A iminência de votação do Projeto de Resolução 72/2010, matéria cuja aprovação é dada como certa no Senado, tem tirado o sono de governadores e parlamentares de estados afetados por seu conteúdo. Com inclusão em pauta orientada pelo Planalto, em 2010, ao então líder do governo na Casa, Romero Jucá (PMDB-RR), o projeto unifica a cobrança do ICMS sobre importados e, a partir de resolução do Ministério da Fazenda, fixa em 4% a alíquota desse imposto. Estados como Espírito Santo, Santa Catarina, Ceará, Pará e Goiás estimam perdas bilionárias, e já começam a cobrar do governo medidas compensatórias que não levem ao colapso as contas estaduais.
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Para além do teor da proposição, sua própria tramitação já é motivo de controvérsia. O caso pode parar no STF, como destacou ao Congresso em Foco o líder do DEM no Senado, Demóstenes Torres (GO), para quem a matéria atualmente em vigência remete à ditadura militar. E que está em análise na Casa, emenda o senador, é inconstitucional.
“[A unificação do ICMS] não pode ser por resolução, e sim por lei complementar, porque derruba os incentivos. Se o governo insistir em aprovar a matéria dessa forma, vai acabar dando um trato diferenciado a essa situação. E vamos ao Supremo Tribunal Federal”, adverte o senador goiano, para quem a legislação vigente é antiquada. “Em relação ao mérito, evidentemente deveria ser estabelecida uma política diferenciada, tinha que ser mudada a Lei Complementar 2475 – que é uma lei da época do regime autoritário, em que os secretários da Fazenda decidiam, por unanimidade. Não existe uma opinião unânime [na atual discussão].”
Autor do requerimento de instalação da “comissão de notáveis” que auxiliará o Senado quanto à reformulação do pacto federativo, o senador Pedro Taques (PDT-MT) também mencionou a eventual inconstitucionalidade da matéria. “A Constituição diz, no artigo 155, que isso não pode ser projeto de resolução. Por isso, nós estamos consultando juristas, porque existem posições contrárias que dizem que pode”, disse Taques.
Taques disse ainda que os repasses federais para estados e municípios, com concentração excessiva das receitas para a União, são o núcleo da discussão – até porque, a depender do trânsito orçamentário no Parlamento, diz o senador, os propósitos da aplicação desses recursos podem ser desvirtuados. “Isso repercute nas chamadas emendas parlamentares individuais, que são a causa da corrupção no Brasil. Repercute na segurança pública, na saúde. A questão não é só o federalismo fiscal, mas diversos outros temas”, destacou Taques, mencionando o artigo 3º da Constituição para lembrar que a discussão do pacto no Senado, “onde cada estado tem o seu representante”, deve focalizar a superação das desigualdades regionais.
Rodada de negociações
Esta semana teve início com a ida dos governadores Renato Casagrande (Espírito Santo) e Raimundo Colombo (Santa Catarina) ao Ministério da Fazenda, em Brasília, em busca de compensações para a perda que a unificação do ICMS para importados implicará para seus estados. A audiência com o ministro Guido Mantega, articulada com a ajuda do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e realizada na segunda-feira (19), foi o primeiro passo de uma rodada de negociações dos gestores junto à equipe econômica e ao Parlamento.
“O ministro colocou algumas propostas de compensação, como crédito inicial de R$ 3 bilhões ao estado e aos municípios, e possibilidade de maior aquisição de royalties”, disse o secretário da Fazenda do Espírito Santo, Maurício Duque, em entrevista ao Congresso em Foco, logo após a audiência com Mantega (confira).
Como resposta, esta semana técnicos do Ministério da Fazenda e do governo do Espírito Santo começarão a negociar formas de diminuir o impacto negativo da unificação do ICMS. “Não é possível uma decisão que leve a uma mudança rápida. É um apelo que a gente faz ao Senado, que observem o equilíbrio federativo. É importantíssimo pensarmos em uma transição temporal”, defendeu Casagrande, referindo-se ao “prazo de transição” necessário para que estados prejudicados pela unificação de ICMS possam se adequar às quedas de receita.
Segundo os defensores da unificação do ICMS, produtos importados chegam ao consumidor com carga tributária muito menor que a dos concorrentes nacionais. A concorrência “predatória” de mercadorias estrangeiras – que, ao receber incentivos em seus países, duplicam seu potencial de mercado com os benefícios da legislação brasileira –, dizem, ameaça o potencial da indústria nacional, uma vez que toda a cadeia produtiva de seu parque industrial é oferecida com menor poder de concorrência.