O presidente nacional do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), em entrevista ao site do PT, defende o fim da reeleição, com ampliação do mandato para cinco anos a cargos de todos os níveis administrativos: prefeitos, governadores e presidente da República.
Ele também afirma que seria necessário unificar as eleições, fazendo com que elas se dessem no mesmo ano. "Podemos tentar encontrar um acordo em torno disso, aprovando a reforma política, a fidelidade partidária, o financiamento público, o voto em lista e o fim da reeleição com mandato de cinco anos", afirmou.
Berzoini também afirma que o principal motivo da reunião do Diretório Nacional do PT, que começou hoje (20) e vai até amanhã, é a discussão sobre os principais pontos da reforma política, em especial, o voto em lista fechada, que não é consensual no partido.
Confira a íntegra da entrevista de Berzoini
Qual é a pauta da reunião do Diretório Nacional na próxima sexta e sábado?
Leia também
O principal motivo para convocar essa reunião foi a discussão sobre a reforma política. Como o assunto voto em lista não foi discutido tanto quando deveria, apesar de já termos uma resolução apoiando o voto em lista, avaliamos que era necessário fazer um debate no Diretório Nacional e atualizar nossa deliberação.
Vai se votar uma resolução com a posição oficial do partido sobre a reforma política como um todo?
Sim. Dentro do tema geral, destacamos a questão do voto em lista, por ter uma polêmica maior. Tenho dito que o conceito do voto em lista é quase sempre apoiado no PT. O problema é que as pessoas ficam se perguntando como conceber a lista, se haverá algum mecanismo democrático e como reconhecer legitimidades ou representatividades que não se conformam dentro da vida partidária apenas. Uma liderança popular que não tenha necessariamente influência na base partidária pode eventualmente ser reconhecida como tal politicamente pelo partido, pela Convenção? Existe um mecanismo estatutário para fazer isso ou não? Então fica essa dúvida, que assalta a todos. E tem também o medo de que, não havendo uma democracia ampla, a máquina fica com muito poder sobre as listas. É um grande dilema. E, para o leitor comum, lamentavelmente a tendência é que ele sinta que está perdendo o direito de escolher seu próprio deputado.
Mas é um direito falso porque, hoje, quando ele vota em um candidato que não se elege, ele está ajudando a eleger outros. Hoje, quando vota numa coligação, ele vota no candidato de um partido e elege candidato de outro partido. Então é um sentimento que não corresponde à realidade.
Uma das formas de resolver esse problema seria reduzir o número de mandatos dos parlamentares. Isso tem alguma chance de ocorrer?
Acho difícil aprovar num ambiente em que os votantes de uma modificação dessas são os próprios interessados que já são deputados. Eu pessoalmente sou favorável a essa limitação de dois ou até acabar com a reeleição, que é outro assunto que reaparece agora. Mas é um assunto difícil de aprovar.
Além da reforma política, o Diretório Nacional discutirá indicações de cargos no segundo escalão?
Não. O que vamos fazer é dar informes sobre como o partido está conduzindo a relação com o governo. Mas não cabe uma discussão sobre isso, até porque são informações muito fragmentadas, as pessoas que atuam por setor, ou nos estados, ou já têm uma avaliação sobre o desempenho dos ministérios… Se abrirmos uma discussão sobre isso, evidentemente precisaríamos de muito mais tempo do que temos no Diretório e exigiria um grau de uniformização que é impossível conseguir a essa altura do campeonato.
O sr. chegou a visitar ministérios para discutir a composição do segundo escalão. Como a questão está avançando?
Visitei alguns ministérios e também tenho mantido contato com a equipe formada pelo presidente para tratar desse assunto [os ministros Dilma Rousseff, Paulo Bernardo, Luiz Dulci e Walfrido Mares Guia]. Mas o debate ainda está muito insipiente. Creio que ainda vamos ter muito trabalho pela frente.
No jantar do PMDB com Lula na semana passada, os peemedebistas demonstraram uma unidade incomum. Um deputado do partido chegou a dizer que esta união liberta Lula da tutela do PT. Como o PT vê isso?
Quem conhece o presidente Lula sabe que ele nunca se submeteu à tutela de ninguém. E eu acredito que a relação do PT com PMDB tende a ser aperfeiçoada ao longo do próximo período. O PMDB é um partido muito importante para a viabilização da coalizão, e o PT também. São dois partidos que têm que dar o exemplo aos demais, inclusive, em termos de bom relacionamento, e é isso
que tenho procurado fazer na relação com o PMDB.
A executiva do PPS decidiu, na semana passada, não fazer oposição sistemática ao governo. A decisão, na sua opinião, é mais um revés para a oposição PSDB-DEM?
