O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu que vai investigar “até as últimas conseqüências” todas as denúncias contra o governo e parlamentares de sua base de sustentação no Congresso. Lula afastou ontem as diretorias do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) e dos Correios, três semanas após a divulgação da existência de um esquema de corrupção nas estatais.
Durante a abertura do IV Fórum Global de Combate à Corrupção, em Brasília, Lula disse que não vai prejulgar ninguém, que tem uma biografia a preservar e que vai agir como guardião das instituições democráticas. Ele também defendeu a realização de uma reforma política.
“Tenho uma biografia a preservar, um patrimônio moral, uma história de décadas em defesa da ética na política. Por isso, não vamos acobertar ninguém, seja quem esteja envolvido. Digo que cortaremos na própria carne, se necessário. Sem prejulgar ninguém e respeitando o direito a se defender, mas não vamos vacilar um segundo na defesa do interesse da coisa pública”, afirmou. “O que está em jogo é a respeitabilidade de nossas instituições, das quais sou o principal guardião”, completou.
O presidente disse que o governo está investigando todas as denúncias e defendeu a apuração do esquema de corrupção nos Correios pelo Congresso. “O governo está investigando e não se opõe, ao contrário, estimulará que o Poder Legislativo desenvolva suas investigações com o equilíbrio que sabemos possuir o Congresso. Este Congresso que não pode estar sujeito à compra. Quero insistir: este Congresso que não pode, de forma nenhuma, estar sujeito à compra”, frisou, ao afirmar que a corrupção é uma “doença crônica”.
“Há muitos discursos e manchetes e o resultado é pouco. No Brasil, fomos mais longe. Este país já fez o impeachment de um presidente da República há pouco tempo, juiz já foi preso, delegado também é preso. E a solução para combater a corrupção significa mais democracia, mais vontade política, mais determinação.”
PT volta atrás e anuncia apoio à CPI dos Correios
Diante da denúncia do presidente do PTB, Roberto Jefferson, de que o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, seria o responsável pelo pagamento de uma mesada a parlamentares do PL e do PP em troca de apoio ao governo, a bancada petista decidiu voltar atrás e manifestar apoio à CPI dos Correios. Os governistas, porém, querem restringir as investigações às denúncias de corrupção na estatal. A oposição discorda e tenta estender a apuração ao suposto esquema do “mensalão”.
Deputados do PFL e do PSDB impediram ontem a votação do parecer do recurso apresentado por líderes governistas contra a criação da CPI dos Correios na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara. O relator, Inaldo Leitão (PL-PB), considerou constitucional o pedido de CPI, mas mudou o texto do requerimento, vetando investigações em outras estatais. Nova reunião da comissão foi marcada para hoje, mas a oposição promete obstruir a análise do relatório.
Segundo o presidente do PT, José Genoino, o apoio à CPI dos Correios faz parte da reação do partido às denúncias de corrupção. “O PT vai para a ofensiva para se defender perante seus filiados, militantes e eleitores. Diante das mentiras, vamos para a ofensiva. Vamos atuar na CPI, se ela for instalada, cumprindo dois objetivos: investigação e disputa política”, afirmou.
Petistas querem estender investigação a governo FHC
Em reunião ontem à noite, a bancada do PT na Câmara decidiu propor a criação de uma CPI para apurar denúncias de compra de voto neste e no governo anterior. A idéia é coletar assinaturas para a instalação de uma comissão parlamentar de inquérito que investigaria, além do “mensalão”, a denúncia de que o governo FHC teria oferecido dinheiro a parlamentares em troca de apoio à emenda da reeleição. A proposta deve ser apresentada hoje aos demais partidos aliados.
Acusado de pagar R$ 30 mil a deputados aliados em troca de apoio ao governo no Congresso, o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, será ouvido hoje pela executiva nacional do partido. Em seguida, Delúbio deve conceder uma entrevista coletiva à imprensa.
Jefferson ameaça fazer revelações em CPI
O presidente do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ), não aceitou o pedido da cúpula partidária para que se afaste do cargo e prometeu ontem fazer revelações que vão comprometer outros deputados e membros do governo. Ao deputado Nilton Capixaba (PTB-RO), Jefferson teria dito que divulgaria uma lista dos parlamentares que teriam recebido dinheiro de forma escusa. O presidente do PTB marcou para os dias 17 e 18 a reunião do diretório nacional que irá discutir a sua permanência no comando do partido.
“Ele falou que tem provas e o que ele tem nas mãos é ainda muito mais do que já falou. E que vai falar tudo na CPI para que a nação tenha oportunidade de saber o que aconteceu”, afirmou Capixaba, após se encontrar com Jefferson.
As bancadas do PTB na Câmara e no Senado decidiram adiar para hoje a divulgação da nota em que os parlamentares irão reiterar o apoio ao governo Lula e informar ao presidente Lula que os cargos ocupados pelos petebistas na administração federal estão à disposição.
Em encontro ocorrido anteontem, a cúpula do PTB decidiu pedir o afastamento de Jefferson, alegando se sentir traída pelo deputado, que não teria consultado nenhum dos membros da Executiva sobre a denúncia de pagamento de mesada a parlamentares.
Ex-ministro nega envolvimento em denúncia
O ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto (PL), atual prefeito de Uberaba (MG), negou ontem ser o integrante do governo que teria participado de uma cena de corrupção relatada pelo presidente do PTB, Roberto Jefferson, ao deputado Miro Teixeira (PT-RJ). O nome de Adauto ganhou força nos corredores do Congresso ontem, em meio aos comentários feitos pelos parlamentares. “Eu nego veementemente esse tipo de informação”, reagiu Adauto.
