Diego Moraes
Depois de terem desafiado a opinião pública e aumentado em 90,7% os próprios salários, os parlamentares têm pela frente mais seis propostas que, se aprovadas, elevam em até R$ 229,20 milhões os gastos públicos anuais com o funcionalismo. Os projetos, que só devem ser analisados no próximo ano, prevêem aumentos para servidores do Judiciário e do Executivo, além da criação de 350 novos cargos de carreira.
Entre eles, está o Projeto de Lei 7297/06, do Supremo Tribunal Federal (STF), que eleva para R$ 25.725 o vencimento dos magistrados das cortes superiores e, por conseqüência, o teto do funcionalismo da União. De acordo com a proposta, o reajuste seria implementado gradualmente ao longo de três anos. A matéria beneficiaria, de início, 5.978 servidores do Judiciário e teria impacto orçamentário estimado em R$ 105,42 milhões anuais.
Na prática, porém, a medida renderia um novo reajuste aos parlamentares. Isso porque, além de aumentar dos atuais R$ 12.847 para R$ 24.600 os vencimentos dos deputados e senadores, o Congresso instituiu ontem um “gatilho” para elevar automaticamente o salário dos parlamentares sempre que houver mudanças no dos ministros do Supremo.
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Segundo o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a mudança pretende evitar discussões sobre aumentos em todo fim de legislatura. “Essa é uma decisão perene e duradoura para que não haja mais esse desgaste”, disse Renan. Hoje uma legislatura só pode definir o valor dos vencimentos da seguinte.
Mais de um R$ 1 bi
A equiparação ao atual teto do funcionalismo público, aprovada ontem, vai provocar um impacto anual de R$ 219,17 milhões só com vencimentos – sem contar as regalias parlamentares e o efeito-cascata nas assembléias legislativas e câmaras municipais. Caso estados e municípios sigam o exemplo do Congresso, o gasto extra anual pode chegar a R$ 1,66 bilhão.
De acordo com a Constituição Federal, o deputado estadual pode receber até 75% do salário do federal. O limite para o salário dos vereadores depende do tamanho do município e varia de 20% do subsídio do deputado estadual até 75% dos salários dos estaduais, conforme o tamanho da população.
Com isso, a presidente do Supremo, Ellen Grace Northfleet, que esteve pessoalmente várias vezes no Congresso para cobrar a aprovação do projeto que beneficia o Judiciário, deve ganhar agora novos aliados em sua cruzada corporativa. Sob o argumento do forte impacto nas contas estaduais e municipais – com o eminente aumento para magistrados de cortes regionais –, os parlamentares haviam decidido deixar o projeto na prateleira por mais tempo.
Tímida e eficiente
A negociação em torno do aumento dos congressistas começou timidamente nos bastidores e aos poucos foi ganhando corpo. Ontem, pouco antes da reunião de líderes em que o aumento ficou acertado, não havia certeza se os parlamentares aprovariam um reajuste de 24%, para compensar a inflação acumulada nos últimos quatro anos, ou se optariam pelos R$ 24.600 – mesmo vencimento dos ministros do STF (leia mais).
O resultado mostrou as reais pretensões dos parlamentares, que, desde 2005, após a eleição de Severino Cavalcanti (PP-PE) à presidência da Câmara, tentavam emplacar um encorpado reajuste. O novo valor é 23 vezes maior que a média salarial dos brasileiros segundo o Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE) e 70 vezes maior que o salário mínimo, hoje em R$ 350. “Temos que ganhar bem sim. Mas esse fosso entre o Parlamento e a sociedade se aprofundou”, disse. Chico Alencar.
Levando-se em conta que os parlamentares recebem 15 salários por mês (além da renda mensal e do 13°, têm direito a uma ajuda de custo no início e no fim do ano), cada um dos 598 vai embolsar, com a mudança, R$ 369 mil por ano. Com exceção do PT e do Psol, os demais líderes partidários votaram pelo aumento, assim como Aldo, Renan e o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), em campanha para a presidência.
Se não bastasse o aumento nos próprios vencimentos, os parlamentares definiram também que não haverá cortes nas verbas auxiliares – cota para gabinete, auxílio moradia, correspondência (leia mais). Segundo os presidentes da Câmara e do Senado, o impacto orçamentário será compensado com a redução nos gastos de papel, água, luz e outras despesas de custeio do Congresso.
Pressão do Judiciário
Além de apresentar ao Congresso a proposta que eleva o teto do funcionalismo público, a ministra Ellen Grace tentou emplacar também o PL 7560/06, que cria remuneração para os integrantes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão instituído para fiscalizar a atuação do Judiciário. O jeton equivaleria a 12% do salário de um ministro do Supremo, ou seja, R$ 2,9 mil.
O impacto orçamentário seria de R$ 8,82 milhões em 2007. A medida beneficiaria diretamente a presidente do STF, que também dirige o CNJ. Com a mudança, ela acumularia os dois vencimentos e passaria a receber quase R$ 30 mil – acima do teto do Judiciário, o que é vedado pela Constituição.
As duas propostas não avançaram na Câmara, mas geraram uma reação entre os magistrados, que passaram a reivindicar salários maiores. No início de dezembro, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aprovou resolução que liberou o pagamento a promotores e procuradores de salário acima de R$ 22,1 mil – limite do funcionalismo nos estados – para que eles recebam o teto salarial do funcionalismo da União, de R$ 24,6 mil.
A idéia era impedir que profissionais com vencimentos acima de R$ 22,1 sofressem cortes. A medida foi contestada pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, que prometeu recorrer ao Supremo para reverter a decisão.
Incremento para a PGR
Entre as propostas de aumento de salário em trâmite hoje no Congresso está também o PL 7298/06, que reajusta o vencimento do procurador-geral da República para R$ 25,7 mil, de forma a acompanhar o reajuste do Judiciário. O incremento, porém, está condicionado à elevação para os magistrados da mais alta corte do país. Cerca de 2.878 funcionários seriam atingidos pelo PL, que tem impacto orçamentário previsto de R$ 50,86 milhões anuais.
Além dessas matérias, aguardam apreciação dos deputados os projetos 7507/06 e 7559/06, que criam cargos na esfera pública. O primeiro institui 185 postos de analista judiciário e 77 de técnico judiciário no STF. A estimativa de gastos com a mudança está em torno de R$ 18,61 milhões. Já o PL 7559/06 cria 56 cargos de analista e 32 de técnico judiciário no CNJ. A proposta custaria R$ 9,43 milhões aos cofres da União.
PEC da alegria
Além da concessão de salários vultosos e o inchaço de cargos na esfera pública, o Congresso promove, volta-e-meia, viagens nos chamados trens-da-alegria, que permitem a incorporação de funcionários em postos dos mais cobiçados sem concurso público. Nos últimos dias, ganhou destaque na Câmara a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 02/03, do deputado Gonzaga Patriota (PSB-PE).
O projeto, mostrado em matéria do Congresso em Foco ainda em junho do ano passado (leia mais), permite que servidores requisitados para trabalhar em outro órgão sejam efetivados como funcionário do quadro desse órgão, sem concurso, após três anos de serviço.
Na prática, é como se funcionários de prefeituras convidados por parlamentares para trabalhar na Câmara ou no Senado e fossem efetivados, com as mesmas regalias e benefícios de um servidor concursado. A proposta beneficiaria mais de 20 mil servidores. A PEC, pronta para ser votada em plenário, já recebeu 141 requerimentos para inclusão na Ordem do Dia.
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