Edson Sardinha
O presidente do PT em Mato Grosso, deputado Carlos Abicalil (MT), reagiu hoje (18) às declarações da senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), que o acusou de traição, deslealdade e oportunismo ao ficar com a vaga reivindicada por ela na disputa ao Senado. Abicalil rebateu as acusações da senadora, disse que sua candidatura foi definida por vontade da base partidária e classificou as afirmações da colega como produto de “uma mágoa profunda”.
De acordo com o deputado, o partido nunca aderiu à tese de que os senadores em final de mandato são candidatos naturais à reeleição, como reclama a senadora. Segundo ele, esse entendimento é característico da ditadura. Ele afirma, ainda, que foi a própria parlamentar que preferiu ir para as prévias, diante da impossibilidade de um acordo entre os dois.
“Não tenho nenhum ódio ou ressentimento, minha consciência é tranquila com a lealdade ao PT, à trajetória do Partido dos Trabalhadores. Não cassei a oportunidade de ninguém, ninguém que é hoje portador de um mandato é naturalmente portador do próximo mandato. Isso aí é um raciocínio rigorosamente inaceitável na prática democrática. O tempo da dinastia já passou”, disse o deputado.
No dia 18 de abril, Serys perdeu as prévias realizadas pelo partido no estado. Em entrevista exclusiva ao site, a petista chamou Abicalil de algoz e o acusou de ter lhe cassado a chance de tentar um novo mandato. A senadora adiantou que não votará no companheiro de legenda para o Senado por considerá-lo um “traidor”.
Senadora do PT abre fogo contra seu próprio partido
O deputado foi procurado antes da publicação da entrevista pelo Congresso em Foco, mas informou que só se manifestaria após ver a íntegra das declarações de Serys. “Vejo como mostra de ressentimento, de uma mágoa profunda. Não houve traição, houve consulta à base partidária. Não posso entender que a base partidária não tenha suas razões para decidir por um ou outro. Essa classificação é absolutamente despropositada e produto dessa mágoa profunda. Não é racional”, afirmou o deputado. “Repudio veementemente a declaração dela de que eu teria me apoderado do partido”, acrescentou.
Veja a íntegra da entrevista do deputado:
Congresso em Foco – A senadora Serys Slhessarenko chamou o senhor de traidor, oportunista e desleal em entrevista a este site. Como o senhor avalia essas declarações?
Carlos Abicalil – Vejo como mostra de ressentimento, de uma mágoa profunda. Não houve traição, houve consulta à base partidária. Não posso entender que a base partidária não tenha suas razões para decidir por um ou outro. Essa classificação é absolutamente despropositada e produto dessa mágoa profunda. Não é racional.
Mas ela não tem razão quando diz que há uma tendência natural de os partidos darem vaga aos senadores bem avaliados em fim de mandato?
Esse tema foi intensamente debatido em todo o processo anterior à prévia. Ela fez todo tempo a defesa da candidatura nata, um dispositivo inclusive usado pela ditadura militar, mas que no Partido dos Trabalhadores, desde sua fundação, nunca teve vigência. Recentemente, outro colega de Senado dela perdeu a candidatura para a deputada Ângela no estado de Roraima [o senador Augusto Botelho perdeu a vaga para a deputada Ângela Portela]. Foi uma decisão da base partidária, decisão tomada em encontro. Ela preferiu e exigiu uma consulta à base, pela prévia, e não por meio de um encontro de delegados. Estou seguro que cumpri todas as regras partidárias da tradição do PT ao longo destes 30 anos. Estou sereno de que a decisão foi tomada pela base do partido, não foi pela cúpula nem pelo presidente. Repudio veementemente a declaração dela de que eu teria me apoderado do partido. Até porque ela foi presidente regional do partido em 2006 e candidata a governadora naquele ano porque era maioria. Eu era minoria no partido, e não fiz qualquer cavalo de batalha em relação a isso, porque essa maioria foi conquistada com a presença e a participação democrática dos filiados ao PT. Acho uma ofensa à base do partido.
A senadora aponta irregularidades nas prévias e contesta na Justiça a sua vitória. Houve algum problema no processo?
Uma dessas irregularidades que ela aponta foi desmentida no dia seguinte pelo próprio declarante, que foi filmado numa gravação, ao que tudo indica secreta, divulgada no YouTube, jamais recorrida no interior do partido. O próprio declarante assina nota como membro do diretório municipal negando aquilo que eventualmente o conduziram a dizer numa gravação completamente produzida.
A senadora diz que não vota no senhor para senador porque não vota em traidor. Isso não é prejudicial para suas pretensões?
Isso é uma questão de foro íntimo. As pessoas têm o direito de votar secretamente. Se a senadora avalia que – pelo fato de o PT ter decidido que eu sou o candidato, e não ela – não deve votar em mim, ela deve com a sua intimidade refletir sobre os compromissos partidários que ela mesma levanta nos 20 anos de trajetória.
O senhor apóia a candidatura dela como vice do peemedebista Silval Barbosa?
