Mário Coelho
Após quase sete horas de sessão, o Supremo Tribunal Federal (STF) negou o recurso extraordinário apresentado por Jader Barbalho (PMDB-PA) contestando decisão que barrou seu registro de candidatura com base na Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/10). Dessa maneira, a corte decidiu que as novas regras de inelegibilidade valem para as eleições de 2010. Assim, Jader perdeu definitivamente a chance de assumir o mandato de senador. Além disso, por ter sido considerado um processo de repercussão geral, todos os casos similares – ou seja, de candidato que renunciou a cargo eletivo para escapar de processo disciplinar – devem ser julgados da mesma maneira.
Para chegar ao resultado, os ministros tiveram que debater sobre uma forma de desempate, já que no mérito o julgamento terminou cinco a cinco. As sugestões foram dadas pelo decano da corte, o ministro Celso de Mello. Ele listou como alternativas a espera pelo preenchimento da última vaga do Supremo (que permanece com dez ministros, um a menos que a sua composição integral), o voto de qualidade do presidente (que poderia desempatar a questão, até mesmo reiterando a sua posição contrária à aplicação imediata da lei) e a adoção por analogia do artigo 205 do regimento interno da corte. Ele prevê que “havendo votado todos os ministros, salvo os impedidos ou licenciados por período remanescente superior a três meses, prevalecerá o ato impugnado” – no caso, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pelo indeferimento da candidatura de Jader.
Supremo começa julgamento de Jader Barbalho
STF retoma hoje julgamento sobre Ficha Limpa
Para resolver o impasse, o presidente do STF, Cezar Peluso, colocou as propostas em votação. Antes, ele questionou os colegas de corte para saber se eles deveriam continuar o julgamento ou adiá-lo. A proposta de interromper a sessão e esperar a análise do recurso extraordinário apresentado pelo também candidato ao Senado pelo Pará Paulo Rocha (PT) – outro que renunciou para afastar o risco de cassação do mandato parlamentar – veio da defesa de Jader. Por sete votos a três, os ministros decidiram continuar com o julgamento. Votaram dessa forma Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto, Ellen Gracie, Celso de Mello e Peluso. José Dias Toffoli, Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes foram votos vencidos.
Em seguida, eles começaram a analisar as sugestões de Celso de Mello. Para ele, a hipótese mais interessante a ser aplicada seria a do artigo 205 do regimento interno. O placar acabou o mesmo (sete a três), com os ministros acompanhando essa posição. Assim, por analogia, prevalece a decisão contestada. Ou seja, Jader continua barrado e a Lei da Ficha Limpa vale para as eleições de 2010. O peemedebista foi o segundo candidato mais votado ao Senado no Pará, recebendo 1.799.762 votos.
“Qualquer alternativa é sempre uma solução ficta. É uma decisão artificial”, disparou Peluso ao dar seu voto. Para ele, por não haver quorum completo, qualquer das alternativas escolhidas não teria base real. Porém, como a maioria dos ministros entendeu que era necessário aplicar um critério, ele acabou escolhendo seguir com a sugestão de Celso de Mello. “Não tenho vocação para déspota. Como poderia invocar uma prerrogativa se a maioria não quer?”, questionou.
Contrário à aplicação da Lei da Ficha Limpa às eleições deste ano, ele era a princípio favorável à definição da questão após a nomeação e posse do décimo primeiro ministro do STF. Revelou, no entanto, que o seu interesse maior era encerrar o impasse. “A história nos julgará, se acertamos ou não”, observou.
Apesar da decisão tomada hoje, a nomeação do último ministro da corte pode modificar a decisão do STF. Isso porque, no recurso apresentado pelo peemedebista, não é questionada a constitucionalidade da lei. Jader argumenta que a ficha limpa deve ser aplicada em 2012 e que não poderia retroagir para atingir fatos ocorridos há nove anos. Se o novo integrante da corte, na análise de um novo caso, entender que o artigo 16 da Constituição (que exige a antecedência de um ano para uma nova regra eleitoral ter efeitos legais) deva ser aplicado, a decisão pode mudar.
Repercussão geral
Assim como o recurso do ex-candidato ao governo do Distrito Federal Joaquim Roriz, o caso de Jader Barbalho também foi considerado de repercussão geral. Dessa maneira, a decisão tomada hoje pelos ministros do Supremo deve ser aplicada em todos os casos similares. “Todos os casos com características semelhantes devem ser julgados, em tese, da mesma forma”, disse Ricardo Lewandowski após o encerramento da sessão desta quarta-feira.
Assim, espera-se que, quando a corte analisar o recurso extraordinário de Paulo Rocha (que, como Jader, renunciou ao mandato parlamentar para evitar um processo disciplinar), a decisão seja a mesma. Aí surgirá outro problema. Com a eventual confirmação do indeferimento do registro de candidatura do petista, 57% dos votos ao Senado no Pará serão invalidados. Rocha recebeu o apoio de 1.733.376 eleitores nas urnas. Assim, o Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE-PA) deverá tomar uma decisão sobre a necessidade ou não de convocar novas eleições. “Isso é uma decisão que o TRE deve tomar primeiro. Depois, eventualmente, o TSE”, disse Lewandowski, que preside o TSE.
O Supremo também se manifestará sobre a validade neste ano de outras regras de inelegibilidade trazidas pela Lei da Ficha Limpa, como a proibição de candidatura daquele que foi condenado por órgão judicial colegiado, fato que torna inelegíveis, entre outros, o deputado federal Paulo Maluf (PP-SP) e o ex-governador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB).
Apoio desde o início
Desde o início do movimento popular de recolhimento das assinaturas, o Congresso em Foco, que foi o primeiro veículo de comunicação brasileiro que publicou uma lista de políticos com pendências criminais na Justiça (em março de 2004, logo após o lançamento do site), colocou-se ao lado do movimento Ficha Limpa. Quando boa parte da imprensa duvidava que a lei seria aprovada ou que seria aplicada ainda este ano, este site já demonstrava que o país vivia um momento histórico, e que, embora confiasse num resultado final favorável, o momento de validade da lei era uma questão menor, em razão da possibilidade que se abria de uma mudança na cultura política do país.
Momento histórico, não momento histérico
Quando o Supremo Tribunal Federal resolveu nada decidir no julgamento do recurso do ex-candidato ao governo do Distrito Federal Joaquim Roriz, o Congresso em Foco publicou editorial contra a indefinição. E iniciou, depois, um abaixo-assinado apelando ao STF para que tomasse uma decisão imediata sobre o tema. Foram colhidas 5.535 assinaturas até as 22h de hoje (27), inclusive de políticos como o senador Pedro Simon (PMDB-RS) e o deputado Chico Alencar (Psol-RJ) e do jurista Márlon Reis, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), responsável pelo projeto de iniciativa popular que resultou na Lei da Ficha Limpa.
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