Vanessa Affonso Rocha *
O presente artigo tem a pretensão de fomentar o debate acerca do tema dos cargos em comissão e funções de confiança na administração pública, a partir do exemplo da Advocacia-Geral da União (AGU). Considerando-se a iminência de uma nova gestão no país e, também, na AGU, busca-se trazer informações acerca de um dos desafios que se enfrentarão no comando da AGU: a quantidade e a distribuição dos cargos em comissão e funções de confiança.
De início, vale registrar que a questão relativa aos cargos em comissão na administração pública não se restringe à AGU, mas, ao revés, é pauta já apropriada pelo grande público. Tanto é assim que o ministro extraordinário coordenador da equipe de transição, Onyx Lorenzoni, já declarou mais de uma vez a intenção de promover um corte drástico nos cargos existentes, chegando-se a falar em corte de 20 mil cargos “no primeiro dia”.
Essa declaração do ministro coordenador da transição está em consonância com o plano de governo apresentado pelo presidente eleito, que tem um ponto específico para tratar da “Eficiência do Estado e Controle dos Gastos”. Lá se afirma, textualmente: “Houve uma multiplicação de cargos…, e como resultado vemos um setor público lento, aparelhado, ineficiente e repleto de desperdícios”.
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Diz-se ainda: “Podemos fazer mais com muito menos, partindo de um movimento de gestão pública moderna”.
É precisamente nessa linha que o presente artigo pretende apresentar dados que contribuam para a reflexão acerca da aplicação dessas premissas no âmbito da AGU.
PublicidadeAinda na seara das premissas necessárias à adequada compreensão do tema, é necessária uma explicação acerca da sistemática dos cargos em comissão e funções comissionadas, para que a análise comparativa seja possível e justa. É que os cargos e funções são de vários níveis (1, 2, 3, 4, 5, 6 e NE), de modo que uma comparação meramente numérica pode ensejar relevantes distorções.
Assim, consignamos que os números de cargos indicados neste texto já estarão convertidos para a unidade do cargo em comissão ou função comissionada, nos termos dos valores oficiais de conversão vigentes (disponível aqui). Em palavras mais claras, todos os números aqui indicados dizem respeito a cargos “DAS unitários”, ou seja, do nível 1, o que viabiliza a comparação direta.
Já concretizando a análise na AGU, é impositivo tentar trazer à luz a conformação atual da Instituição, que é algo deveras complexo e de difícil compreensão.
A AGU foi fruto de amplos debates durante os trabalhos da Assembleia Constituinte que resultou na Constituição de 1988, trabalhos esses que concluíram pela necessidade de se retirar do Ministério Público a representação judicial da União. Assim, foi criada a AGU, com o objetivo de representar judicial e extrajudicialmente a União, com todos os poderes ou funções que a integram, bem como de prestar consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo – abrangendo, pois, as funções até então desempenhadas pela chamada Advocacia Consultiva da União, que tinha como órgão máximo a Consultoria-Geral da República.
O caput do art. 131 da Constituição Federal prevê que a AGU é a instituição que, diretamente ou por meio de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre a sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo. O § 2º do mesmo artigo prevê que o ingresso nas classes iniciais das carreiras da AGU se dá por concurso de provas e títulos, e o § 3º prevê a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional como o órgão da AGU responsável pela representação da União na execução da dívida ativa de natureza tributária.
E, por fim, o art. 29 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) prevê que “enquanto não aprovadas as leis complementares relativos ao Ministério Público e à Advocacia-Geral da União, o Ministério Público Federal, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, as Consultorias Jurídicas dos Ministérios, as Procuradorias e Departamentos Jurídicos de autarquias federais com representação própria e os membros das Procuradorias das Universidades fundacionais públicas continuarão a exercer suas atividades na área das respectivas atribuições”. É desse artigo que decorre a formatação atual da AGU, delineada a seguir.
