Jane Araújo/ Ag. Senado
Soraia Costa
Único representante do Partido Socialismo e Liberdade (Psol) no Senado, o cearense José Nery tem sido o destaque da oposição nas investigações contra o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Apesar de não ser membro do Conselho de Ética, Nery participa das reuniões da comissão como líder partidário para defender a posição de seu partido, autor da representação contra o senador alagoano.
Otimista, ele acredita que a comissão de relatores do caso está demonstrando boa vontade para dar continuidade às investigações e que “desde que não haja interferência indébita no cronograma de trabalho que foi elaborado pelo conselho”, a comissão deverá concluir a apuração dos fatos “em breve espaço de tempo” após o recesso parlamentar que começa amanhã e vai até a primeira semana de agosto.
Leia também
Ex-vereador, ex-seminarista e ex-militante das comunidades eclesiásticas de base, José Nery começou sua carreira política em Abaetetuba (PA), uma região que abrange 72 ilhas e localiza-se na região conhecida como baixo Tocantins. O agora senador foi para o Pará em 1985 participar da equipe de um programa de educação popular de uma organização não governamental ligada à Igreja Católica.
Antes disso, no entanto, ele já participava de programas sociais na cidade de Crateús, no sertão do Ceará. “Comecei minha trajetória política aos 16 anos, quando participei de um grupo de jovens que fazia trabalho de base junto aos agricultores da região. O trabalho resultou na construção de um centro cívico. Fui seminarista por dois anos, mas queria que a Igreja tivesse uma posição mais definida com relação às questões políticas. Depois entendi que como cidadão poderia servir melhor”, explicou Nery.
Em seu histórico no movimento social paraense, o senador lembra que chegou a lutar contra nomes que hoje voltaram a fazer parte de seu cotidiano. “Iniciamos o processo de organização dos assalariados rurais de grandes projetos da região de Abaetetuba, inclusive contra a Sococo, do atual senador João Tenório [PSDB-AL], e a Agropalma, que comprou a Agromendes dos mesmos donos da empreiteira Mendes Júnior”, destaca.
Ao ser questionado se nesses primeiros meses de legislatura conseguiu mais aliados ou mais inimigos, José Nery diz apenas que apesar de “pequenininho”, o Psol fez com que outros partidos apoiassem as investigações sobre o caso Renan iniciadas a partir de representação apresentada pela legenda à Mesa Diretora do Senado.
“O Psol, na atual conjuntura, entende que é sua missão histórica continuar defendendo princípios éticos, denunciando a quem se envolve em qualquer tipo de falcatrua para menosprezar os interesses da maioria do povo. E tanto no Senado como na Câmara, com a nossa bancada de apenas quatro parlamentares, continuaremos fazendo essa batalha, essa luta contra a corrupção e contra a impunidade. E, ao lado dessa luta, alertando o povo brasileiro e os diversos organismos da sociedade sobre a necessidade de nos aprofundarmos em uma pauta de discussões que ajude o país a enfrentar a desigualdade, a miséria de milhões, a luta contra a violência no campo, a luta contra a violência urbana, a luta por políticas públicas que dêem qualidade de vida e dignidade ao nosso povo”, argumenta José Nery.
O senador faz questão de enfatizar, no entanto, que nem ele e nem seu partido querem ser vistos como “detentores do patrimônio ético” e que a intenção é buscar a companhia das demais legendas na luta contra a corrupção.
Suplência
Apesar de ter começado cedo na política, José Nery demorou dez anos para disputar um mandato eletivo. “Sempre me senti muito à vontade para fazer política, mas não para exercer mandato. Coordenei todas as campanhas do presidente Lula à presidência da República em meu estado, além de campanhas para governador e prefeito, mas não pensava em ser candidato”.
Filiado ao PT desde 1985, Nery ajudou a fundar a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e o Sindicato dos Metalúrgicos em sua região. Em 1996 candidatou-se pela primeira vez a um mandato eletivo. Foi eleito vereador de Abaetetuba e se reelegeu em 2000.
