O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, solicitou à Comissão de Estudos Constitucionais da entidade um “estudo detalhado” dos crimes do presidente Jair Bolsonaro apontados pelo ex-ministro Sergio Moro durante pronunciamento nesta sexta-feira (24).
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Ao deixar o cargo de Ministro da Justiça e Segurança Pública, Moro disse que a decisão de mudar o comando da Polícia Federal foi motivada por uma preocupação do presidente Jair Bolsonaro com um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo Moro, o presidente tentou interferir no comando e na autonomia da Polícia Federal.
Após as acusações, parlamentares e juristas avaliam que aumentam as possibilidades de impeachment do presidente. Para a OAB, as acusações feitas pelo ex-ministro podem ter implicações jurídicas.
Santa Cruz disse que as declarações do ministro Sergio Moro ao comunicar sua demissão foram “muito graves”, indicando possíveis crimes por parte do presidente da República.
“É lamentável que, no dia seguinte ao país registrar mais de 400 mortos pela pandemia, estejamos todos em meio a nova crise patrocinada pelo governo”, disse o presidente da entidade em nota.
Crimes comuns e de responsabilidade
Além dos crimes de responsabilidade que ensejam um pedido de impeachment, o presidente da República também pode responder por infrações penais comuns, desde que elas tenham relação com o cargo. A Constituição proíbe que o presidente seja responsabilizado por “atos estranhos ao exercício de suas funções” durante a vigência do seu mandato.
“Existem elementos de autoria e materialidade para que, ao menos, se investigue e, se for o caso, se apresente uma denúncia em relação aos atos do presidente Bolsonaro”, disse o advogado e professor da faculdade de Direito da UPIS Nauê Bernardo.
Ao buscar acesso a relatórios de investigação da PF, juristas apontam que o presidente pode ter incorrido em crime de advocacia administrativa, ao patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública. O advogado consultado pelo Congresso em Foco defende que esse crime não se aplica ao presidente da República porque ele não é funcionário público, e sim investido em cargo público eletivo.
Outro crime apontado no Código Penal seria o de prevaricação, ao “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. Por fim, um terceiro crime seria o de falsidade ideológica, visto que Moro afirmou que não assinou a exoneração do diretor da PF, Maurício Valeixo, ficando sabendo do ato apenas quando da sua publicação no Diário Oficial da União (DOU). A assinatura de Moro apareceu na exoneração, mesmo ele negando ciência do ato.
O advogado Nauê Bernardo pondera que é precipitado falar nesses crimes neste momento. Para ele, não houve, pelo presidente, manifesto dolo de falsificar ato de exoneração e ele não percorreu toda a previsão para os outros dois crimes. “O presidente da República não tem nenhuma trava, nenhuma restrição para executar uma exoneração de um DG [Diretor-Geral] da Polícia Federal, uma vez que a instituição está subordinada a ele. A assinatura do Moro também não é necessária naquele caso”, entende ele.
Juristas consideram mais forte que seja atribuído a Bolsonaro algum crime de responsabilidade, o que sustenta um pedido de impeachment. “Nesse caso, o juízo de conveniência acaba sendo muito mais político do que jurídico. Me parece que há mais teses de crime de responsabilidade do que de crime comum”, diz o advogado.
Precedentes
Havendo razão para uma denúncia ou queixa-crime por crime comum contra o presidente, a acusação deve ser apresentada perante a Câmara dos Deputados, mas, diferente do impeachment, é o Supremo Tribunal Federal (STF) que julga. Acolhida a denúncia pela Câmara e pelo STF, o presidente pode ser afastado do cargo até o término do julgamento.
Em 2017, o então Procurador-Geral da República (PGR), Rodrigo Janot, apresentou duas denúncias contra o presidente Michel Temer, mas elas foram arquivadas pela Câmara e nem chegaram a ser analisadas pela Suprema Corte. Os crimes que embasaram as denúncias de Janot foram corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de justiça. No caso dos crimes de falsidade ideológica, prevaricação e advocacia administrativa, não há precedentes. “No fim das contas, vai depender muito do juízo do STF”, disse o advogado Nauê Bernardo.
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