O conjunto de normas constitucionais sobre o tema deixa claro que a AGU deve abarcar a representação judicial e extrajudicial da União, inclusive na execução da dívida ativa de natureza tributária, e de suas entidades autárquicas e fundacionais, cujos quadros anteriores à Constituição foram preservados pelo artigo 29 do ADCT até que sobreviesse a Lei Complementar relativa à AGU. E o mesmo conjunto normativo revela que a Constituição previu a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional como um órgão que necessariamente estaria presente na estrutura da AGU.
Nessa linha, a Lei Complementar n. 73, de 10 de fevereiro de 1993, previu como órgãos da AGU os seguintes:
Art. 2º – A Advocacia-Geral da União compreende:
I – órgãos de direção superior:
- a) o Advogado-Geral da União;
- b) a Procuradoria-Geral da União e a da Fazenda Nacional;
- c) Consultoria-Geral da União;
- d) o Conselho Superior da Advocacia-Geral da União; e
- e) a Corregedoria-Geral da Advocacia da União;
II – órgãos de execução:
- a) as Procuradorias Regionais da União e as da Fazenda Nacional e as Procuradorias da União e as da Fazenda Nacional nos Estados e no Distrito Federal e as Procuradorias Seccionais destas; (Vide Lei nº 9.028, de 1996)
- b) a Consultoria da União, as Consultorias Jurídicas dos Ministérios, da Secretaria-Geral e das demais Secretarias da Presidência da República e do Estado-Maior das Forças Armadas;
III – órgão de assistência direta e imediata ao Advogado-Geral da União: o Gabinete do Advogado-Geral da União;
IV – (VETADO)
- 1º – Subordinam-se diretamente ao Advogado-Geral da União, além do seu gabinete, a Procuradoria-Geral da União, a Consultoria-Geral da União, a Corregedoria-Geral da Advocacia-Geral da União, a Secretaria de Controle Interno e, técnica e juridicamente, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
- 2º – As Procuradorias Seccionais, subordinadas às Procuradorias da União e da Fazenda Nacional nos Estados e no Distrito Federal, serão criadas, no interesse do serviço, por proposta do Advogado-Geral da União.
- 3º – As Procuradorias e Departamentos Jurídicos das autarquias e fundações públicas são órgãos vinculados à Advocacia-Geral da União.
- 4º – O Advogado-Geral da União é auxiliado por dois Secretários-Gerais: o de Contencioso e o de Consultoria.
- 5º – São membros da Advocacia-Geral da União: o Advogado-Geral da União, o Procurador-Geral da União, o Procurador-Geral da Fazenda Nacional, o Consultor-Geral da União, o Corregedor-Geral da Advocacia da União, os Secretários-Gerais de Contencioso e de Consultoria, os Procuradores Regionais, os Consultores da União, os Corregedores-Auxiliares, os Procuradores-Chefes, os Consultores Jurídicos, os Procuradores Seccionais, os Advogados da União, os Procuradores da Fazenda Nacional e os Assistentes Jurídicos.
Veja-se que as consultorias jurídicas que atuam junto a ministérios (Conjur) e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional são órgãos de execução da AGU. E elas têm ainda uma outra peculiaridade, que é a vinculação administrativa aos ministérios em que se localizam. O mesmo ocorre com as procuradorias federais especializadas (PFE) que funcionam junto às autarquias e fundações públicas.
Os artigos 11 e 12 da Lei Complementar 73/93 preveem que as Conjur e a PGFN estarão “administrativamente subordinadas” aos Ministérios respectivos, embora sejam tecnicamente subordinadas ao Advogado-Geral da União, conforme artigo 2º, parágrafo 1º, e 11, III, da mesma Lei Complementar 73. E o artigo 18 da mesma Lei Complementar prevê a aplicação do artigo 11 às PFE.
No entanto, é certo que a Constituição previu como competência da AGU as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo Federal, o que impõe que essa previsão da LC 73 seja feita em consonância com a Constituição, da qual o governo eleito muito acertadamente afirma que será servo fiel. Esse já é um relevante desafio a ser enfrentado pelo futuro advogado-geral da União, mas que não será objeto de análise nesses escritos.
