Leia também
Na prática, a proposta abre caminho para a criação de novos municípios, impedida por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2008, que condiciona a liberação de novos entes municipais à aprovação de uma lei complementar pelo Congresso. Naquele ano, o Supremo ameaçou extinguir 57 municípios criados após 1996, quando foi aprovada uma emenda à Constituição que restringia a criação desenfreada de novas cidades. Os ministros declararam inconstitucional a existência desses municípios por entender que a emenda exigia uma lei complementar, com a definição de critérios para se criarem novos municípios.
Emenda à emenda
Em vez de aprovar a lei complementar, os parlamentares decidiram mudar novamente a Constituição, no final de 2008, para validar a existência daqueles 57 municípios. O vazio legislativo para os demais casos de emancipação continua. Somente agora, cinco anos após a determinação do Supremo, os deputados se mostram dispostos a levar adiante a proposta de regulamentar o assunto.
Aprovado ainda em 2008 pelo Senado, o projeto de lei complementar só foi retirado das gavetas da Câmara há duas semanas, com a aprovação de um requerimento de urgência para que o texto passasse ao plenário sem passar pelas comissões. Nesses cinco anos de tramitação na Casa, não chegou a ser apreciado por qualquer colegiado.
Estudo de viabilidade
A proposta que está para ser votada estabelece pré-requisitos, como a realização de estudo de viabilidade econômica, política e ambiental e a definição de uma população mínima, para a fundação, fusão ou incorporação de novos municípios. O texto também convalida a legalidade das cidades criadas desde 1996.
Enquanto não for aprovada a lei complementar, nenhum município pode ser criado no Brasil, segundo o Supremo. A votação, porém, promete causar polêmica. “Não é consensual, não é unânime. Há parlamentares que votaram contrariamente e há outros que querem discutir. Portanto, nós precisamos ter segurança para que não faltem alguns votos”, advertiu Henrique Eduardo Alves ao anunciar a inclusão do texto na pauta. Por se tratar de projeto de lei complementar, a proposta precisa do apoio de mais da metade dos deputados, ou seja, de 257 votos.
Risco de “boom”
O efeito pretendido com as mudanças causa divergência. Parecer técnico elaborado pela bancada do Psol na Câmara alerta para a possibilidade de a proposta detonar uma nova explosão no número de municípios, a exemplo do que ocorreu entre 1991 e 1996. Nesse período, o país ganhou mais de mil novas cidades – saltou de 4.491 para 5.507.
Para o partido, o projeto enviado pelo Senado tem falhas: não define critério objetivo para definir a participação dos novos entes municipais no Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e abre caminho para a disputa intermunicipal por empresas instaladas nas áreas emancipadas. “Não equacionadas as referidas questões, abre-se a possibilidade de ocorrer o ‘boom’ de criação de novos municípios”, adverte a nota técnica.
Novos municípios implicam novos prefeitos, vices e vereadores – potenciais cabos eleitorais de parlamentares -, que passam a controlar política e administrativamente mais cidades. Por outro lado, determinadas localidades reclamam de isolamento das sedes municipais e reivindicam a emancipação como alternativa para resolver seus problemas econômicos e sociais.
Novas regras
Pela proposta em discussão, os novos municípios precisam nascer com uma população mínima – 10 mil habitantes se localizado nas regiões Sul e Sudeste; 7 mil, na região Nordeste, e 5 mil, nas regiões Centro-Oeste e Norte. O eleitorado deverá ser superior à metade de seus habitantes. Também será preciso comprovar a existência de núcleo urbano definido, com infraestrutura compatível, e arrecadação superior à média de 10% dos municípios do estado.
O projeto de criação de novos municípios deverá ser apresentado na Assembleia Legislativa do respectivo estado com o apoio de, pelo menos, 10% dos eleitores residentes na área envolvida. Em seguida, no prazo de 180 dias, deve ser concluído um estudo sobre a viabilidade econômica, política e ambiental das duas localidades atingidas pelas mudanças.
Caso o documento seja aprovado pela Assembleia, o próximo passo será a organização de um plebiscito para que a população local decida. Se a maioria for favorável à criação, os deputados estaduais votarão um projeto de lei criando a nova localidade. O prefeito, o vice e os vereadores só serão eleitos na eleição municipal seguinte.
Deixe um comentário