O desinteresse demonstrado até agora pela equipe econômica em relação a uma proposta de emenda constitucional (PEC) que altera a chamada regra de ouro e dá mais flexibilidade ao orçamento federal tem irritado deputados governistas. A PEC, de autoria do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), deveria ser votada nesta semana pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mas devido à falta de engajamento do governo foi retirada de pauta pelo presidente do colegiado, Felipe Francischini (PSL-PR), do mesmo partido do presidente Jair Bolsonaro.
A regra de ouro proíbe o governo de se endividar para pagar despesas correntes, aquelas destinadas à manutenção da máquina pública, como gastos com pessoal, entre outros. Essa norma foi descumprida neste ano e será novamente em 2020. De acordo com a Constituição, o descumprimento dela pode caracterizar crime de responsabilidade e até levar ao impeachment do presidente da República.
Leia também
Integrante da base governista e um dos líderes da bancada evangélica, o relator, Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), afirmou que Guedes deveria se lembrar do que aconteceu com a ex-presidente Dilma Rousseff, deposta do cargo após as chamadas pedaladas fiscais. “Não sei se o governo resolveu governar por decreto. Dilma já foi embora”, advertiu Sóstenes em entrevista ao Congresso em Foco.
Sobrando caixa
Ele também ironizou a postura do governo, que tem enfrentado sérios problemas para fechar as contas e aumentar os investimentos. “O governo não está preocupado. Deve estar sobrando caixa”, disse. O deputado reclamou que ninguém do Executivo o procurou para tratar do assunto. “Isso é uma irresponsabilidade total da equipe econômica. Estou desgastando o meu mandato. Não consigo entender. Tenho total afinidade ideológica com o governo. Não vou ficar me desgastando por quem não está nem aí.”
Francischini também não esconde sua insatisfação. Ele diz que só incluirá o assunto na pauta novamente depois que o governo reunir a assinatura de 34 integrantes da comissão declarando apoio à proposta. “Estou aguardando orientação do governo. Ninguém falou nada ainda. Acho que não é do interesse deles”, disse o presidente da CCJ ao Congresso em Foco. Ele retirou outros projetos de interesse do governo da pauta da comissão.
PublicidadeAlém das mudanças previstas na PEC de Pedro Paulo, o futuro relator na comissão especial, Felipe Rigoni (PSB-ES). quer rever a obrigatoriedade de reajustar o salário mínimo com base na inflação, reduzir os salários e as jornadas de trabalho para servidores públicos e suspender os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador para o BNDES.
“Apoio institucional”
Até o momento o Ministério da Economia ainda não formalizou sua posição nem definiu sua linha de atuação em relação à PEC. O ministro da Economia, Paulo Guedes, fez apenas um pronunciamento sobre o tema. Em reunião com Pedro Paulo e Rigoni, Guedes disse que o texto tem “apoio institucional” do governo. O que é considerado muito pouco pelos parlamentares.
Um congressista próximo do governo federal confirma que nem a Secretaria de Governo da Presidência, responsável pela articulação política, recebeu orientações sobre a PEC da equipe econômica comandada por Guedes.
“O tema é importantíssimo para nós, mas até semana passada a Secretaria de Governo ainda não tinha uma manifestação da Economia e de outros ministérios acerca do tema. Eu que levantei na reunião que tem toda segunda-feira, levantei a importância e passou a ficar no radar”. O tema também não foi tratado na reunião governamental dessa segunda-feira (16).
Posição de governo
Para a fonte ouvida pelo Congresso em Foco, é importante que a equipe econômica tenha uma posição clara sobre a PEC. “Na CCJ agora é só admissibilidade, mas depois vai ser criada uma comissão especial e a gente precisa saber para que lado o governo vai caminhar, se vai encaminhar um substitutivo, se vai encapar a ideia do Sóstenes. O Executivo está se organizando para ter uma posição de governo sobre o tema”, acrescentou o parlamentar governista, que pediu para não ser identificado.
Prevista na Constituição, a regra de ouro determina que as operações de crédito não podem ser maiores que os investimentos. A norma tem como objetivo evitar que o governo aumente sua dívida para pagar despesas como folhas de salários e serviços de luz e telefone de órgãos públicos.
A regra de ouro está prevista na Constituição Federal e determina que as operações de crédito da União não podem ser maiores que as despesas de capital (essencialmente investimentos). Isso serve para evitar que o governo aumente sua dívida para pagar despesas correntes, como folha de salários e serviços como luz e telefone de órgãos públicos. Quando a regra é descumprida, os gestores e o presidente da República podem ser enquadrados em crime de responsabilidade, o que poderia ser usado para pedido de impeachment.
> Deputado propõe cortes em despesas obrigatórias para destravar R$ 80 bilhões do orçamento
Dr. Sóstenes, é claro que não há interesse do governo, neste momento, na quebra da regra de ouro. O argumento principal dele para cortes de direitos é exatamente esse: falta de recursos para pagamento de obrigações constitucionais. Se cair a regra de ouro, ele ficará sem argumentos para aprovar as reformas restantes: fim do 13, fim do FGTS, Fim 1/3, fim das universidades públicas, fim do SUS público, tudo conforme prometido em campanha, embora não avaliado, à época, pelos eleitores.