A partir dessa configuração institucional, que se reconhece deveras complexa e desafiadora, tem-se que os membros da AGU estão alocados em três estruturas possíveis: i) nos órgãos da própria AGU, cuja estrutura regimental está regida pelo Decreto n. 7.392, de 2010; ii) nos ministérios e órgãos equivalentes (secretarias da presidência e comandos das Forças Armadas), nas respectivas consultorias jurídicas ou na PGFN, no caso do atual Ministério da Fazenda, devendo-se buscar a estrutura regimental em cada um dos vários decretos que regem cada ministério ou órgão equivalente; e iii) nas autarquias ou fundações autárquicas, nas respectivas procuradorias federais especializadas e na Procuradoria-Geral do Banco Central do Brasil, devendo-se buscar as estruturas regimentais também em cada um dos decretos que regem cada entidade.
Já é possível perceber que a conformação institucional da AGU é por demais complexa e mesmo confusa, e não à toa há propostas e estudos que buscam a reestruturação desse cenário. Para o objeto do presente artigo, já é possível concluir que há três fontes de cargos comissionados e funções de confiança potencialmente ocupáveis por membros da AGU, quais sejam a própria AGU, os ministérios e órgãos equivalentes e as autarquias e fundações autárquicas.
No âmbito da estrutura direta da AGU, o Decreto n. 7.392/2010 prevê centenas de cargos destinados à instituição. Mas o número não é o que mais releva. O que chama a atenção é a (má) distribuição desses postos comissionados, situação que põe diretamente em xeque a integridade institucional da AGU.
O Decreto n. 7.392/2010 prevê seis cargos de natureza especial, os “NE”, no jargão da administração pública. São eles o secretário-geral de Consultoria, o secretário-geral de Contencioso, o procurador-geral da União, o consultor-geral da União, o corregedor-geral da AGU e o procurador-geral federal. Essa é uma situação bastante peculiar da AGU, na medida em que os ministérios têm em regra apenas um cargo NE, para o secretário-executivo, que substitui o ministro. E na estrutura global da AGU há ainda mais um cargo NE, qual seja o de procurador-geral da Fazenda Nacional, que está alocado no Decreto n. 9.003/2018, em razão da vinculação administrativa da PGFN ao Ministério da Fazenda. São, portanto, sete cargos NE na AGU.
Observada a premissa de conversão de todos os cargos em funções na unidade básica de medida, a distribuição contida no Decreto n. 7.392/2010 revela que há 209 cargos DAS unitários destinados à Procuradoria-Geral Federal (PGF/AGU), enquanto há 800 cargos DAS unitários destinados aos demais órgãos regidos pelo Decreto. Desses 800, 99 DAS unitários estão alocados na Secretaria-Geral de Administração e na Escola da AGU, ambas órgãos de apoio e gestão administrativas que não serão objeto deste estudo. Portanto, a conta que interessa ao presente artigo é aquela que destina 209 cargos DAS unitário à PGF/AGU e 700 cargos DAS unitário aos demais órgãos de execução integrados por membros da AGU e regidos pelo Decreto n. 7.392/2010.
A PGF/AGU congrega cerca de 3,9 procuradores federais, o que representa algo próximo da metade do total de membros da AGU. E a PGF tem mais de 60 unidades seccionais espalhadas pelo país, além das cinco unidades regionais e de 22 unidades estaduais.
Os demais órgãos de execução finalística da AGU contemplados no Decreto n. 7.392/2010 são destinados à lotação da carreira de Advogado da União, que conta com pouco menos de dois mil membros e com 30 seccionais, além de cinco regionais, 22 estaduais e 26 unidades consultivas regionais.