Essa é uma conversação iniciada entre o governador e ela. Ela repudiou de imediato. Diz hoje que está refletindo. E o partido nem eu colocaremos qualquer tipo de objeção. Mas não é um pleito do PT, segundo decisão do encontro.
Por essa decisão, o PT teria somente a vaga ao Senado. É isso?
Essa é a decisão do encontro estadual de que ela participou inclusive.
O senhor acredita que o PT de Mato Grosso corre risco de ficar sem bancada no Congresso, como diz a senadora?
Talvez isso seja mais produto do desejo de revide dela do que um dado de realidade. Estou inteiramente dedicado a fazer com que mantenhamos a bancada federal, que tenhamos ampliação da bancada estadual, numa coligação que é a mais forte que o PT já teve nesse período. E integralmente afinada com a orientação nacional do congresso do PT e de todas as decisões da direção nacional. Eu tenho convicção e me dedicarei muito para que isso seja exitoso. Essa é nossa pauta prioritária.
A senadora diz que o senhor propôs que ela saísse candidata a deputada porque poderia, assim, aumentar a bancada na Câmara, coisa que o senhor não conseguiria. O senhor confirma essa conversa?
Continuo com essa mesma opinião, porque juntos ela e o Ságuas Moraes, que foi secretário de Educação e hoje é deputado estadual, teriam condição de dobrar a votação que o PT teve, em 2006, quando ela foi candidata a governadora, numa aliança muito estreita, que me deu uma possibilidade dificílima de alcançar o coeficiente eleitoral. Quem acompanhou as eleições em Mato Grosso sabe da dificuldade que foi pra nós conseguirmos a recondução do mandato. Essa foi uma trajetória decidida pela maioria do partido, e não teve de mim qualquer tipo de acusação ou descompromisso.
O senhor pretende conversar com a senadora para apaziguar os ânimos dentro do partido?
Tenho feito aquilo que cabe ao presidente, e tenho realizado, com humildade e muita serenidade, as disposições de um diálogo que ela prefere fazer pela imprensa. Sem acusações, sem ressentimento, sem estar me pautando por um debate que acho inapropriado e público, que deve ser resolvido no interior do partido. Da minha parte sigo sereno, sabendo que estou numa tarefa que é difícil. Mas nunca foi diferente em período anterior, com a responsabilidade de dirigir um partido que tem alta responsabilidade tanto estadual quanto nacional.
O senhor reconhece ter cometido algum equívoco na condução de todo esse processo?
Mas qual teria sido o equívoco? Quem optou por prévias foi ela. Foi ela que disse que, se não houvesse prévias, recorreria para o cumprimento do estatuto. Quem optou por essa via foi a senadora, provavelmente ela estava segura de que ganharia. E não ganhou. Quem pediu esse método não fui eu. Aliás, me esforcei para que esse método fosse diferente. Na discussão interna do partido, defendi orientação do diretório nacional para que definíssemos isso em encontro. Ate o dia 30 de março, como foi pactuado na presença do presidente nacional do partido, não fiz campanha, diferente da minha concorrente. E no dia 18 de abril fizemos as prévias.
Ela também critica o papel do diretório nacional na realização das prévias. Como o senhor avalia a participação do diretório nacional nessas discussões?
O diretório nacional julgou aquilo que considerava oportuno julgar. Como não houve entendimento anterior, como a senadora não aceitou outra via, o tempo todo ela dizia “ou sou candidata ao Senado, ou não sou candidata a nada”. Quem acompanhou viu, de janeiro pra cá, que essa afirmação foi constante. Qualquer outra possibilidade só dependia de uma flexão da minha parte.
Esse tipo de disputa interna não é ruim para o PT?
Mas será que é só no Partido dos Trabalhadores que tem esse tipo de situação? Vocês mesmos têm acompanhado disputas em outros partidos. A diferença é que, no PT, boa parte dos seus colegas utiliza a expressão racha ou crise profunda. Quando se trata de outros partidos, os termos são mais amenos. No PSB não tem problemas? No PMDB, no PSDB, no Democratas, não tem problema? Isso é próprio da vida partidária e da democracia.
O senhor teme que essa disputa interna prejudique a candidatura de Dilma Rousseff em Mato Grosso?
Eu farei o possível para que isso não ocorra. E, pelo que li, a senadora também o fará.
Há possibilidade de reconciliação até as eleições?
Da minha parte, estou disposto a qualquer tipo de pactuação interna. Porque, repito, não tenho nenhum ódio ou ressentimento, minha consciência é tranquila com a lealdade ao PT, à trajetória do Partido dos Trabalhadores. Não cassei a oportunidade de ninguém, ninguém que é hoje portador de um mandato é naturalmente portador do próximo mandato. Isso aí é um raciocínio rigorosamente inaceitável na prática democrática. O tempo da dinastia já passou. Acho que a serenidade convém a todos nós. A senadora disse que está refletindo sobre a possibilidade de aceitar ou não participar do processo eleitoral. Desejo que até o dia da convenção, 26, que ela faça essa reflexão com serenidade. Desejo muito. E que, depois da convenção, ela esteja engajada na campanha com o êxito que o PT merece, a sociedade brasileira deseja e ela manifesta ser o dela também.
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