Chamado de o “pior dos paraíbas” pelo presidente Jair Bolsonaro, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), acredita que o chefe do Executivo tem dado declarações polêmicas como essa apenas para ocupar a agenda pública com conflitos e, assim, esconder a falta de resultados do governo federal. Mesmo assim, disse estar pronto para o diálogo e para receber Bolsonaro no Maranhão. Dino foi recentemente apontado pelos principais líderes do Congresso como o melhor governador do país, conforme revelou nova rodada do Painel do Poder, pesquisa feita pelo Congresso em Foco em parceria com a In Press Oficina.
“Se ele resolver visitar o Maranhão, se depender de mim, vai ser bem tratado e bem recebido”, garantiu Flávio Dino, dizendo que, ao contrário do governador da Bahia, Rui Costa (PT), também não hesitaria em cumprir uma agenda ao lado de Bolsonaro. “Se ele desejar e se houver condições de diálogo, eu vou. Não é porque ele não gosta de mim que vou deixar de cumprir o juramento que fiz de defender meu estado”, acrescentou.
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O governador do Maranhão falou sobre a relação com o governo Bolsonaro durante passagem por Brasília, exatamente uma semana depois de o presidente dizer ao ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que “esses governadores de ‘paraíba”, o pior é o do Maranhão. Não tem que ter nada com esse cara”. Na ocasião, porém, garantiu que a viagem não foi motivada por essa declaração e revelou que ficou surpreso com a opinião de Bolsonaro sobre ele porque nunca nem sequer conversou com o presidente. “Nunca nos falamos pessoalmente a não ser em reuniões de governadores. A sós nunca. Os assuntos que temos para tratar são tratados nos ministérios e em reuniões gerais de governadores. Mas, se ele chamar uma reunião na próxima semana, eu estarei presente”, afirmou Dino.
Ao Congresso em Foco, Dino disse ainda que, a não ser sua filiação partidária e sua origem nordestina, não enxergava razões para o atrito com o presidente. Por isso, associou a fala de Bolsonaro à prática do governo de “criar conflitos” e “criar inimigos”. “Como o governo é muito fraco, tem poucos resultados a mostrar e não tem uma agenda própria de trabalho, acaba ocupando a agenda pública com esse tipo de conflito, perseguição e discriminação”, declarou Flávio Dino, afirmando que essa é uma atuação clássica das correntes de direita. “Procurar um inimigo é funcional para a manutenção do grupo social que apoia o governo. Como o judeu está para o nazismo e os imigrantes estão para Trump, os paraíbas estão para Bolsonaro”, atacou Dino, ressaltando, por sua vez, que os nordestinos não foram os únicos inimigos escolhidos por Bolsonaro.
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Publicidade“Há um cenário de guerra de todos contra todos, que o próprio presidente da República estimula, inclusive com os seus. Basta olhar o Joaquim Levy e os generais que ele trata tão mal como exemplo”, alfinetou Dino, que também colocou na lista de alvos de Bolsonaro “o Carnaval, os artistas, os cientistas, o Inpe, o Bebbiano, o Santos Cruz e a imprensa”.
Por conta disso, o governador do Maranhão coloca os conflitos como principal característica dos seis primeiros meses do governo Bolsonaro. “O conjunto da obra até aqui do governo federal se restringe à confusão política e à reforma da Previdência que só foi aprovada em razão do Rodrigo Maia, apesar dos obstáculos que o próprio Bolsonaro colocou. Se eu fosse presidente da República ou mesmo governador do meu estado, ficaria muito constrangido de ter apenas isso em seis meses de governo: de um lado confusão e do outro a reforma que andou por causa do Maia, enquanto ele inaugura obra da Dilma e do Temer. É muito pouco”, criticou.
Ainda sobre a atuação do governo federal, Flávio Dino revelou que o Executivo não tem destravado pleitos dos estados, tem apenas dado seguimento ao que já estava encaminhado pelas gestões anteriores. “Nós temos em execução contratos e convênios que foram celebrados no tempo da presidente Dilma e do presidente Temer. Até o momento, não tivemos nenhuma dificuldade com os ministérios quanto a isso. Mas em relação às pautas novas, há muita lentidão do governo federal em atendê-las. E isso não se refere especialmente ao Maranhão, mas aos estados como um todo. Há um travamento geral”, criticou Dino, para quem “o governo está muito lento naquilo que o Brasil precisa e tem urgência, que é a pauta social e o desemprego”.
Apesar das críticas e da polêmica criada em torno dos ‘paraíbas’, o governador do Maranhão garante não ter medo de retaliações. “Não pedimos privilégios. As pautas que o Maranhão apresentou são comuns a todos os estados. Queremos o que é devido e é direito da população”, argumentou, lembrando que o presidente tem o dever de cumprir o pacto federativo e zelar pela unidade nacional. “A Constituição diz que eventuais simpatias ou antipatias pessoais não devem determinar o conteúdo dos atos administrativos de um agente público”, afirmou, ressaltando que até na época da ditadura militar os presidentes respeitavam esse preceito. “Não posso acreditar que a essa altura o Brasil vá aceitar que o governo federal seja pior que no tempo da ditadura. Então, não tenho medo. Tenho espanto e indignação”, afirmou Dino.