Os números indicados já permitem perceber a estranheza causada pela distribuição de cargos atualmente existente. A PGF/AGU, com quase 4 mil membros e quase 90 unidades espalhadas pelo país, funciona com 209 cargos “DAS unitários”, enquanto os demais órgãos de execução contidos no Decreto da AGU, com menos de 2 mil membros e quase 80 unidades de execução, demandam 700 cargos “DAS unitários”. A conta certamente não fecha.
No meio-termo entre esses dois extremos está a PGFN, cujo número de cargos em comissão/funções de confiança, e a respectiva distribuição deles, mostra-se mais equilibrado e de acordo com a dimensão do órgão e suas atribuições. Nos termos do Decreto n. 9.266/2018, a PGFN tem 430 cargos DAS unitário, sabendo-se que são 110 unidades descentralizadas pelo país, onde atuam 2.143 membros e 6.081 colaboradores [1].
Os dados apresentados permitem a visualização facilitada do desequilíbrio que permeia a AGU, que demanda, pois, uma relevante revisão estrutural. Mas esse desequilíbrio fica ainda mais evidente quando se propõem uma comparação exemplificativa, tomando-se por base as três unidades regionais do contencioso da AGU na cidade de São Paulo, a maior do país:
No aproximado de Membros da AGU em atuação**** | No de cargos “DAS unitário” | Nível do Cargo de Procurador Regional | |
PRU3* | 60 | 36,65 | DAS 101.5 |
PRF3** | 190 | 11 | DAS 101.5 |
PRFN3*** | 300 | 35***** | DAS 101.4 |
* Procuradoria Regional da União, que cuida do contencioso da Administração Direta;
** Procuradoria Regional Federal, que cuida do contencioso da Administração Indireta (autarquias);
*** Procuradoria Regional da Fazenda Nacional, que cuida do contencioso fiscal e tributário, inclusive créditos previdenciários e relativos ao FGTS.
**** dados oficiais da AGU, mas que podem contar com alguma defasagem ou aproximação.
***** número aproximado, pois o Decreto n. 9.266 não destina exatamente os cargos.
A análise comparativa direta revela que é de fato flagrante a má-distribuição dos cargos existentes e destinados à AGU. Certamente não é possível compreender uma disparidade tão grande de números entre órgãos de execução que gozam da mesma relevância institucional.
O maior número de membros da AGU em atuação evidencia uma demanda maior sob a gestão daquele órgão de execução. De modo que não se justifica que o órgão com maior demanda, com cinco vezes o número de membros em atuação, tenha o mesmo número de DAS unitário do órgão com menor demanda. E, principalmente, não é possível conceber que um posto de mesmo nível de responsabilidade, o de procurador regional, seja remunerado de modo inferior em um órgão em relação aos demais órgãos. Não é demais registrar que a PRFN-3 reúne elevado percentual dos feitos sob gestão da PGFN no país.
Essa situação não passa, pois, pelo crivo mais abrangente em qualquer análise de eficiência e economicidade. Mas o diagnóstico torna-se mais gravoso quando a conta passa a considerar as estruturas dos órgãos de execução localizados em ministérios e entidades autárquicas.
Em análise comparativa por recorte de amostragem, faz-se oportuno usar o exemplo do futuro Ministério da Economia, que, segundo informações atuais da equipe de transição, englobará os atuais ministérios da Fazenda, do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MPDG) e do Desenvolvimento, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).
Na configuração atual, há três órgãos de execução da AGU que destinam seus serviços de consultoria e assessoramento jurídicos aos temas que serão reunidos no futuro Ministério da Economia. São eles: 1) consultoria jurídica junto ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (Conjur-MPDG); 2) consultoria jurídica junto ao Ministério do Desenvolvimento, Comércio Exterior e Serviços (Conjur-MDIC); e 3) Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, no Ministério da Fazenda. Cada um desses órgãos de execução conta com uma plêiade de coordenações temáticas, conforme delineado a seguir.
