Damata Que Renato Russo influenciou muita gente, disso ninguém duvida. Mas quem fez a cabeça do maior letrista do rock nacional? Zé da Mata. Ele passava filmes, hoje considerados cult, no final dos anos 70, no teatro da Escola Parque, na Cultura Inglesa e outros circuitos alternativos. O jovem Renato não perdia um. O baiano Damata, como é conhecido, vive em Brasília desde 1965 e o seu Cinema Voador faz a alegria de muita gente, passando filmes num telão sobre um ônibus na periferia de Brasília. É o autor do famoso bordão: é cultura ou crack!
Dedo mindinho Juscelino só calçou seu primeiro par de sapatos aos 12 anos. Verdade. Mas não porque fosse um menino pobre. Numa brincadeira fraturou o dedo mínimo (ou mindinho) do pé direito, o que lhe causava enorme desconforto ao usar sapatos. Claro, esse mito-do-meninopobre-que-nem-tinha-sapatos sempre foi muito explorado em sua mitologia política. O desconforto no uso de calçados acompanhou JK a vida toda. Quando adulto, JK sempre preferia sapatos sem cadarços, mais fáceis de tirar. Por isso tantas fotos de JK só de meias. Agora, uma pergunta: por que Juscelino era então considerado um pé-de-valsa? Ao dançar, o desconforto desaparecia? Pelo que sei, ele dançava de sapatos!
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Desamor Dois assassinatos maculam até hoje a alma da cidade. Ana Lídia é a nossa primeira santa. O seu túmulo no Campo da Esperança é o mais visitado no Dia de Finados (sim, mais que o antigo jazigo de JK, cuja lápide permanece no local) e no Dia da Criança. Sequestrada na porta da escola, foi torturada, estuprada, morta e semienterrada. Os investigadores (!) fizeram de tudo para que não se chegasse aos responsáveis pelo hediondo crime, ignoraram várias evidências, para, deliberadamente, dificultar a identificação dos assassinos. A morte de Ana Lídia, em 1973, teve grande repercussão na imprensa local, suspeitando-se da participação direta de filhos de altas autoridades civis da ditadura militar. Logo o caso foi abafado e o tema, censurado. Dentro do Parque da Cidade, o local de brinquedos para as crianças tem o nome de Parque Ana Lídia. Outro assassinato, cometido 24 anos depois, também deve figurar neste triste e vergonhoso verbete. A morte do índio pataxó Hã-há-hãe Galdino Jesus dos Santos. Aconteceu na noite de 20 de abril de 1997, quando cinco jovens da chamada “classe alta” de Brasília, segundo um deles “para se divertir”, colocaram gasolina em um índio que confundiram com um mendigo dormindo num ponto de ônibus. O índio morreu poucas horas após o ato criminoso, dilacerado de dores. Os assassinos foram julgados em 2001 e condenados a 14 anos de prisão, mas em 2004, apenas três anos depois, já estavam todos em liberdade. Filhos de pessoas influentes, tiveram regalias e privilégios na prisão. O artista plástico Siron Franco criou um belo monumento em homenagem ao índio Galdino, e o local onde ocorreu o bárbaro crime, entre as quadras 703 e 704 Sul, chama-se hoje Praça do Compromisso. Compromisso com o outro.
Descer Taí um verbo que o brasiliense aprende cedo. “Hoje você está de castigo. Não vai descer”. E o amiguinho lá embaixo, no gramado, se esgoelando: “Desce. Desce logo!”. É por isso que os blocos das superquadras têm, no máximo, seis andares. Para que a mãe possa gritar lá de cima: “Sobe. Agora! Tá na hora do almoço”, e o filho ouvir. A magia das superquadras invadindo infâncias, tardes e manhãs.
Despedida Mário Fontenelle foi o fotógrafo que registrou os primeiríssimos momentos da cidade que nascia, como o já clássico Marco Zero, o cruzamento dos eixos. Lucio Costa, em uma de suas raras visitas à cidade, nos anos 80, soube que o fotógrafo estava muito doente, aos 65 anos, num asilo. Foi então, com a filha Maria Elisa, visitá-lo no Lar dos Velhinhos Maria Madalena, no Núcleo Bandeirante. Quando Mário viu Lucio, “o seu rosto envelhecido como que se iluminou”, segundo relato do amigo urbanista. Mas quase não conversaram porque, ambos conscientes de que aquele momento era de um adeus definitivo, preferiram falar pelo olhar.
