Márcia Denser *
Falando da mídia e como mídia, a regra é fazer a crítica. Apontar o que há de positivo constitui exceção. Será que boas novas não dão ibope? Antropologicamente, sabe-se que não. O elemento mau, negativo, cuja expressão extrema é a morte, prevalece em todas as polaridades, quer dizer, o mal vence o bem, Satanás derrota o bom Deus porque, no limite, ambos não passam de representações do imaginário na tragédia da morte que, ao fim e ao cabo, é inevitável.
Foi para vencer a morte que o homem criou a civilização e a cultura, e se te disserem que isso não é verdade é porque estão tentando te vender alguma coisa.
Voltando. A notícia boa é que no Brasil existe a boa mídia jornalística no sentido mais canônico e positivo e platônico da profissão, empenhada na busca do bom, do belo e do verdadeiro. “Romanticamente empenhada”, como cinicamente costuma chamá-la a ala pós-moderna – acrítica, apolítica, a-histórica, anódina e suicidária, fazendo-se virtuosa defensora dos interesses da Tradição, Família e Propriedade (sobretudo do seu patrão) – que constitui o grosso da mídia atualmente. Dois livros recebidos há pouco me fizeram pensar nessa outra mídia.
Um deles é O que esperar do novo Congresso – perfil e agenda da legislatura 2007/2011, organizado pelo editor Sylvio Costa e Antonio Augusto de Queiroz, obra que literalmente examina, inventaria e mapeia o perfil e agenda da legislatura 2007/2011, fornecendo dados objetivos e exaustivos – e por isso, surpreendentes – para que possamos julgar com consistência e segurança (leia mais). É serviço prestado não só ao eleitor/leitor, mas sobretudo aos jornalistas de todo o país, incluindo os estudantes da área. Uma ferramenta segura mediante a qual silenciam, enfiando devidamente a viola no saco, os achismos & impressionismos & informes publicitários travestidos de notícia, envolvendo a política e os políticos do Planalto.
Sua pauta de assuntos é bastante completa, incluindo, entre outros, composição e funcionamento do Congresso Nacional, processo legislativo (como se fazem as leis), um balanço da legislatura 2003/2007, a legislatura 2007/2010 com suas características, desafios, déficits, composição e correlação de forças e, finalmente, um who’s who dos parlamentares, com perfis e ficha técnica de cada um deles. Enfim, aquela baixada de arquivo fundamental para a moçada do ramo.
Historicamente, essa outra mídia (a boa mídia) caracterizou-se no passado pela postura e ação de alguns grupos de autores, com destaque especial para o grupo mineiro entre 1920 e 1960. Quem eram eles? Carlos Drummond de Andrade, Fernando Sabino, Otto Lara Rezende, Murilo Rubião, Paulo Mendes Campos, Autran Dourado, Fernando Gabeira, Affonso Romano de Santana, Ivan Ângelo, Roberto Drummond, Wander Piroli e outros.
PublicidadeÉ o que dá notícia meu bom Humberto Werneck, jornalista e mineiro, no livro O desatino da rapaziada – jornalistas e escritores em Minas Gerais, livro publicado há algum tempo pela Companhia das Letras, resultado de pesquisa do autor.
Um grupo seríssimo esse de Minas, extremamente honesto, se bem que província (ou talvez precisamente por ser província: ali alguns valores se preservaram). Grupo viciado nas letras e no jornalismo, na polêmica e no debate de idéias, talvez compensando a insularidade do território, o emparedamento da alma.
Isso no passado. No presente, a jovem equipe de jornalistas brasilienses deste site, insulada pelo território, logo intensamente focalizada, seriamente empenhada com a informação – e o capitalismo de acesso que o diga o quanto tal mercadoria é cara!
É bem verdade que a moçada aqui, em razão do tema, não tem muito espaço para a poesia, no jogo duro, no mano a mano com o cotidiano da política e dos políticos, mas, afinal, para isso existo eu no pedaço, tentando mixar política, cultura, poesia e humanidade, para finalmente dizer aos rapazes que uma outra mídia é possível. A de vocês.
Na próxima coluna, falo mais do Desatino mineiro, me aguardem.
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