Danilo Cabral*
Com o único objetivo de impedir o repasse de recursos previstos para a aquisição de pacotes de internet e aquisição de tablets destinados ao atendimento de professores e estudantes das redes públicas de ensino, o governo federal editou a medida provisória 1.060, no último dia 5 de agosto de
2021. Ela altera a Lei nº 14.172, de 10 de junho de 2021, resultante de um amplo debate com a sociedade, passando pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, com aprovação quase unânime.
Ainda assim, a proposição foi objeto de veto presidencial, que foi prontamente derrubado pelo Congresso Nacional. Mas não é segredo o descompromisso do Governo Federal com essa agenda. A atuação quase inexistente durante a pandemia para viabilizar o ensino remoto, além da baixa
execução do programa Educação Conectada, que, em 2020, executou menos que a metade (45,1%) dos recursos utilizados pelo programa em 2019, demonstram inequivocamente o desinteresse do governo sobre essa temática.
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Nesse mesmo sentido, a versão da minuta do edital do 5G encaminhada ao Tribunal de Contas da União, que prevê vultoso aporte de recursos públicos para sua implantação, não estabelece qualquer obrigação ou contrapartida destinada à cobertura de escolas públicas. Trata-se de importante mudança, que trará enormes repercussões sobre a conectividade e o avanço tecnológico
no país, que não pode estar dissociada de metas educacionais e de inclusão. É uma oportunidade única para levar o acesso à internet e incluir um enorme contingente de escolas no mundo digital.
Apesar da atuação incisiva da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, reivindicando ao Ministério das Comunicações que fosse incluída a cobertura das escolas no edital, até o presente momento nada foi encaminhado nesse sentido.
A suspensão das aulas presenciais no país, em virtude do avanço da contaminação pelo COVID-19, jogou luz sobre a situação em que se encontra parcela considerável dos estudantes brasileiros, qual seja, a de precariedade e exclusão digital.
PublicidadeO censo escolar de 2020 identificou que 40% das escolas públicas brasileiras não têm banda larga e 26% não têm qualquer acesso à internet. Mesmo dentre as escolas que possuem acesso à rede, somente 29,6% das escolas municipais de ensino fundamental possuem internet destinadas a
atividades de ensino e aprendizagem. Já no ensino médio, apenas 35% possuem internet para essa finalidade, conforme dados do Inep de 2020.
Quando olhamos a viabilidade de acesso na residência do educando, o contexto de exclusão também se reproduz já que na zona rural brasileira 48% dos domicílios não têm acesso à internet, e 39% dos indivíduos nunca sequer acessaram a internet. Nos domicílios – TIC-Domicílios, 2019 – das classes D e E esse percentual salta para 50%.
Temos um elevado contingente de estudantes que estão crescendo e se desenvolvendo ainda no mundo analógico, enquanto o mercado de trabalho e o conhecimento estão migrando rapidamente para o mundo digital. Ou seja, além das graves barreiras condicionantes impostas sobre a parcela mais pobre da juventude pela desigualdade social e educacional, a exclusão digital aprofunda ainda mais as distâncias entre ricos e pobres.
O avanço tecnológico está transformando profundamente o mundo do trabalho, que, segundo pesquisa do Laboratório de Aprendizado de Máquina em Finanças e Organizações da Universidade de Brasília (UnB) publicada em 2019, até 2026, 54% dos empregos formais do país poderão ser substituídos por robôs e programas de computador, o que aponta para a extinção de aproximadamente 30 milhões de postos de trabalho.
Nesse contexto, cada vez mais o contato e a familiaridade com o mundo digital se tornam mais decisivos para o acesso ao mercado de trabalho. É urgente o país enfrentar a exclusão digital e colocar em pauta a necessidade de integrar as novas tecnologias digitais com os conteúdos ensinados no
ambiente escolar.
Mas ao invés de ocupar a agenda educacional com temas dessa relevância, o Governo Federal concentra suas baterias em temas comportamentais, negação da ciência e ameaças a democracia.
Não resta dúvida, o governo do anacronismo jamais seria capaz de projetar a educação brasileira com os desafios do futuro.
*Danilo Cabral é deputado federal e líder do PSB na Câmara de Deputados. Ele foi secretário de Estado da Educação,Cidades e Planejamento de Pernambuco.
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