Mesmo assim, o governador do Maranhão não deve seguir o exemplo da Frente Parlamentar do Nordeste, que protocolou uma representação contra o presidente na Procuradoria-Geral da República por conta do preconceito demonstrado na fala dos ‘paraíbas’. “Temos improbidade administrativa por conta do descumprimento de deveres legais e há indícios do cometimento de crimes. Mas essa petição já me representa, pois permite que o Ministério Público Federal reflita e que o próprio presidente reflita sobre isso”, explicou Dino, que, mesmo sendo jurista, prefere que essa ação gere mais reflexões do que processos. “Se o presidente se acha legitimado a espalhar preconceito, ele acaba induzindo milhares de pessoas a também praticarem isso. E o presidente da República é o último que pode alimentar esse tipo de ódio, discriminação e violência”, explicou.
Eleições de 2022
A despeito das críticas a Bolsonaro, Flávio Dino prefere não se lançar candidato à presidência da República em 2022. Ele até admite a possibilidade, que já havia cogitado anteriormente e agora ganha força já que a polêmica com Bolsonaro deu mais visibilidade ao seu nome; mas diz que vai trabalhar, antes de tudo, para que a esquerda se una em torno de um novo projeto que possa desbancar a reeleição de Bolsonaro.
“Em razão dos eventos que implicaram derrotas da esquerda, nós que temos o papel de lideranças temos que estar presentes no debate nacional para ajudar a encontrar caminhos. Tenho feito debates, quando é compatível com minha agenda administrativa, para ajudar a refletir sobre o Brasil e a criar uma união no nosso campo político, para a que a gente possa vencer a eleição. Mas vencer com qual candidato? Nós vamos ver”, desconversou Dino, ressaltando que não teria problema em fazer campanha para outros companheiros da esquerda. “Posso fazer campanha para qualquer liderança do nosso campo que defende o Brasil e os brasileiros. E digo isso com toda sinceridade, porque já fiz para Lula, Dilma, Haddad e para o próprio Ciro Gomes”, afirmou.
Dino admitiu, por sua vez, que, além de se unir, a esquerda precisa apresentar um novo programa político para vencer as eleições. “Temos duas heranças poderosas que não devem ser negadas – o lulismo e o trabalhismo. Mas, por sobre essas tradições vitoriosas, temos que construir um novo programa. Novas ideias e propostas que impulsionem o país para a frente e mostrem que representamos a soberania nacional, o desenvolvimento econômico e a justiça social”, defendeu. Ele acredita, contudo, que não é preciso um novo nome, como o seu, para representar esse novo programa. “Se o presidente Lula saísse candidato, eu votaria nele. E acho que nomes já citados são excelentes, a exemplo do Ciro e do Haddad. O mais importante é que seja um nome que gere união, diminua arestas e consiga dialogar com a sociedade, inclusive com os setores sociais que não são necessariamente de esquerda”, disse o governador do Maranhão, que, mesmo assim, admitiu o desejo de se lançar à presidência.
“É uma possibilidade. Eu posso ser eventualmente candidato a presidente da República, mas também posso apoiar alguém, ser candidato ao Congresso ou até voltar a dar aula de direito constitucional, que também adoro e acho que mais do que nunca o Brasil precisa, porque esse direito que está sendo praticado não é o direito verdadeiro”, declarou. Lembrando que deixou de ser juiz para ser político, Dino ainda revelou sentir saudades de poder legislar na Câmara dos Deputados. “O Parlamento é muito bom e envolvente, pelos debates e pela possibilidade de mudar a realidade nacional mediante leis”, comentou.
Flávio Dino pontuou, contudo, que antes de pensar em 2022 é preciso pensar em 2019. “Devemos ver primeiro se haverá eleição em 2022, porque se depender de um ou outro que está por aí andando neste momento em Brasília, tem gente com a ideia de que esse negócio de eleição só atrapalha. Basta olhar a internet e as manifestações com faixas para fechar o Supremo e o Congresso e chamar uma intervenção militar para perceber. Não podemos banalizar isso, porque as grandes tragédias históricas surgiram da minimização”, declarou Dino, ressaltando que não cabe apenas à esquerda lutar contra essa situação.
“Fugir dessa armadilha não compete apenas à esquerda. O Brasil todo é vítima disso”, argumentou o maranhense, que aproveitou o ensejo para pedir ações mais enfáticas do Poder Judiciário em relação a ações que considera institucionais por parte do presidente Jair Bolsonaro e também do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro. Ele citou como errôneo, por exemplo, o envolvimento de Moro nos inquéritos que investigam a ação de hackers em seus celulares. “Por razões diferentes, Moro e Bolsonaro têm trilhado perigosos caminhos antidemocráticos. Por isso mesmo, é preciso manter a luz amarela e reivindicar que aqueles que estão omissos se movam, sobretudo o Ministério Público e o Poder Judiciário. Tenho absoluta certeza que a imensa maioria dos procuradores e juízes do Brasil não concorda com esse tipo de coisa, mas não basta discordar em casa. É preciso tomar providências”, provocou Dino.
Por fim, o governador do Maranhão admitiu que acha pouco provável uma ruptura antidemocrática no Brasil. Pensando em 2022, ele disse até achar possível que a esquerda conquiste novos votos na campanha eleitoral. “Os equívocos de Bolsonaro nos ajudam nesse sentido”, afirmou Dino, para quem um terço da população está à esquerda, um terço está com Bolsonaro e o outro terço está em posição de neutralidade, observando as coisas acontecerem, como um território a ser conquistado.