Em 2002 foi convidado a participar como primeiro suplente na chapa de Ana Júlia Carepa, atual governadora do Pará, na disputa pelo Senado Federal. Apesar da chapa ter sido vitoriosa, Nery concorreu a vereador em 2004, ganhando novamente as eleições. O senador deixou o PT em 2005 e foi um dos fundadores do Psol.
“Para o Senado você não elege um senador, elege uma chapa. O maior problema do suplente é ele não aparecer durante a campanha, não ser conhecido pelos eleitores”, defende José Nery, acrescentando que foi escolhido por seu histórico de luta nos movimentos sociais e que, assim como ele, há outros suplentes na mesma situação.
“Muitos partidos têm feito mau uso da suplência quando concedem essa vaga a quem não têm uma história na luta do povo ou algum tipo de representatividade social e política. Tem situações em que o suplente acaba sendo um parente próximo ou alguém que financia a campanha do titular”, argumentou.
Atualmente os senadores são eleitos para um mandato de oito anos e, além dos titulares, a chapa é formada por dois suplentes. Os suplentes que assumem o mandato após renúncia do titular são conhecidos como biônicos, pois, muitas vezes, eles nem chegam a aparecer durante a propaganda eleitoral gratuita e tomam posse sem serem conhecidos pelos eleitores e sem terem recebido votos populares.
O fim da suplência para o Senado é um dos pontos citados pelos defensores da reforma política mais ampla, como a sugerida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Além de José Nery, estão hoje em exercício nove suplentes. São eles Adelmir Santana (DEM-DF), Flexa Ribeiro (PSDB-PA), João Pedro da Costa (PT-AM), Neuto de Conto (PMDB-SC), Paulo Duque (PMDB-RJ), Sibá Machado (PT-AC), Valter Pereira (PMDB-MS), Wellington Salgado (PMDB-MG) e Wilson Santiago (PSDB-PR).
Leia os principais trechos da entrevista com o senador José Nery
Congresso em Foco – O senhor chegou ao Senado como suplente da agora governadora do Pará Ana Júlia (PT). Qual a opinião do senhor sobre a existência dos suplentes no Senado?
José Nery – Primeiro, a chapa do Senado é composta por três cidadãos: o titular e dois suplentes. Essa é uma disposição constitucional. Portanto, questionar isso significaria mudar a regra que define a composição de chapa para o Senado. Muitos partidos têm feito mau uso da suplência quando concedem essa vaga a quem não têm uma história na luta do povo ou algum tipo de representatividade social e política. Tem situações em que o suplente acaba sendo um parente próximo ou alguém que financia a campanha do titular. Na minha experiência pessoal, ao ter sido indicado candidato a primeiro suplente em 2002 na chapa do Partido dos Trabalhadores, tenho plena consciência de que essa indicação deveu-se única e exclusivamente à nossa participação nas lutas e nos movimentos sociais no estado do Pará e na região do baixo Tocantins onde atuo até hoje. Portanto, a questão do suplente eu diria que depende muito das escolhas que os partidos e as coligações fazem e que, em se mantendo essa regra de composição de chapas com três membros para o Senado, os partidos precisariam, durante a campanha, propiciar o conhecimento aos eleitores daqueles que acompanham o titular.
Mas na opinião do senhor esse aumento de informação é o suficiente, ou o ideal seria ter apenas um titular para o Senado, sem os suplentes?
Olha, essa questão eu diria que precisaria de um bom debate. Acho que o fato de ter suplentes em uma chapa depende muito dos critérios que são utilizados para fazer a escolha. Não só na minha situação como na de outros suplentes, há aqueles que têm feito parte das chapas e que procuram honrar com os compromissos e princípios da ética, da transformação e da luta em benefício da sociedade. Se honrar esse compromisso eu creio que não teria problema fazer uma chapa composta por suplentes. O fundamental é dar conhecimento de quem são esses membros que formam a chapa para a sociedade e saber se existe compromisso e uma história que justifique a escolha deles para uma função tão importante.