Segundo Miro, o presidente do PTB teria contado a ele detalhes de uma reunião em “esfera governamental”, em 2003, com “cinco ou seis pessoas”, entre parlamentares e integrantes do governo. O petebista teria testemunhado a ocorrência de cenas corrupção e roubo de dinheiro público. Mas o petista se nega a dizer o nome do ministro supostamente envolvido no esquema.
“Meu segredo só pode favorecer a República. Quem tem que falar sobre esse episódio é o próprio Jefferson. Ou ele omitiu porque é mentira ou a história que ele me contou é verdade e está guardando como trunfo para uma tréplica”, afirmou Miro.
O ex-ministro dos Transportes atribuiu o envolvimento de seu nome ao fato de ter demitido, em junho de 2003, o então diretor financeiro do Departamento de Infra-Estrutura de Transportes (Dnit), Sérgio Pimentel, indicado pelo PTB. O prefeito de Uberaba também negou ter se reunido com líderes partidários para discutir o pagamento de mesada a parlamentares em troca de apoio. “Nunca fiz reunião com chefe de departamento do Dnit ou líderes partidários para tratar de mensalão. Não me lembro de ter recebido Roberto Jefferson no meu gabinete”, afirmou.
“Lula não é Collor”, ressalta Aécio
A oposição voltou a sinalizar ontem que pretende agir com responsabilidade nas denúncias contra o governo Lula. O tom mais moderado do PSDB forçou o PFL a baixar o discurso contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Um dia depois de o prefeito do Rio, César Maia (PFL), sugerir a abertura de um processo de impeachment contra o petista, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), pediu moderação nos ataques a Lula.
Em entrevista à rádio Band News, Aécio foi enfático ao afirmar que Lula não pode ser comparado ao ex-presidente Fernando Collor de Mello. De acordo com o tucano, é preciso respeitar a trajetória de Lula e dar ao presidente a oportunidade de retomar o comando do processo político.
“O presidente Lula não é o presidente Collor. Tem uma história pessoal que merece o nosso respeito. Seu governo é acusado de grandes desvios, mas não vamos transformar isso, desde já, num ambiente eleitoral que contamine a vida do país”, disse.
Segundo ele, não há risco de crise institucional. “O presidente Lula é maior do que este episódio. Quando eu faço esta lembrança é para que tenhamos também respeito à trajetória do presidente e possamos dar a ele a oportunidade de retomar o comando desse processo, garantindo a lisura das investigações e, ao mesmo tempo, trabalhando para que o país continue avançando, votando a reforma tributária, avançando na reforma política, enfim, fazendo o que um governante deve fazer”, ressaltou Aécio.
Na mesma entrevista, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), foi mais agressivo, embora também tenha adotado o discurso da cautela. Alckmin cobrou coragem do governo para enfrentar a crise e classificou como pífias as respostas dadas pelo ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, e o presidente do PT, José Genoino, às denúncias feitas pelo presidente do PTB, Roberto Jefferson. “Não é possível respostas tão pífias e tão pouco esclarecedoras à sociedade como vimos ontem e hoje”, afirmou.
Em Brasília, o líder do PFL no Senado, Agripino Maia (RN), classificou como pirotecnia o anúncio da demissão coletiva das diretorias dos Correios e do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), anunciada ontem pelo presidente Lula. “Essas são atitudes ‘meia sola’ que foram forçadas pela opinião pública. Por que aceitar só agora a demissão das diretorias dos Correios e do IRB? Esses diretores foram jogados no meio da rua por quê? São corruptos?”, indagou o pefelista.
PL quer a cassação de Roberto Jefferson
O PL entrou com uma representação no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara pedindo abertura de processo disciplinar contra o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) por quebra de decoro. O presidente do partido, o deputado Valdemar Costa Neto (SP), reiterou que vai processar judicialmente o petebista.
“O Jefferson é um chantagista, não pode pôr o Congresso sob suspeita. O PL é um partido de homens honrados. Não aceito ameaças. Se Jefferson não trouxer à Câmara fatos concretos, será rito sumário no processo de cassação”, disse Valdemar.
Em entrevista à Folha de S. Paulo, Jefferson disse ter sido pressionado por Valdemar a convencer os deputados do seu partido a receberem uma mesada de R$ 30 mil para votarem com o governo. A prática, segundo o presidente do PTB, beneficiava deputados do PL e do PP.
O corregedor da Câmara, Ciro Nogueira (PP-PI), anunciou que vai abrir sindicância para apurar as denúncias de pagamento de mesadas a cerca de cem deputados da base e a participação de Roberto Jefferson no suposto esquema de fraude nos Correios.
“Pagamos alto preço pelas más companhias”, diz Olívio
Militante histórico do PT, o ministro das Cidades, Olívio Dutra, disse ontem que o governo está pagando o preço pelas “más companhias” que foi obrigado a aceitar em nome da governabilidade e por não ter maioria no Congresso.
“Nós, o governo Lula, o meu partido, o PT, estamos pagando um preço alto pelas companhias que tivemos que ter nesse processo, uma vez que o presidente não foi eleito com maioria no Congresso. Então, por causa dessa relação, que é democrática, temos situações como esta. Nós não podemos nos deixar contaminar por esse tipo de companhia”, disse em alusão ao presidente do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ).
“Há companhias que não nos servem, porque não estão sintonizadas com a nossa conduta com relação à ética, com o respeito à coisa pública e com uma conduta que é de prestar contas permanentes para a sociedade e a cidadania”, afirmou.
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