No último dia 19 de dezembro Anil Jain, 46 anos de idade, veio a falecer. Esse infeliz episódio aconteceu lá na distante Índia. Para ser mais preciso, perto de Raj Ghat. Ao contrário do que se possa supor, dada a repercussão nos jornais locais, Anil era uma pessoa comum, como comum foi sua morte.
Nosso personagem morreu de congestionamento de trânsito. Sim, de engarrafamento. Ele havia sofrido um ataque cardíaco, e estava a bordo de uma ambulância rumo ao hospital no qual seria medicado. Mas no caminho de Anil havia um engarrafamento, que o atrasou 20 minutos – um atraso fatal. Segundo os médicos do hospital de Raj Ghat, se ele tivesse sido socorrido uns dez minutos antes, teria sido salvo.
Anil não morreu sozinho. Poucos meses antes, Aman Khan, uma criança de apenas oito anos de idade, também morrera de engarrafamento – não conseguiu chegar a um hospital a tempo por conta de um deles. E houve também o caso de um outro indiano, este com 32 anos de idade, morto dentro de uma ambulância presa no trânsito de Chandigarh.
Esses três episódios apenas realçariam a importância de uma boa engenharia de trânsito, não fosse por um detalhe: em todos eles as ruas haviam sido fechadas a pedido de algumas autoridades! Parece incrível, mas os responsáveis pelo engarrafamento foram exatamente aqueles agentes públicos encarregados de zelar pela integridade física da população.
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Este é um quadro que nos transporta de volta ao Brasil. Com que facilidade ruas e avenidas são fechadas neste país tão grande! E trata-se de uma facilidade inversamente proporcional à dificuldade em reabri-las. Ora é um espetáculo musical, ora uma inauguração, ora uma obra pessimamente gerenciada, e lá estão, impávidos, os cones e tabuletas bloqueando a passagem dos mortais – que acabam morrendo mesmo, como provaram Anil, Aman e tantos outros.
E os custos materiais? Dia desses li que o tempo perdido pelos paulistanos nos engarrafamentos de trânsito gera um custo de R$ 26,8 bilhões por ano. Chegou-se a este valor computando-se o que 3,7 milhões de pessoas deixaram de produzir por estarem retidas no trânsito. Há também o custo com combustível e desgaste a maior dos carros, que alcançou inacreditáveis R$ 6,5 bilhões por ano. Em resumo: só a cidade de São Paulo perde R$ 33,3 bilhões a cada ano apenas em função dos engarrafamentos. No Rio de Janeiro fizeram o mesmo cálculo. Chegou-se a um prejuízo de R$ 12 bilhões por ano, o equivalente a incríveis 10% do Produto Interno Bruto (PIB) da cidade.
Esses estudos foram feitos sobre as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. E em escala nacional? Neste caso, com base em cálculos realizados no já algo distante ano de 2002, quando os engarrafamentos eram bem menores, a conta chega a chocantes 6% do PIB, um escândalo. Isso dá algo como R$ 97 bilhões a cada ano.
Só para que se tenha uma ideia do que isto significa, jogamos fora em engarrafamentos mais do que o dobro do orçamento do Ministério da Saúde de 2007 (R$ 40,6 bilhões). Se alguém ainda não estiver convencido da gravidade do problema, vamos a outro número: o orçamento para os postos de saúde brasileiros é de R$ 7,8 bilhões – gastamos 12 vezes mais com engarrafamentos.
E lá foi Anil Jain para o cemitério. Sugiro, como epitáfio, uma frase de Bernard Shaw: “O pior pecado contra nosso semelhante não é o de odiá-lo, mas o de desprezá-lo”.
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