A PGFN é, como já se disse mais acima, um órgão de direção superior da AGU, nos termos expressos da Lei Complementar 73, em seu artigo 2º, inciso “b”. E ela é o órgão de execução da AGU responsável pelas atividades de consultoria e assessoramento jurídicos no âmbito do Ministério da Fazenda, conforme o artigo 12 da Lei Complementar 73. Esse artigo vai além do que prevê o artigo 131, parágrafo 3º, da Constituição, de modo que a lei complementar alargou o objeto que a Constituição já reservou ao órgão PGFN, mas é a conformação legal considerada na divisão atual de atribuições.
Atualmente, a PGFN conta com cinco adjuntorias (DAS 101.5) e um Departamento de Gestão Corporativa (DAS 101.5), todos remetendo diretamente ao procurador-geral, que conta ainda com um gabinete direto. Desses órgãos, três adjuntorias exercem atribuições típicas de consultoria e assessoramento jurídico. São elas as Adjuntorias de Consultoria Fiscal, Financeira e Societária, de Consultoria Administrativa e de Consultoria Tributária e Previdenciária, que contam hoje com 83 membros da AGU, da carreira de PFN, em atuação.
Essas três adjuntorias contam com sete coordenações-gerais (DAS 101.4), oito coordenações de área (DAS 101.3), cinco chefias de divisão (FCPE 101.2) e oito chefias de serviço (FCPE 101.1). O total é de 28 cargos em comissão/funções comissionadas destinadas às atividades de consultoria e assessoramento jurídico. Os dados derivam do Decreto n. 9.266, de 15 de janeiro de 2018.
A Conjur-MPDG reúne toda a atividade de consultoria e assessoramento jurídico destinada ao atual Ministério do Planejamento, e para tanto conta com 27 membros da AGU em atuação, havendo advogados da União e procuradores federais. A Conjur-MPDG conta com: A) gabinete: um consultor jurídico (DAS 101.5), dois consultor jurídico adjunto (FCPE 101.4), dois assessores (FCPE 102.4), dois assistentes (DAS 102.2), dois coordenações (DAS 101.3), uma chefia de gabinete (DAS 101.3), três chefes de divisão (DAS 101.2) e cinco assistentes técnicos (DAS 102.1); B) seis coordenações-gerais (FCPE 101.4); C) seis chefias de divisão (FCPE 101.2). O total é de 30 cargos em comissão/funções comissionadas. Os dados derivam do Decreto 9.035, de 20 de abril de 2017.
A Conjur-MDIC reúne toda a atividade de consultoria e assessoramento jurídico destinado ao atual Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio Exterior e Serviços, e para tanto conta com 11 membros da AGU em atuação, havendo advogados da União e procuradores federais. A Conjur-MDIC conta com um consultor jurídico (DAS 101.5), três coordenações-gerais (FCPE 101.4), uma coordenação (FCPE 101.3), três chefias de divisão (FCPE 101.2), um assistente técnico (DAS 102.1), dois chefias de serviço (DAS 101.1) e uma FG-3 (função gratificada). O total é de 11 cargos em comissão/funções comissionadas. Os dados derivam do Decreto 9.260, de 29 de dezembro de 2017. 11,46 6,3 6,5.
Veja-se que é muito elevado o número de cargos em comissão e/ou funções de confiança presentes nos órgãos de execução da AGU, o que é uma realidade que se alastra por toda a esplanada dos ministérios. No caso dos atuais ministérios que serão reunidos no futuro Ministério da Economia, são no total 172 (cento e setenta e dois) DAS unitários, isso em um ambiente onde atuam, no total, 124 membros da AGU.