Diamantino Isso mesmo, com “o” no final. Como passei a infância nessa cidade ao norte de Cuiabá, MT, digo sempre que Diamantino é a minha Diamantina, apenas 15 anos mais nova que a cidade natal de JK. Coloniais, unidas pelo diamante, esse mineral que nenhum outro pode riscar, apenas o próprio. Pronto. Era o que eu queria. Colocar minha querida Diamantino neste livro!
Diplomata Anos 70. Lançamento, com grande pompa, do edifício Diplomata. Muitos corretores tinham dificuldade em pronunciar o nome, trocando o “l” pelo “r”. Trocaram também o nome do edifício. Vai se chamar Edifício Embaixador. Está lá, no Setor Comercial Sul.
Divórcio Brasília, capital do divórcio. Isso obviamente reforçava a ideia de Brasília como uma cidade estranha, onde as pessoas não se adaptavam. Sim, muitos se separavam, mas usando de má-fé. O casal continuava junto. E como cada funcionário público tinha direito a um apartamento, o outro era simplesmente alugado! Brasília, capital do divórcio? Ha, ha, ha!
Dois mil, cento e sessenta e seis Ano em que Brasília deixará de ser capital e se chamará Braxília. Senão, vejamos: Salvador foi capital de 1549 a 1763 – 214 anos. Rio de Janeiro de 1763 a 1960 – 197 anos. Brasília será capital do Brasil por exatos 206 anos.
Dom Bosco O mais interessante no Sonho de Dom Bosco é a manipulação que a profecia sofreu nas mãos dos fundadores de Brasília. É que havia uma ameaça real de que o local para a construção da capital fosse o Triângulo Mineiro, onde chegava o trem. Aí, os goianos, espertamente, notando esta manobra, apelaram para o sonho do santo italiano, João Melchior Bosco, que viveu entre 1815 e 1888. O curioso é que o sonho não fala em cidade, cita apenas os paralelos próximos aos do Quadrilátero Cruls e menciona um lago. O sonho serviu também para justificar, perante uma população então majoritariamente católica, a construção de Brasília. Estava prevista. É a realização do sonho de Dom Bosco. Sempre dizem que Dom Bosco é o padroeiro de Brasília, mas a padroeira da cidade é, pelo que sei, Nossa Senhora Aparecida, nome da nossa Catedral. Mas há uma confusão aí, difícil de entender. A cidade então tem um padroeiro e uma padroeira. Melhor pra nós.
Drive-in Incrível. Nos quarenta anos em que estou aqui nunca fui ao Cine Drive-in.
Dupla Isso. Chegue no balcão e diga apenas: dupla. Ou melhor: “Uma dupla, por favor”. Todo brasiliense que estiver em uma Pizzaria Dom Bosco vai entender. É um verdadeiro clássico da culinária local, que tem quase a idade de Brasília. A tal dupla são dois pedaços de pizza, sobrepostos, envoltos por um guardanapo (!). E com um só sabor: muçarela com molho de tomate e orégano. Para acompanhar, um mate gelado ou suco de caju. Mas você pode pedir uma simples, se quiser. Servida há décadas na 107 Sul, o lugar não tem cadeira e está quase sempre cheio. Duplamente deliciosa e tradicionalíssima!
Duque de Caxias Avenida que fica no SMU – Setor Militar Urbano. É aquela pista larga que une o Eixo Monumental ao Noroeste, projetada para grandes desfiles militares. Certa vez ouvi que essa avenida poderia ser usada como uma pista alternativa no caso de um pouso de emergência em Brasília. Pelo que sei, isso nunca aconteceu. Por outro lado a colocação de postes de iluminação inviabilizou seu uso para tal fim. Enfim, lenda urbana. Ou não?
Outros verbetes de BRASÍLIA-Z – Cidade-palavra, de Nicolas Behr:
Brasília de A a Z: o que diz o A
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