O senhor concorda com a manutenção do mandato de oito anos no Senado?
Esse é um tema que também exige um bom debate porque o Senado é a casa da Federação, ela representa os estados em pé de igualdade e com igual número de representantes – três por estado. Ao depender das escolhas que a população faz, se são escolhas que representem os interesses verdadeiros da cidadania e do povo de cada estado eu creio que não há tanta importância se o mandato é de oito ou de quatro anos, desde que as escolhas sejam criteriosas e guardem o interesse popular. Tem uma tradição na história republicana para a periodicidade dos mandatos no Senado. Apesar da crise, o Senado é a casa da Federação, a casa política onde há uma maior estabilidade das relações, seja na relação com os estados representados, seja com os demais poderes da República. Então eu acho que a questão fundamental é que a escolha dos partidos, na hora de decidir seus candidatos, e das pessoas, por meio do voto, seja feita de maneira criteriosa para que os interesses da população sejam bem representados.
Nesse início de legislatura houve problema com dois senadores. Um deles, Joaquim Roriz (PMDB-DF), tinha acabado de entrar no Senado e já renunciou. Com o quadro atual, o senhor acha que as escolhas estão justificando os oito anos de mandato?
A questão da periodicidade não é a fundamental. Por isso eu falo que o importante é a escolha da população diante dos candidatos apresentados pelos partidos. Se os partidos tivessem mais cuidado ao selecionar seus candidatos; se eles, os candidatos, fossem escolhidos pelos méritos e pelos reais serviços prestados à população, pela história e pelo compromisso com o interesse público; e se muitas candidaturas não fossem a expressão do poderio econômico e de relações políticas altamente criminosas, como a gente costuma ver, não teria porque discutir periodicidade do mandato. Por isso que os partidos têm a tarefa de fazer bem suas escolhas e os eleitores precisam julgar melhor, avaliar melhor os candidatos, para não escolher representantes que, em poucos dias, como nós estamos vendo aqui no Senado, são colocados em denúncias. Fatos que, na verdade, comprometem o exercício da política dentro daquela visão de que os políticos devem ter compromisso primeiro com o público sem deixar prevalecer os interesses pessoais. Então oito ou quatro anos depende muito de quem e com qual programa vai disputar uma eleição.
O senhor é o único representante do Psol no Senado e seu partido é o único que tem entrado com representações para investigar as denúncias que estão surgindo contra os senadores. Na opinião do senhor, se não houvesse o Psol no Senado o que aconteceria?
Primeiro nós somos herdeiros de uma tradição política em que defender a ética e o compromisso com os interesses populares e a política como instrumento de mudança da vida das pessoas é o que tem que prevalecer na nossa atuação. O Psol é um partido novo, mas a grande maioria de seus membros vem de histórias de lutas anteriores, muitos deles oriundos do Partido dos Trabalhadores (PT). E nós consideramos que só estamos honrando aquilo que a história nos ensinou fazendo denúncias que envolvam qualquer tipo de falcatrua, desprezo ao interesse público, malversação de dinheiro, interesses privados querendo dirigir o interesse público. Lutamos contra tudo isso e, portanto, o Psol, na atual conjuntura, entende que é sua missão histórica continuar defendendo esses princípios éticos, denunciando a quem se envolve em qualquer tipo de falcatrua para menosprezar os interesses da maioria do povo. E tanto no Senado como na Câmara, com a nossa bancada de apenas quatro parlamentares, continuaremos fazendo essa batalha, essa luta contra a corrupção e contra a impunidade. E, ao lado dessa luta, alertando o povo brasileiro e os diversos organismos da sociedade, inclusive o próprio Congresso, sobre a necessidade de nos aprofundarmos em uma pauta de discussões que ajude o país a enfrentar a desigualdade, a miséria de milhões, a luta contra a violência no campo, a luta contra a violência urbana, a luta por políticas públicas que dêem qualidade de vida e dignidade ao nosso povo. Então o Psol aqui no Senado, a meu ver, cumpre a sua função de tentar apurar toda e qualquer denúncia que ferir a ética e o decoro, e a cidadania e os direitos do povo brasileiro. E gostaríamos de ter na nossa companhia outros partidos fazendo isso. E aguardamos que no processo político que vamos construindo aqui, o Psol possa encontrar outros que se associem a essas nossas preocupações, a essa nossa atuação. Porque nós não queremos ser detentores desse patrimônio da ética, até porque não somos detentores da verdade. Somos detentores de um compromisso e queremos vê-lo compartilhado com outros atores políticos para ajudar a transformar o nosso país.
