“Por onde quer que analisemos o crime de estupro, e a sua denúncia e punição, encontramo-nos sempre às voltas com a questão do lapso de tempo. Porque é esse lapso de tempo que fertiliza a impunidade, e é essa impunidade que se pretende combater, ao tornar o estupro, como o racismo, um crime imprescritível”, disse a relatora, Simone Tebet (PMDB-MS), ao ler seu parecer favorável à proposta do senador Jorge Viana (PT-AC).
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Na justificativa da PEC, Viana ressalta que a grande maioria dos casos de estupro não é notificada. “Estudo do Ipea calcula que o número de estupros por ano no Brasil seja em torno de 527 mil tentativas ou casos de estupros consumados no país, dos quais apenas 10% seriam reportados à polícia. A subnotificação dos crimes de estupro ocorre devido ao receio que as vítimas têm de sofrer preconceito, superexposição ou serem revitimizadas”, declarou.
O petista destaca a cultura machista de se responsabilizar a própria vítima por esse tipo de crime. “Isso porque é comum que a vítima seja covardemente responsabilizada pelo estupro sofrido, seja pelo fato de ter bebido, pelo horário em que estava na rua, pela roupa que vestia ou pela maneira como dançava”, afirma o petista.
Segundo ele, acabar com a prescrição é necessário para que garanta à vítima tempo para refletir sobre a violência sofrida. “Essa medida, por um lado, permitirá que a vítima reflita, se fortaleça e denuncie, por outro lado, contribuirá para que o estuprador não fique impune.”
A prática do estupro e do estupro de vulnerável está previsto no Código Penal como crime hediondo. Para a relatora, justifica-se a inclusão do crime na Constituição, a exemplo do racismo, por uma questão histórica. “O racismo e o machismo, no Brasil, andam de mãos dadas, e contribuem com igual relevância para os aspectos mais negativos da nossa sociedade, mesmo em pleno século 21”, alegou. “Ambos são crimes que ao serem expostos revitimizam, leva tempo para a pessoa criar coragem para denunciar”, acrescentou.
PublicidadeA senadora lembrou que muitas vezes a violência sexual é praticada dentro do próprio ambiente familiar. “Quanto tempo leva para se recuperar, no íntimo da alma, uma infância perdida, uma adolescência violada? Nesse particular, há um agravante muito específico no que diz respeito à violência sexual: é que, como é sabido, grande parte dos casos ocorre no ambiente familiar da vítima. É sempre difícil dizê-lo, mas é preciso: os agressores são, muitas vezes, pais, tios, irmãos, companheiros”, ressaltou.
“Portanto, ao trazer a público a sua dor, o seu trauma, a vítima estará, ao mesmo tempo, expondo todo o seu núcleo familiar, e expondo-se, dessa forma, à incompreensão não apenas da sociedade ‘exterior’, digamos assim, mas também daquelas pessoas que, em toda a vida, lhe são mais próximas”, observou.
Único voto contrário à proposta, o senador Roberto Requião disse que o atual período de 20 anos de prescrição para o estupro é “consistente”. “Essa imprescritibilidade me assusta um pouco. Do ponto de vista teológico não haveria mais conversão do fiel em hipótese alguma. Lembro que a Igreja Católica vive do instituto do perdão. Uma imprescritibilidade de 20 anos me parece consistente, principalmente porque uma parte desse absurdo ocorre no ambiente familiar. Os 20 anos resolvem esse problema. A imprescritibilidade me parece uma redução ao absurdo do próprio sistema judiciário. Insistindo que o crime é absurdo, deve ter punição dura. Mas não posso como advogado votar a favor da imprescritibilidade do tipo”, declarou.
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