Objeto de intensos debates entre os próprios eleitores, a cobertura jornalística da campanha eleitoral de 2006 será lembrada pelo forte desequilíbrio, pela hostilidade ao candidato Lula, pelo descolamento entre a opinião dominante na grande imprensa e a da maioria do eleitorado.
Numa cobertura em que a parcialidade da grande mídia virou notícia, a pluralidade de informações encontrada na internet, aliada ao crescimento da influência de lideranças do movimento social, foi fundamental para a reeleição do presidente Lula e para pôr em xeque a credibilidade dos grandes veículos de comunicação.
Essas são algumas das principais conclusões do livro A mídia nas eleições de 2006, lançado semana passada pela Fundação Perseu Abramo, em Brasília, e coordenado pelo pesquisador Venício A. de Lima, do Núcleo de Estudos e Mídia e Política da Universidade de Brasília (UnB).
Dividido em 11 capítulos, o livro busca responder a três questões básicas: como foi a cobertura jornalística das eleições, qual foi o papel da mídia no processo eleitoral e o que é necessário para aprimorar o funcionamento dela na democracia brasileira.
“Com toda certeza, a gente pode afirmar, pela avaliação desse desequilíbrio da cobertura, que o candidato que ganhou não era o candidato preferido pela grande mídia. Então, nesse sentido, ela foi derrotada, sim”, afirma Venício, nesta entrevista ao Congresso em Foco.
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O desequilíbrio da cobertura em favor do candidato tucano Geraldo Alckmin, diz Venício, é apontado por levantamentos realizados por três instituições independentes de pesquisa: o Observatório Brasileiro de Mídia (OBM/MWG-Brasil), capítulo brasileiro do Media Watch Global; o Doxa, Laboratório de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), e o Centro de Altos Estudos em Publicidade e Marketing (CAEPM), da Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo (ESPM-SP).
“Segundo o relatório do Doxa, nas eleições de 2006 o desequilíbrio foi tão maior que é muito difícil não identificar na cobertura um viés partidário. Você não pode nem dizer que ele foi desequilibrado. O Doxa vai mais longe e diz que foi partidário. Então talvez essa tenha sido uma novidade”, diz Venício.
Novos mediadores
Mas por que, apesar desse cenário negativo, Lula se reelegeu? Na avaliação de Venício, a crescente organização da sociedade civil tem favorecido o surgimento de novos mediadores e diminuído o poder de influência direta da grande mídia numa velocidade muito maior do que a própria imprensa é capaz de identificar.
“Mesmo que a maioria do eleitorado não tenha acesso direto à internet, ela passa a ter um acesso indireto, que é mediado por esses novos formadores de opinião que não são aqueles da mídia tradicional. É gente que tem acesso a uma pluralidade maior de informação que a internet oferece e que a mídia tradicional, por sua vez, não”, observa o pesquisador.
Para Venício, a grande mídia reproduz preconceitos e ainda ignora a capacidade dos brasileiros que não integram a “elite” de fazer “algum julgamento racional inteligente”. “Para essa elite, a mídia impressa continua sendo o que sempre foi. Só que essa mídia impressa, que tem uma circulação reduzida, se afastou muito do conjunto da população”, afirma.
No livro, além das reflexões de Venício, estão reunidos artigos de outros 15 jornalistas e analistas políticos, acadêmicos ou não, como Luís Nassif, Paulo Henrique Amorim, Bernardo Kucinski, Marcos Coimbra, Renato Rovai e Antonio Albino Canelas Rubim, entre outros.
Em que pese a editora ser de uma fundação criada pelo PT, o coordenador do livro descarta qualquer viés partidário no conteúdo da obra. “Eu tive uma preocupação muito grande em tentar fazer um livro sério, que não pudesse ser acusado de ser um livro partidário”, afirma, ressaltando que entre os autores da obra há, inclusive, profissionais que prestam serviços para o PSDB.
Venício A. de Lima é um dos principais estudiosos da relação entre política e mídia no Brasil. Em 2005, levantamento feito pelo pesquisador – e reproduzido por este site – revelou que 51 dos 513 deputados eram diretamente concessionários de rádio e TV, prática proibida pela Constituição. O documento resultou na abertura de um procedimento pela Procuradoria Geral da República (leia mais).
Mestre, doutor e pós-doutor em Comunicações pela Universidade de Illinois (EUA) e pós-doutor pela Universidade de Miami-Ohio, é sociólogo, jornalista e publicitário.
Veja, a seguir, a entrevista dada por ele ao Congresso em Foco.
Congresso em Foco – Como surgiu o livro A mídia nas eleições de 2006? O que o senhor, como organizador, pretendeu com ele?
Venício A. de Lima – O livro foi uma iniciativa da editora (Fundação Perseu Abramo), que me convidou para fazer uma proposta. Eu fiz uma proposta, discuti com a editora, ela aceitou. Então nós partimos para convidar as pessoas que eu achei que poderiam contribuir. A minha proposta foi de um livro que fosse, ao mesmo tempo, uma análise da relação da mídia com as eleições de 2006 e que também fosse um documento sobre as eleições. De tal forma que, se daqui a alguns anos, alguém quiser saber o resultado das eleições e os documentos da relação da mídia com o processo eleitoral, possa recorrer a ele.
A que perguntas o livro tenta responder?
O plano do livro foi responder a três questões básicas: como é que foi a cobertura da imprensa da campanha eleitoral, qual foi o papel da mídia nas eleições e de que forma essa relação entre mídia e eleições pode ser aperfeiçoada na democracia brasileira. E além das respostas a essas três questões, tem um anexo com as três principais reportagens de capa da Carta Capital que saíram imediatamente depois do primeiro turno das eleições e tem a resposta que o diretor-executivo de Jornalismo da Rede Globo deu à primeira dessas matérias. Tem também a carta d
até o congresso em foco foi melhor no passado do que é hoje