Mais de 93 mil pós-graduandos podem ficar sem bolsa a partir de 2019. Essa é uma das conclusões de nota (íntegra abaixo) divulgada pelo conselho superior da Coordenação de Aperfeiçoamento de Nível Superior (Capes), órgão vinculado ao Ministério da Educação, em razão da redefinição orçamentária imposta pelo governo Michel Temer (MDB) para o próximo ano. Endereçado ao ministro da Educação, Rossieli Soares, o ofício se queixa do teto imposto à Capes, “um corte significativo em relação ao próprio orçamento de 2018”, e diz que o repasse tem nível inferior ao que determina a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) aprovada pelo Congresso em 11 de julho.
“Caso seja mantido esse teto, os impactos serão graves para os Programas de Fomento da Agência”, adverte a nota da Capes, formalizada ontem (1º/ago), acrescentando que cerca de 93 mil “discentes e pesquisadores” de pós-graduação terão seus trabalhos interrompidos. Outro reflexo, acrescenta o órgão, é que a interrupção de projetos afetará mais de 245 mil beneficiados, entre alunos e bolsistas (professores, tutores, assistentes e coordenadores).
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“Suspensão do pagamento de todos os bolsistas de mestrado, doutorado e pós-doutorado a partir de agosto de 2019, atingindo mais de 93 mil discentes e pesquisadores, interrompendo os programas de fomento à pós-graduação no país, tanto os institucionais (de ação continuada), quanto os estratégicos (editais de indução e acordos de parceria com os estados e outros órgãos governamentais)”, acrescenta o órgão.
O estrangulamento orçamentário, acrescenta a nota, ameaça outros dois campos de atuação do setor – formação de profissionais e programas de fomento a projetos no exterior. “Suspensão dos pagamentos de 105 mil bolsistas a partir de agosto de 2019, acarretando a interrupção do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência […], do Programa de Residência Pedagógica […] e do Programa Nacional de Formação de Professores da Educação Básica”, diz outro trecho do documento.
Ainda segundo a Capes, o teto orçamentário provocará prejuízo à continuidade de praticamente todos os programas de fomento à pesquisa no exterior. “Um corte orçamentário de tamanha magnitude certamente será uma grande perda para as relações diplomáticas brasileiras no campo da educação superior e poderá prejudicar a imagem do Brasil no exterior”, conclui a nota.
Corpo a corpo no orçamento
Um assessor do Ministério da Educação disse ao Congresso em Foco que a nota é apenas uma espécie de alerta acerca da necessidade de reforço orçamentário para o setor no ano que vem, e que a Lei Orçamentária Anual (LOA), geralmente aprovada por deputados e senadores em dezembro, deve resolver o problema.
O MEC ainda não emitiu qualquer esclarecimento sobre a advertência da Capes, que provoca intensa discussão em redes sociais nesta quinta-feira (2) e é um dos assuntos mais comentados do Twitter, por exemplo. O assessor acrescentou que o ofício emitido pela coordenadoria aponta a necessidade de a LOA ser concebida com base na LDO, de forma a manter o que foi acordado com setores da sociedade civil e aprovado pelos congressistas.
Ainda de acordo com a assessoria do MEC, o ofício que a Capes tem em mãos, institucionalmente, presta-se a pedir que o ministro Rossieli consiga manter o que foi votado na LDO. O assessor lembra que quem define a alocação de recursos para áreas diversas da administração pública é o Ministério do Planejamento.
Ainda segundo a assessoria, o ministro da Educação já tomou conhecimento da nota e tratará o assunto internamente, junto a deputados e senadores, a exemplo do que foi feito no “corpo a corpo” durante a votação da LDO no Congresso.
Procurado pela reportagem, o Ministério do Planejamento encaminhou nota por meio da qual diz que apenas define limites para cada ministério, em observância à lei orçamentária. “A partir de então, cada ministério tem a responsabilidade de definir a distribuição dos recursos entre suas unidades, respeitando suas estratégias de ação”, diz a pasta.
Leia a nota do Ministério do Planejamento:
O Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MP) estabelece, para cada um dos ministérios, os respectivos limites totais para a confecção do Projeto de Lei Orçamentária. O MP define somente o montante global de cada Pasta. A partir de então, cada ministério tem a responsabilidade de definir a distribuição dos recursos entre suas unidades, respeitando suas estratégias de ação. Essa regra vale para todos os ministérios, ou seja, vale também para o Ministério da Educação (MEC), que tem autonomia para decidir como vai aplicar seus recursos.
Os recursos para o Ministério da Educação estão acima do mínimo constitucional em 2018 e os referenciais monetários para 2019 também preveem recursos acima do limite constitucional. Não podemos desconhecer que o país vive grave crise fiscal. Ela afeta todo o governo, inclusive o Ministério da Educação. Cabe ao Ministro da Educação distribuir os recursos segundo suas prioridades.
Leia a íntegra da nota da Capes:
Ofício nº 245/2018-GAB/PR/CAPES
Brasília, 01 de agosto de 2018.
Ao Excelentíssimo Senhor
ROSSIELI SOARES DA SILVA
Ministro de Estado da Educação
Assunto: Nota do Conselho Superior da Capes ao Ministro do MEC
Senhor Ministro,
O Conselho Superior da CAPES, reunido neste dia 01 de agosto, em debate sobre o orçamento da CAPES para 2019, deliberou pelo encaminhamento da presente manifestação sobre a elaboração da Proposta Orçamentária.