Nesse início de legislatura o senhor acredita que o Psol fez mais aliados ou mais inimigos com essa postura combativa?
Para tomar a iniciativa em relação às apurações das denúncias que envolvem membros do Congresso ou membros do Senado especificamente, eu gosto de observar como estão agindo os membros de outros partidos que antes foram situação e agora são oposição e que, em um primeiro momento, estavam colocando a perspectiva de um grande acórdão para que nada fosse apurado aqui. Mas os fatos se tornaram incontestáveis a tal ponto que hoje, quando vejo os representantes de muitos partidos defendendo a continuidade das investigações, estão defendendo investigações de causas que o Psol, pequenininho, patrocinou inicialmente, sem querer ter, evidentemente, a prerrogativa de absoluta supremacia no trato da questão ética. No plenário estão debatendo para que haja o aprofundamento das investigações, o completo esclarecimento dos fatos e a punição daqueles que tiverem comprovados o envolvimento com ilícitos.
A atitude do PT com relação ao caso Renan decepcionou o senhor?
O PT age como um partido da coalizão de governo, do qual o PMDB e o senador Renan fazem parte. Agora, pelo que eu pude perceber de boa parte do PT foi que, diante da tentativa de sepultar nossa representação a qualquer custo, houve membros do partido que se posicionaram pela apuração. É claro que nós esperávamos uma atitude mais direta e incisiva na defesa da apuração dos ilícitos que foram denunciados e que fazem parte da representação que o Psol fez junto à Mesa e ao Conselho de Ética, mas o que é fundamental é que os fatos foram mais fortes do que a intenção de quem quer que seja de tentar sepultá-los.
Qual a expectativa do senhor com relação à postura do Conselho de Ética após a volta do recesso parlamentar?
Primeiro houve um conjunto de obstáculos que a cada reunião do conselho nos últimos dois meses se transformou em um batalha silenciosa e às vezes nem tanto para fazer com que esses fatos não fossem apurados. A minha expectativa é que vencida essa primeira etapa, quando se afirmou efetivamente a necessidade de apuração e isso foi compreendido pelo Conselho de Ética sob pena da sua total e absoluta desmoralização, então o Conselho de Ética passou a adotar os procedimentos que, a meu ver, levarão à apuração dos fatos. Tenho que manifestar a minha confiança de que a comissão de relatores que estão investigando especificamente a representação contra o senador realizará o seu trabalho, apresentará um relatório ao conselho, que deve aprová-lo naquilo que conseguir concluir, e submeterá, esperamos nós, as suas orientações ao Plenário, que deverá se manifestar em última instância sobre a apuração desses fatos tão escabrosos que hoje colocam o Senado no chão. A sociedade exige apuração, investigação e esclarecimento, e eu acho isso positivo no atual momento da história republicana, porque há alguns anos não se permitiriam investigações dessa natureza. No período da ditadura, por exemplo, cometiam-se todas essas falcatruas, só que elas eram silenciadas. Hoje o Ministério Público funciona, setores importantes do Judiciário agem, o controle sobre a utilização dos recursos públicos é maior por parte da própria sociedade. Por isso, por mais que tenhamos percalços e obstáculos para fazer investigações no âmbito do Congresso, eu acho que nós estamos avançando. Isso ajuda a sociedade a ter mais consciência de seu papel, a pensar que tipo de representante ela deve escolher para ocupar as funções públicas.