Eu acredito que os partidos que se dispuserem a fazer oposição sistemática não terão sucesso junto à opinião pública. O presidente foi reeleito com uma grande votação e vários sinais da economia e da área social mostram que o segundo mandato tende a ser melhor que o primeiro. Então a oposição sistemática tende a perder espaço junto à opinião pública, e não a ganhar espaço. A decisão mais correta é tratar caso a caso. Me recordo quando estava na oposição, que em muitas situações pudemos negociar com a situação da ocasião e aperfeiçoar projetos. E em outros casos votamos contra porque eram projetos que iam contra nosso entendimento. Mas não era uma oposição sistemática e, sim, uma oposição que tratava dos temas, sempre com muita responsabilidade em relação
ao país. A bancada do PT votou, por exemplo, favorável à lei complementar que viabilizou o acordo do fundo de garantia, mesmo com muita gente da CUT tendo opinião contrária. E votamos favoravelmente, por exemplo, aos projetos que regulamentaram a Previdência complementar, ressalvando apenas votações de destaques, e o projeto também aperfeiçoava a legislação da Previdência complementar dos trabalhadores. Portanto, não há razão para se fazer uma oposição de maneira sistemática, e creio que os partidos vão perceber isso à medida que o ano transcorre.
O presidente Lula deve ir à 1ª Cúpula Energética Sul-Americana, na Venezuela, e abordar a questão dos biocombustíveis e do
etanol, que vem gerando polêmica, uma vez que Hugo Chávez e Fidel Castro têm sustentado que essa política energética pode prejudicar a produção de alimentos. Na sua opinião, isso é possível?
Há uma vertente de alguns ambientalistas e, curiosamente, também de Fidel Castro e Chávez contra o etanol com um argumento muito peculiar de que o aumento da produção de bioenergia poderia reduzir a produção de alimentos e encarecê-los. É uma tese que não se sustenta porque, se houver um movimento de encarecimento dos alimentos a ponto de se tornar menos viável a sua comercialização em alguns países, a tendência maior é que a agricultura migre da bioenergia para os alimentos, que estarão com preço maior. Então, na verdade, a tendência é que a própria flutuação de preços nos dois mercados regule as áreas destinadas à produção de bioenergia e as áreas destinadas à agricultura para alimentação. Além do mais, um país como o Brasil ainda tem muita terra não explorada pela agricultura.
Mesmo preservando florestas e tendo um cuidado ambiental muito grande, ainda assim, há muita terra disponível. E o aumento da produção tanto do biodiesel quanto do etanol mostra que é possível evoluir a quantidade de energia gerada por hectare. Por exemplo: no caso do etanol, existe estudo já avançado para a produção do álcool a partir do bagaço da cana já esmagada. Ou seja, da celulose que compõe o bagaço. Há também um outro estudo muito avançado que permite produzir álcool a partir da palha da cana, com teor de energia muito grande.. Outro detalhe: quando começou o programa do álcool do Brasil, nosso país tinha apenas três variedades de cana. Hoje, com pesquisas da Embrapa e de outros institutos, o Brasil tem mais de 120 variedades de cana, cada uma delas mais adequada para um tipo de solo, e todas elas mais energéticas do que a cana que existia há 30 anos. Então não há razão para essa discussão.
É uma falsa polêmica. Evidentemente, um país que tem muito petróleo, como a Venezuela, pode eventualmente se sentir ameaçado com a redução do impacto do petróleo. Mas o mundo ainda vai conviver com o petróleo durante muitas décadas porque não há substituto. O etanol representa uma pequena porcentagem e sua importância refere-se à menor emissão de gases prejudiciais para o efeito estufa, ao mesmo tempo que tem um potencial de reduzir a dependência do petróleo, o que permite que países como o Brasil, por exemplo, estejam praticamente auto-suficientes. Ou seja, o álcool, mais o biodiesel, mais o petróleo somam a matriz energética brasileira, e isso poderia inclusive beneficiar os países da África que, com o etanol, poderão ampliar sua renda e sua capacidade de gerar empregos.
O fim da reeleição voltou à pauta, aparentemente unindo petistas e tucanos. Na sua opinião, a reeleição acaba neste mandato?
Acho que a reeleição não é necessariamente um mal. Acredito que um dos problemas da reeleição é que o mandatário se sente moralmente obrigado a disputar a eleição seguinte, sob pena de ser considerado previamente derrotado. Isso é um problema da política e vale para qualquer representação política associações, sindicatos e vale também para presidente da República,
governadores e prefeitos. Por outro lado, não havendo reeleição, também muita gente tem a obrigação moral de fazer seu sucessor.
Em vários eventos de eleições no Brasil houve gastos extraordinários e avaliação de que houve exageros em obras em função da necessidade de o governador ou presidente fazer seu próprio sucessor. Acho que não há fórmula perfeita para isso. Eu defenderia, como fórmula mais adequada para um país como o Brasil, um mandato um pouco maior um ano a mais, sem reeleição para todos os níveis administrativos: prefeitos, governadores e presidente. Se possível, com eleições unificadas no mesmo ano, de modo que teremos um ano eleitoral e quatro anos sem eleição, para que seja possível dar um curso mais efetivo à administração do Estado brasileiro.
Mas quais as chances de se aprovar o fim da reeleição em curto prazo?
Acho que não é fácil porque nós teremos sempre situações no Parlamento em que os aliados de deputados e senadores estão em situação diferente. Alguns cumprem o segundo mandato, outros cumprem o primeiro mandato… Acho que podemos tentar encontrar um acordo em torno disso, aprovando a reforma política, a fidelidade partidária, o financiamento público, o voto em lista e o fim da reeleição com mandato de cinco anos.
Deixe um comentário