Câmara e Senado se preparam para avançar na pauta legislativa em uma semana ainda sob o calor da “tempestade perfeita” que acomete o PSDB, com denúncias que se avolumam contra o senador Aécio Neves (MG), agora réu, e possibilidade de prisão do ex-governador mineiro Eduardo Azeredo. A temperatura deve se manter alta em ambos os plenários, onde a prisão do ex-presidente Lula ainda reverbera e gera protestos de petistas e membros de partidos que o apoiam, como PCdoB e Psol.
E é assim, em regime de “obstrução política” contra a prisão de Lula, que deputados do campo da esquerda prometem barrar todo e qualquer esforço que colegas governistas venham a fazer para votar projetos. A estratégia até agora se mostrou bem sucedida e já barrou por suas sessões a votação do projeto de lei que torna obrigatória a inclusão de todos os consumidores brasileiros no chamado cadastro positivo.
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De interesse do governo, pois embute medida auxiliar na política de juros do Banco Central, a sugestão de lei consta do Projeto de Lei Complementar (PLP) 441/2017, de autoria do Senado. A Lei 12.414/2011 já havia criado o cadastro, mas como mecanismo de natureza opcional. Caso a nova legislação seja aprovada, gestores de bancos de dados em todo o país terão acesso irrestrito a informações sobre empréstimos quitados e compromissos de pagamento em dia.
Relator da matéria, o deputado Walter Ihoshi (PSD-SP) preparou substitutivo com o objetivo de que os dados pessoais sejam utilizados de maneira que uma nota de crédito do consumidor seja obtida. Assim, segundo as pretensões do governo, interessados nas informações poderão consultá-las livre e universalmente, sem restrições legais.
Sigilo x juros baixos
Do lado do governo, defensores da inclusão obrigatória no cadastro alegam que a providência auxiliará na redução dos juros finais ao consumidor. Por outro lado, deputados contra o projeto alegam que o livre acesso às informações se volta para os interesses do mercado e ampliará o risco de vazamento de informações, configurando-se violação de sigilo.
No meio do tiroteio de posicionamentos, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), chegou a articular com o presidente Michel Temer (MDB) um compromisso de veto caso senadores alterem o texto dos deputados quando a proposição mudar de Casa. Mesmo assim não houve acordo, num cenário em que deputados da oposição apontaram a quebra recorrente de acordos, por parte do governo, até acerca de decisões importantes – caso da medida provisória que alteraria, depois de promessas do Planalto, regras na legislação trabalhista. Como este site vem mostrando há meses, a tese de boicote do governo à matéria parece ter se confirmado, uma vez que a MP perderá validade na próxima terça-feira (24) sem que a base tenha se mobilizado para aprová-la.
Diante da ameaça de derrota, a base aliada teve que recuar e adiou a votação do cadastro positivo na última quarta-feira (18). Por se tratar de PLP, a matéria precisa do voto de ao menos 257 deputados (maioria absoluta), o que torna arriscada a aposta governista diante da obstrução, instrumento oposicionista que implica a não contabilidade dos votos para efeito de alcançar quórum mínimo de votação.
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Tranca regimental
Não bastasse a disposição de confronto da oposição, a pauta da Casa está abarrotada por medidas provisórias, que têm preferência regimental e, nessa condição, impedem que outras proposições sejam votadas em determinadas sessões de plenário. Como lembra a Agência Câmara, as sessões ordinárias estão trancadas por oito MPs.
Pautada para discussão e votação na terça-feira (24), a primeira delas é a Medida Provisória 809/17, que autoriza o Instituto Chico Mendes (ICMbio) a selecionar, sem licitação, um banco público para conceber e gerir um fundo que virá a ser alimentado por recursos arrecadados com ações de compensação ambiental. O ICMBio é um órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e, em conjunto com a pasta e a instituição financeira que vier a ser selecionada, cuidará para que o fundo financie unidades federais de conservação (parques nacionais, áreas de proteção etc). A fonte de custeio serão empresas com empreendimentos de grande impacto no meio ambiente.
Segurança
Na outra Casa legislativa a ordem é dar consecução à pauta da segurança pública, na esteira da intervenção federal no setor decretada por Temer, em meados de fevereiro, em terras fluminenses. Em ano eleitoral, como têm mostrado sucessivas pesquisas de opinião, a pauta do combate ao crime logo se transformou em demanda social prioritária e, nesse sentido, palavra de ordem do presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE). Eunício tem pautado para plenário proposições diversas relativas ao tema e, agora, quer ver aprovado o projeto que cria o Sistema Único de Segurança Pública (Susp).
Mas o ritmo de votações da Câmara, normalmente mais acelerado do que o do Senado, frustrou Eunício em relação ao Susp. O emedebista já havia declarado, em 27 de fevereiro, que queria ver a matéria aprovada em março. O calendário já marca a última semana de abril e os deputados só concluíram a aprovação do Projeto de Lei 3734/2012 no último dia 11. Há 11 dias à espera de votação dos senadores, o PL poderia ter sido votado na última semana, por exemplo, mas uma série de fatores impediu a deliberação.
“Votaremos isso ainda no mês de março. Combinei com o Rodrigo Maia. Votamos na Câmara e, na sequência, no Senado. Estamos enxugando o texto e conversando com várias pessoas para termos um debate amplo para que a gente unifique o pensamento e aprove isso o mais rápido possível. O Brasil não aguenta mais”, iludiu-se Eunício, referindo-se à sina da população com a violência crescente até no meio rural. A intervenção no Rio de Janeiro estava em vigência há 11 dias quando o senador fez o prognóstico otimista.
Eunício voltou a manifestar otimismo na semana passada e declarou ao site Poder360 que quer votar o projeto do Susp até quinta-feira (26). Primeiro, ele sabe, a matéria tem que ser discutida e votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que costuma se reunir às quartas-feiras. O senador disse que o texto receberá urgência regimental para o plenário, o que prioriza e acelera sua votação, e voltou a mencionar acordo com Rodrigo Maia, que também está de olho na pauta da segurança pública em tempos de eleição.
“Essa matéria foi fruto de entendimentos entre Rodrigo e eu. Tenho interesse na pressa e na aprovação”, declarou.
Integração
Em linhas gerais, o projeto unifica os sistemas de segurança da União, dos estados e dos municípios para organizar forças policiais e órgãos de segurança pública, por meio de um sistema integrado de compartilhamento de dados chamado Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp). Material genético, informações sobre o sistema prisional, impressões digitais e outros elementos ficarão armazenados em um banco de dados à disposição das autoridades de todo o Brasil, de maneira integrada.
O projeto prevê ainda bloqueio do repasse de recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) para os entes da Federação que não mantiverem atualizado seu conjunto de informações junto a Sinesp.
Na votação da Câmara, o único destaque aprovado obrigava o profissional de segurança pública a preservar o local do crime. Por outro lado, foi excluído do texto o parágrafo que determinava aos agentes do Susp, em caso de ausência de órgão com atribuição legal, a obrigação de preservar a área do crime “para posterior prosseguimento dos atos procedimentais cabíveis”. Por se tratar de projeto de lei, a matéria só precisa de maioria simples (metade dos votos mais um dos presentes à sessão), tanto na Câmara quanto no Senado, para ser aprovada em plenário.
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