Então o senhor acha que o governo Lula avançou no sentido de aumentar a transparência?
Eu acho que a sociedade avançou na sua visão e no seu compromisso para a defesa do interesse público. Hoje nós temos mais instrumentos de fiscalização e de controle social sobre as políticas públicas, as questões de orçamento e a aplicação de recursos. A sociedade também adquiriu maior consciência sobre o acompanhamento do exercício dos mandatos, seja no Executivo, seja no Legislativo. E acho que hoje, por mais que nós tenhamos ainda presentes em vários setores da sociedade brasileira e no governo casos graves de corrupção, de mau uso do dinheiro, de má conduta na gestão da coisa pública, efetivamente nós temos mais instrumentos para controlar e temos a sociedade muito mais alerta para cobrar que o seu recurso, o seu dinheiro e o seu direito sejam minimamente preservados e garantidos.
Então na opinião do senhor essa mudança veio mais da população do que do governo, certo?
Essa mudança devemos às lutas do nosso povo, à maior consciência política que a população vai adquirindo, inclusive como fruto desses próprios escândalos que se sucedem. Isso acaba, de alguma maneira, provocando o debate na sociedade sobre a correta aplicação e o controle social que deve ter sobre as políticas públicas e os recursos públicos. Mas é verdade também que no último período nós tivemos uma fiscalização muito mais efetiva por parte da Polícia Federal, que tem desbaratado quadrilhas e mais quadrilhas que estão no serviço público ou ligadas ao empresariado e aos mais diversos setores da sociedade. E nós temos visto isso acontecer com muito mais freqüência no governo atual do que nos anteriores. Mas é preciso que essas ações tenham mais eficácia do ponto de vista da real punição àqueles que são denunciados para que esses processos cheguem a um final onde os réus sejam julgados de fato, condenados e possam pagar pelos ilícitos conforme mandam as leis brasileiras.
E como o Senado pode contribuir para aumentar essa fiscalização e transparência?
Nós temos que aprovar um conjunto de medidas que criem dificuldades para que o dinheiro público seja desviado. Temos vários mecanismos hoje, mas que estão se mostrando insuficientes. É preciso haver maior controle e transparência e mecanismos mais adequados para a realização das licitações de obras e serviços públicos. É preciso acabar com o foro privilegiado para os representantes membros do Congresso, porque temos que tornar verdadeiro o princípio constitucional de que todos são iguais perante a lei. Com as normas vigentes no Brasil parece que uns são mais iguais do que outros, então é preciso acabar com o foro privilegiado que leva à impunidade. É preciso criar mecanismos mais transparentes que combatam a corrupção. Sou até favorável há uma proposta que já está em discussão no Congresso com a criação de um tribunal especial para os crimes de improbidade administrativa. Então, acho que o Congresso tem que tomar medidas mais severas de controle e que nos ajudem a combater esse câncer que é a corrupção que está aí incrustada na história do aparelho estatal brasileiro e também nos setores privados. Infelizmente a cultura daquele que quer se dar bem está disseminada a tal ponto, que é preciso fazer um grande esforço de estímulo a práticas corretas no uso da coisa pública, e do privado também, para que possamos avançar e construir uma democracia mais saudável, mais justa e correta que garanta melhores condições de vida a todas as pessoas.
Mas essas propostas são antigas. O senhor está percebendo que está havendo avanços para que elas saiam do papel e sejam efetivadas?