O quadro delineado é inegavelmente disfuncional, além de colocar em xeque a própria natureza da atividade do advogado público. Nesse tema, faz-se oportuno transcrever as palavras do advogado da União Rommel Macedo em obra lançada pela Ordem dos Advogados do Brasil, in verbis:
“Nesse contexto, é evidente que a organização e o funcionamento da Advocacia-Geral da União (…) não se podem adotar modelos gerenciais calcados numa estrita subordinação, impondo-se uma hierarquia técnica no exercício de suas atribuições.” [2]
É certo que o exercício das atribuições dos advogados públicos membros da AGU deve se dar com estrita observância de diversas balizas de constitucionalidade, legalidade e organicidade, inclusive e especialmente com a observância obrigatória de todos os entendimentos firmados pelos órgãos de direção superior da Instituição. Mas, para tanto e do ponto de vista gerencial, não é necessária uma cadeia hierárquica de vários níveis de cargos comissionados, mas tão somente a efetiva coordenação dos serviços nos órgãos de direção superior, de modo a se manter atualizados e devidamente estruturados e disponibilizados todos os entendimentos a serem obrigatoriamente defendidos por todos os membros da instituição.
O que ocorre hoje é rigorosamente o contrário. Tem-se uma estrutura hierarquizada que configura uma afronta à inafastável condição de advogados dos membros da AGU, e que de nada serve no tocante à garantia de uniformidade na atuação. Ao revés, cada “parcela de poder” representada pelos cargos em comissão acaba por tornar-se um pequeno mundo particular, o que, em vez de garantir a uniformidade de atuação, acaba por afastá-la. Tem-se aqui uma representação exata do que a moderna doutrina administrativista chama de esgotamento da burocracia weberiana, pois “aqueles que têm poder hoje em dia podem fazer menos com ele”. [3]
Vale repisar que os cargos efetivos ocupados pelos membros das quatro carreiras integrantes da AGU já contêm em si todas as atribuições e prerrogativas atinentes à profissão de advogado, que inclui a direção jurídica. Portanto, atividades de coordenação do serviço jurídico não precisam ser destacadas pela ocupação de cargos em comissão, mas tão-somente por estruturação organizacional que distinga funções a serem desempenhadas por cada membro, em caráter temporário e rotativo, respeitando-se a natureza das atribuições do cargo e dando concretude ao princípio republicano também na advocacia pública.
Percebe-se, pois, o quão desafiador é o quadro institucional da AGU. Vale salientar que o cenário atual evidencia que a AGU se utiliza de mais cargos comissionados/funções comissionadas do que Ministério da Justiça + Defensoria Pública Federal + Polícia Federal + Polícia Rodoviária Federal, tudo na forma dos decretos de estrutura regimental vigentes [4]. Lembre-se que a AGU se utiliza de cargos e funções comissionadas não apenas previstos no Decreto n. 7.392, de 2010, mas também daqueles previstos no Ministério da Fazenda, para a PGFN, em todos os demais ministérios, para consultorias jurídicas, e em todas as autarquias e fundações autárquicas, incluídas universidades e agências reguladoras, para as procuradorias federais especializadas. Certamente não será possível justificar essa discrepância, o que reforça a necessidade de correção de rumos nesse tema.
Assim, tendo em conta o discurso reiterado, e louvável, do governo eleito acerca da necessidade de racionalização e modernização do Estado brasileiro, afigura-se inexorável o enxugamento estrutural da instituição Advocacia-Geral da União. Confia-se, pois, que a proposta já existente nesse sentido [5] vá ser devidamente considerada pela nova gestão da AGU que já se avizinha.
[1] Dados disponíveis em http://www.pgfn.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/institucional/pgfn-em-numeros-2014/pgfn_em_numeros_final_2_web.pdf
[2] Advocacia Pública Federal: Afirmação como Função Essencial à Justiça. Organizadores: Aldemário Araújo Castro, Rommel Macedo. Brasília: OAB, Conselho Federal, 2016. P. 343.
[3] NAÍM, Moisés. O Fim do Poder: nas salas da diretoria ou nos campos de batalha, em Igrejas ou Estados, por que estar no poder não é mais o mesmo que costumava ser? São Paulo: Leya, 2013. p. 83.
[4] Vide Decreto n. 9.360, de 2018.
[5] Vide processo administrativo que tramita na AGU sob a NUP 00688.000954/2017-97.
* Advogada da União.
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