Supremo precisa harmonizar isso aí”, ponderou o deputado ao jornal O Globo.
A denúncia
A denúncia formulada pelo Ministério Público acusa Maluf de receber propina por meio de contratos públicos com as empreiteiras Mendes Júnior e OAS, com sede em São Paulo, durante a gestão do deputado como prefeito da capital paulista (1993-1996). Os recursos foram desviados, segundo o MP, das obras de execução da Avenida Água Espraiada, atualmente conhecida como Avenida Roberto Marinho. O custo total desse empreendimento girou em torno de R$ 800 milhões.
Em setembro de 2015, Maluf já havia virado réu no STF pela quinta vez. Além da condenação em pauta, o deputado foi condenado por lavagem de dinheiro e terá de pagar uma multa de aproximadamente R$ 1,3 milhão. Durante o tempo em que foi prefeito de São Paulo, apontou a investigação, mais de US$ 170 milhões teriam sido lavados entre 1998 e 2006, dinheiro relativo às obras da Avenida Água Espraiada.
O entendimento foi de que Maluf “ocultou e dissimulou” valores oriundos de corrupção passiva. Devido à gravidade do crime, ministros do STF decidiram que ele teria de cumprir a sentença em regime fechado. Durante o julgamento, o ministro Luís Roberto Barroso, ao declarar seu voto, afirmou que o rotineiro desvio de dinheiro público é “uma das maldições” da República e “tem nos mantido atrasados e aquém do nosso destino”.
Graças às complicações judiciais que tem enfrentado, o deputado consta da lista de procurados da Interpol, a polícia internacional. Nessa situação, Maluf pode ser preso caso deixe o país, seja qual for seu destino.
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