Eu creio que sanados alguns elementos da crise que estamos vivenciando, nós deveríamos – e eu acho que isso devia ser um esforço coletivo e não apenas pessoal de um mandato ou de um partido – reunir as lideranças do Congresso para discutir uma agenda mínima de questões ligadas ao papel do Congresso. Para, dessa forma, aprovar aquelas que sejam mais eficazes no sentido de avançar nesse controle sobre a aplicação dos recursos públicos, sobre o fim da impunidade aos entes do aparelho estatal que cometem crimes e que não são punidos, e estabelecer uma espécie de controle social mais efetivo sobre algumas ações governamentais. Sem a participação da sociedade de forma mais direta, qualquer esforço que seja feito no Legislativo, no Congresso ou no governo será inócuo. Então o fundamental é ampliar a capacidade de participação política da sociedade. O conhecimento de como funciona o aparelho estatal no Brasil, de como são divididos os recursos. Esses são elementos fundamentais para avançarmos na construção de uma democracia mais representativa e mais vinculada aos interesses e à defesa do conjunto da população e, especialmente, dos mais excluídos, daqueles que são as vítimas maiores da corrupção, porque aquilo que vai para os bolsos de alguns poucos, poderia muito bem servir aos interesses da grande maioria que precisa de terra, trabalho, casa, salário, dignidade.
Mas o senhor acredita que há esse interesse em aumentar a participação popular?
É claro porque a composição política do Congresso ainda está muito vinculada e tem grande participação de forças conservadoras e que na verdade não querem mudanças efetivas na vida do povo. Mas mesmo as mudanças e reformas que viermos a fazer para alterar minimamente esse quadro que está aí só serão possíveis se a sociedade cobrar mais, participar mais. E eu não tenho dúvidas de que uma mobilização social em torno de questões importantes como essas que falei é que podem alterar minimamente a legislação, as regras e os procedimentos, e influenciar na conduta daqueles que são responsáveis pela gestão pública para mudar efetivamente a sua postura e trabalhar não por si mesmos e pelos seus próprios interesses, mas pelos interesses do povo brasileiro.
Para o senhor a crise do Senado está acabando ou isso é só um início?
Eu acho que a crise do Senado tende, em breve espaço de tempo, pelo menos nesse contexto do que está sendo investigado, denunciado e tratado nesse momento – falando especificamente do fato mais grave que são as investigações que envolvem a quebra de decoro do senador Renan Calheiros – eu creio que o Conselho de Ética irá trabalhar para concluir as investigações, desde que não haja interferência indébita no cronograma de trabalho que foi elaborado pelo conselho. Porque tivemos notícias até que haveria uma tentativa de brecar essa investigação com uma ação no Supremo Tribunal Federal por conta do conselho não ter seguido alguns procedimentos. Alegavam que ao não seguir esses procedimentos, o conselho não tinha seguido o regimento interno em alguns aspectos. Mas eu creio que se deixar o conselho trabalhar, ou pelo menos a comissão de relatores, logo nós concluiremos esses fatos e teremos o resultado do trabalho apreciado pelo Plenário do Senado Federal. Estou notando que há interesse da comissão de relatores em dar concluir as apurações.
Alguns senadores defendem que o Conselho de Ética não deveria abrir investigação contra todos os que recebem denúncias. Na opinião do senhor é papel do Conselho de Ética investigar denúncias referentes a questões anteriores ao mandato?
O Conselho de Ética deve investigar questões graves que sejam apresentadas. Sejam investigações da Polícia Federal, sejam em outros inquéritos patrocinados no Supremo ou sejam a partir de denúncias do jornalismo investigativo. Eu acho que cada situação é uma situação, precisa analisar e verificar se cabe ingressar com representação para averiguação de quebra de decoro. Eu creio que não é toda e qualquer denúncia que serve de elemento para se fazer representação. Até porque se banalizar esse instrumento investigativo para a quebra de decoro também não seria uma coisa boa. Mas, entenda, elementos contundentes suficientes que possam instruir e dar motivo a um processo, eu creio que é tarefa do Senado fazer. Inclusive, não é uma tarefa específica nem minha e nem do Psol. Creio que essa é uma tarefa que pertence aos membros do Congresso Federal.
Deixe um comentário