Preliminarmente, este Conselho saúda o empenho do Sr. Ministro no sentido de viabilizar a integridade orçamentária do MEC consagrado no artigo 22 da Lei de Diretrizes Orçamentárias 2019 (LDO). Esse processo exitoso resultou na manutenção dos valores de 2018 ajustados pela inflação como piso orçamentário para o próximo ano.
Em contraponto a essa importante conquista, foi repassado à CAPES um teto limitando seu orçamento para 2019 que representa um corte significativo em relação ao próprio orçamento de 2018, fixando um patamar muito inferior ao estabelecido pela LDO. Caso seja mantido esse teto, os impactos serão graves para os Programas de Fomento da Agência. Citamos aqui algumas das principais consequências nas linhas de atuação da Capes:
1. Pós-graduação
Suspensão do pagamento de todos os bolsistas de mestrado, doutorado e pós-doutorado a partir de agosto de 2019, atingindo mais de 93 mil discentes e pesquisadores, interrompendo os programas de fomento à pós-graduação no país, tanto os institucionais (de ação continuada), quanto os estratégicos (editais de indução e acordos de parceria com os estados e outros órgãos governamentais).
2. Formação dos Profissionais da Educação Básica
Suspensão dos pagamentos de 105 mil bolsistas a partir de agosto de 2019, acarretando a interrupção do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid) (Edital n° 7/2018), do Programa de Residência Pedagógica (Edital n° 7/2018) e do Programa Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor) (Edital nº 19/2018).
Interrupção do funcionamento do Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) e dos mestrados profissionais do Programa de Mestrado Profissional para Qualificação de Professores da Rede Pública de Educação Básica (ProEB), com a suspensão dos pagamentos a partir de agosto de 2019, afetando os mais de 245.000 beneficiados (alunos e bolsistas – professores, tutores, assistentes e coordenadores) que encontram-se inseridos em aproximadamente 110 IES, que ofertam em torno de 750 cursos (mestrados profissionais, licenciaturas, bacharelados e especializações), em mais de 600 cidades que abrigam polos de apoio presencial.
3. Cooperação Internacional
Prejuízo à continuidade de praticamente todos os programas de fomento da Capes com destino ao exterior.
Um corte orçamentário de tamanha magnitude certamente será uma grande perda para as relações diplomáticas brasileiras no campo da educação superior e poderá prejudicar a imagem do Brasil no exterior.
Diante desse quadro, o Conselho Superior da CAPES apoia e solicita uma ação urgente do Ministro da Educação em defesa do orçamento do MEC que preserve, integralmente, no PLOA 2019 o disposto no Artigo 22 da LDO aprovada no Congresso Nacional.
Respeitosamente,
ABILIO A. BAETA NEVES
Presidente
Congresso aprova orçamento de 2019 com reajuste para servidores públicos
Esta matéria parece ser um achado de reportagem, algo momentoso de que podem se orgulhar os jornalistas de campo – algo como uma espécie de “o homem mordeu o cachorro”…Fábio Gois é um sujeito valoroso, tem muitos méritos. Mas na dicotomia de Millôr Fernandes, não esconde sua afinidade com um mero ‘press release”, embora se apresente como jornalismo ‘contra o poder’. (A matéria saiu agora à tarde em todos os meios), Pretender tanta repercussão para a escassez de recursos para bolsas de estudos e pesquisa de pós-graduação, apontando a culpa para a EC do teto de gastos pode não ser fake, o que de fato não é; mas para qualquer sujeito com o mínimo de senso crítico, que venha acompanhando as vicissitudes da crise fiscal, francamente: não passa de ‘press release’ não oficial, mas encomendado por um grupo de interesse que tem imenso poder e influência (“capital simbólico”, se chama). Como pode o jornalismo querer nos sugestionar ou mover ‘comprando a briga’ de corporações de pós-graduação e pesquisa, num ambiente intoxicado, conspurcado por carência agudas, trágicas mesmo, no tocante a recursos para saúde e educação, para ficar somente nestas? Como o jornalismo, com todo o respeito ao C&F, pode ter o desplante de dar destaque a um segmento como esses, quando faltam dentaduras, medicamentos, tiras para medicação de glicemia, gaze, esparadrapo, material de higiene nos hospitais; quando as filas para consulta e cirurgia no SUS são absolutamente desrespeitosas… Ora, querer esgrimir as carências estilosas da pós-graduação num país de 13 milhões de desempregados e outros tantos subempregados, ora, seria simplesmente patético se não beirasse o ridículo… Na verdade, se essa fosse a carência realmente importante, muito dificilmente se arregimentaria apoio necessário para contra-arrestar os objetivos da famigerada PEC… Politicamente, prefiro os jornalecos que esbravejam, para o Datena, nas portas dos pronto-socorros…
Agradecemos pela crítica, Nestor, e pela ponderação com que ela é feita. Jornalismo online, para além das discussões sobre press release, sempre demanda o delicado exercício da combinação entre clareza, correção, responsabilidade e agilidade – sem que, em razão disso, o erro seja facilmente aceitável. Um abraço
Tenho orgulho de fazer parte desta comunidade de conversação pública, fundada no fato do pluralismo. Valeu.
Vale sempre, Nestor. Sigamos.