O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quinta-feira (1º/mar) a discussão iniciada ontem e decidiu permitir a pessoas transgênero alterar nome e gênero no registro civil, mesmo sem que tenha havido procedimento cirúrgico para redesignação de sexo. O entendimento decorreu do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 4275, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) com o propósito de que fosse firmada interpretação, nos termos da Constituição Federal, ao artigo 58 da Lei 6.015/1973, que versa sobre registros públicos.
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Em resumo, a PGR queria saber se pessoas transgêneros poderiam prescindir da chamada “cirurgia de transgenitalização” caso decidissem mudar de nome. Por unanimidade, os ministros do Supremo reconheceram o direito. Além disso, a maioria votou pela não obrigação de autorização judicial para a mudança de nome sem intervenção cirúrgica.
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Os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Celso de Mello e a presidente da Corte, Cármen Lúcia, votaram pela alteração de nome sem restrições ou necessidade de autorização da Justiça. Os votos vencidos em relação a essa questão foram Marco Aurélio Mello (relator da Adin), que defendeu procedimento de jurisdição voluntária (sem litigio), Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que queriam a imposição de autorização judicial.
O ministro Dias Toffoli se declarou impedido para julgar o caso. Ele alegou que, quando advogado, atuou na defesa de uma das partes interessadas no assunto.
Identidade
Segundo Ricardo Lewandowski, a manifestação da Justiça se faz necessário para efeitos de registro cartorial. Para o ministro, é papel do magistrado, “à luz do caso concreto e vedada qualquer forma de abordagem patologizante da questão”, atestar a observância dos requisitos da mudança de identidade, por meio de depoimentos de testemunhas que conheçam o transgênero em questão, por exemplo, e estejam aptos a falar sobre autoidentificação. Declarações de psicólogos e médicos também seriam necessárias, anotou o ministro, para nortear decisões judiciais.
“A pessoa poderá se dirigir ao juízo e, mediante qualquer meio de prova, pleitear a alteração do seu registro”, alegou Lewandowski, afastando qualquer tipo de interferência temporal, como a realização de perícias.
Já o ministro Celso de Mello observou que o julgamento reforça a luta contra a discriminação e a intolerância contra grupos como os transgêneros. Decano do STF, Celso argumentou que a questão da autorização judicial é resolvida pela própria lei dos registros públicos, cabendo ao oficial de registro civil instaurar processo administrativo quando houver indícios de prática fraudulenta e abusiva em situações objetivas.
“É imperioso acolher novos valores e consagrar uma nova concepção de direito fundada em uma nova visão de mundo, superando os desafios impostos pela necessidade de mudança de paradigmas em ordem a viabilizar, até mesmo como política de Estado, a instauração e a consolidação de uma ordem jurídica genuinamente inclusiva”, declarou o magistrado, para quem a democracia não admite opressão de minorias pelas maiorias.
Direito de ser diferente
“Cada ser humano é único, mas os padrões se impõem. […] O Estado há que registrar o que a pessoa é, e não o que acha que cada um de nós deveria ser, segundo a sua conveniência”, ponderou a ministra Cármen Lúcia, que fundamentou seu voto, entre outras questões, no direito à honra, à privacidade, à dignidade, nos preceitos constitucionais da igualdade material e no direito de ser diferente.
* Com informações da assessoria de comunicação do STF.
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