Ana Paula Barreto*
Já não há o que este governo possa ser, fazer ou parecer que nos cause ainda mais repulsa, vergonha ou indignação. Porém fomos surpreendidas (sim, aqui é importantíssimo o uso da flexão de gênero) esta semana com um episódio na sessão da CPI que investiga a incompetência, a ingerência, a corrupção e a política de morte do Executivo Federal em relação à pandemia da Covid-19, onde o ministro depoente – que ocupa a pasta da Controladoria Geral da União – desferiu o adjetivo de “descontrolada” contra uma senadora da República.
Na mente confusa, para usar de eufemismo, a “autoridade” revela o machismo enraizado, entranhado e exaltado por essa gestão federal. O pensamento é tão tacanho, que prevalece a velha máxima que mulheres quando “sobem o tom” estão em descontrole, em surto histérico, perderam a razão. Mas seria oportuno e esclarecedor dizer ao ministro que descontrolado é o adjetivo que cabe assim, “como uma luva”, para o governo que ele integra.
Vamos falar sobre descontrole então senhor ministro…vamos recordar quantas vezes o seu chefe, que infelizmente é o “Comandante em Chefe“ desta nação, gritou, agrediu com palavras, foi intimidador com jornalistas – na sua maioria mulheres, é bom lembrar -, proferiu expressões e gestos hostis à população negra, à comunidade LGBTQIA+ e a todas as famílias que perderam pessoas queridas nesta pandemia.
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Quem sabe ofereçamos ao ministro um outro fato bem recente, noticiado no mesmo dia ao da cena protagonizada por ele quando do adjetivo usado para tentar deslegitimar a senadora Simone Tebet, aquele em que seu colega – o que comanda a pasta da Saúde – fez um gesto considerado obsceno às pessoas que se manifestavam em Nova York na passagem vexatória que o presidente da República e sua comitiva fazem na Assembleia Geral da ONU. Pode haver descontrole, histeria, destempero maior que um ministro de Estado mostrar o dedo para os que se expressam em contrariedade à política sanitária mortal deste governo?
Até onde possamos nos lembrar, uma vez que o presidente da República não nos deixa esquecer, este é um governo que tem em quase sua totalidade os cargos do primeiro escalão ocupados por homens. Então, as perguntas que se fazem necessárias e urgentes são: Quem são os descontrolados neste país? Quem são os responsáveis pelo descontrole econômico, ambiental, sanitário e social no Brasil?
Como se não bastasse a expressão machista e misógina do ministro da CGU na CPI – embora este ao menos tenha pedido “sinceras” desculpas à senadora – um general arrependido e ex apoiador de Bolsonaro agora resolve dizer que a senadora deve medir as palavras “antes de usar a fragilidade do sexo como escudo para as suas ousadias”. Desta forma, está claríssimo e transparente que o “problema” não é bem de descontrole, mas de ousadia.
Pois quero lhes dizer, caros senhores, que vocês necessariamente terão de engolir as “ousadias” femininas/feministas, sejam elas para requerer assentos para senadoras na CPI, sejam elas para inquerir “assertivamente” (como diria a presidenta golpeada em 2016 por homens descontrolados) ministros de Estado que devem prestar contas ao país.
É com alegria e esperança que vos digo: a ousadia chegou para ficar e para incomodar os homens descontrolados que governam o Brasil.
Ontem, hoje e sempre: Viva a descontrolada ousadia das mulheres brasileiras!
*Ana Paula Barreto é jornalista formada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e pós-graduada em Comunicação Legislativa pela Universidade do Legislativo Brasileiro (Unilegis). Foi assessora de comunicação no Senado Federal e no Superior Tribunal de Justiça e chefe de Comunicação da Secretaria das Relações Institucionais da Presidência da República.
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