Senadores aprovaram em plenário, por unanimidade (75 votos), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2013, que praticamente extingue o chamado foro privilegiado para autoridades. De autoria do senador Alvaro Dias (PV-PR), a matéria foi aprovada em primeiro turno e ainda necessita passar por três sessões de discussão antes de ser votada em segundo turno.
Veja o relatório da proposta que acaba com o foro privilegiado
Embora coloque fim à prerrogativa de foro para as dezenas de milhares de ocupantes de cargos públicos em todo o país (veja abaixo quem tem direito a foro), eletivos ou não, a PEC mantém para os chefes de Poderes da República o direito a julgamento em foro especial, restrito a cortes como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Assim, continuam com direito a se defender em eventuais processos motivados por crime comum os presidentes da República, Michel Temer (Executivo); da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), chefes do Executivo; e do próprio Supremo, Cármen Lúcia (Judiciário).
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A matéria foi aprovada mais cedo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), depois de acordo fechado na esteira da aprovação de outra matéria polêmica, a que endurece a legislação sobre abuso de autoridade. A pressa foi sintetizada em uma frase do líder do DEM no Senado,
“Vamos votar, senão o Supremo vota antes da gente”, alertou o senador, queixando-se do avanço da corte, segundo ele, sobre prerrogativas que são do Congresso, que é a de legislar.
A sugestão do avanço na pauta foi feita pelo líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), um dos principais investigados na Operação Lava Jato. Relator da proposta, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) aceitou manter o foro privilegiado apenas para os chefes dos poderes, os chefes de Poder da União.
O amplo acordo permitiu que a PEC fosse votada em plenário, por meio de um calendário especial, já que não há o expediente do regime de urgência para propostas de emenda à Constituição. A maioria dos senadores da CCJ, entusiasmados com a aprovação da matéria sobre abuso de autoridade, defenderam a rápida votação em plenário.
“Seria um dia histórico para o Senado”, declarou Renan.
Paternidade
A preocupação dos senadores em se antecipar ao Supremo se deve ao fato de que a corte deve julgar no começo de maio uma ação que pode resultar no fim do foro privilegiado. Senadores da base aliada e da oposição deixaram de lado as divergências políticas e ideológicas e aprovaram o texto, em votação simbólica – aquela em que os parlamentares permanecem como se encontram para manifestar voto favorável – sem qualquer registro de divergência. Roberto Rocha (PSB-MA) pediu que a comissão analisasse seu relatório, que previa a criação de varas especializadas para julgar ações contra determinadas autoridades. Mas o pedido dele foi rejeitado.
O relator estima em 38 mil o número de autoridades que possuem algum privilégio de foro por conta do cargo que ocupam, como governadores, prefeitos, conselheiros de tribunais de contas e integrantes do Ministério Público ou do Judiciário. Nesses casos, o foro vai do Tribunal de Justiça ao STJ e ao próprio Supremo.
Impunidade
Para Randolfe Rodrigues, a prerrogativa de foro virou abrigo para autoridades que tentam fugir da Justiça. “É notório que restou ultrapassada a ideia de que o foro por prerrogativa de função serviria para proteger o cargo, não o seu ocupante. O que se observa, ao contrário, é que muitas pessoas buscam o mandato eletivo justamente para fugir das instâncias ordinárias da Justiça, conduta francamente reprovável”, criticou em seu parecer.
Na avaliação dele, o fim do foro virou sinônimo de impunidade. “Hoje o foro especial é visto pela população como verdadeiro privilégio odioso, utilizado apenas para proteção da classe política – que já não goza de boa reputação -, devido aos sucessivos escândalos de corrupção. Oportuno e conveniente, portanto, modificar as regras vigentes, no que tange ao foro privilegiado”, acrescentou.
Em seu relatório, Randolfe destaca levantamento da Revista Congresso em Foco que mostrou que mais de 500 parlamentares haviam sido acusados de crimes no Supremo até 2014. Conforme mostrou este site, antes mesmo da divulgação da lista dos novos investigados na Lava Jato, um em cada três congressistas estava respondia a acusações criminais no STF.
Morosidade
A morosidade é o principal argumento utilizado pelos defensores do fim do foro privilegiado. Randolfe argumenta que os processos – hoje restritos a um número restrito de ministros dos tribunais superiores e desembargadores – poderão ser julgados por mais de 16 mil juízes. Segundo ele, o atual modelo favorece a prescrição de crimes e a impunidade. “É notório que restou ultrapassada a ideia de que o foro por prerrogativa de função serviria para proteger o cargo, não o seu ocupante. Muitas pessoas buscam o mandato eletivo justamente para fugir das instâncias ordinárias da Justiça, conduta francamente reprovável”, observa. De acordo com o relator, o foro especial é visto pela população como “verdadeiro privilégio odioso”, utilizado apenas para a proteção da classe política.
Pela proposta, as autoridades manterão o foro por prerrogativa de função nos crimes de responsabilidade, aqueles cometidos em decorrência do desempenho do cargo público, como os cometidos contra o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais, a segurança interna do país, a probidade na administração; a lei orçamentária, o cumprimento das leis e das decisões judiciais, entre outros.
Veja o foro das autoridades no Brasil:
– Presidente da República, ministros de Estado e dos tribunais superiores, do Tribunal de Contas da União (TCU), o procurador-geral da República e embaixadores são julgados pelo STF;
– Governadores são julgados, em crimes comuns, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), assim como desembargadores dos tribunais de Justiça, membros de tribunais de contas estaduais e municipais, além de integrantes de tribunais regionais (TRF, TRT, TRE, etc);
– Juízes militares, federais, do Trabalho e procuradores da República são julgados pelos tribunais regionais federais (TRF);
– Prefeitos e integrantes do Ministério Público também possuem foro privilegiado.