Antes de tudo, vocês precisam saber o que é a Quarta Teoria Política (QTP). Segundo a jornalista Letícia Oliveira, é uma teoria política formulada pelo filósofo e cientista político russo Aleksandr Dugin. Nela, Dugin propõe uma superação às três teorias políticas modernas – liberalismo, comunismo e fascismo. Abertamente anti-iluminista, a QTP advoga por um retorno à “tradição” e ao “povo”.
Sua teoria é uma salada de conceitos de filósofos abertamente fascistas, como Martin Heidegger (responsável pela base teórica do nazismo) e Julius Evola, misticismo e algumas coisas genéricas pinçadas de teorias políticas de esquerda. Seu mote é a luta contra a modernidade, que, na visão de Dugin, tem sua encarnação no imperialismo estadunidense e na sociedade ocidental laica e democrática. O que acaba confundindo a cabeça de alguns militantes de esquerda.
Não é por menos que Dugin é o equivalente russo do falecido Olavo de Carvalho, servindo como guru do atual presidente Vladmir Putin. Ele está para Putin assim como Olavo esteve para Bolsonaro e Steven Bannon para Donald Trump.
Olavo, inclusive, chegou a elogiar Dugin, que é bem próximo de Bannon, arquiteto da invasão terrorista ao Capitólio.
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Aqui no Brasil esse tipo de pensamento definido como neofascista já seduziu militantes em partidos de esquerda e de direita, reflexo da despolitização dos últimos anos. Já pude observar militantes tanto do PT, quanto do PDT e de outros partidos, defendendo e panfletando algumas ideias exóticas desses grupos!
Destruam a nova política antes que ela destrua o Brasil (e o mundo)
PublicidadePrincipalmente com a guerra na Ucrânia e os crescentes embates entre a Rússia e o imperialismo norte-americano/Otan, alguns militantes de esquerda se deixaram levar pela QTP pelo simples fato de ela também ser contra a postura intervencionista dos EUA. O que é uma sandice absurda!
Ucrânia, Rússia e o jornalismo para maiores
Alguns poucos militantes petistas defendiam até mesmo o uso de redes socais como o Gab ou Gettr, que são verdadeiros celeiros de neonazismo, criados por pessoas que são coniventes e até mesmo apoiadoras de certos discursos de ódio.
Mas, infelizmente, foi no PDT que esses grupos encontraram espaço.
Em 2020, o PDT lançou um defensor desse pensamento político como candidato para a Câmara Municipal de São Paulo que não pensou duas vezes em fazer propaganda do livro antissemita O protocolo dos sábios de Sião, que influenciou Hitler.
Antes de me aprofundar, vale o aviso: eu não vou aqui mencionar o grupo ou determinados nomes, pois não vejo necessidade em dar destaque para pessoas incompatíveis com os valores necessários para a convivência em sociedade e direitos humanos.
A aproximação Aldo Rebelo, que criou a sua versão brasileira da QTP, chamada de Quinto Movimento, e Cabo Daciolo, figuras idolatradas por esses grupos, dá o grau de contaminação de um partido que tolera um grupo de militantes que pratica transfobia aberta contra a vereadora Duda Salabert *, de Belo Horizonte, que também faz parte da direção nacional do PDT.
A filiação e o lançamento da pré-candidatura de um certo comandante que já promoveu entrevistas com Dugin, e é apoiado de maneira fervorosa por membros de uma das organizações defensora da QTP, que hoje atua dentro do PDT, completam a radiografia da situação.
Há um esforço claro de perversão do trabalhismo defendido por Brizola e que busca transformar o PDT no lar de uma ideologia exótica que inclusive vai contra a própria esquerda e os ideais defendidos por seus militantes e pelo trabalhismo no Brasil.
Segundo o líder de um dos movimentos alinhados à QTP e que agora orbitam o PDT, existem 20 militantes filiados ao partido, além dos seus expoentes, ou seja, algo minoritário, mas que mostra força ao lançar e apoiar candidaturas nas eleições. Mostrando que, aos poucos, o extremismo vai ganhando espaço dentro das fileiras do partido. Lembrando que esses 20 filiados dizem respeito apenas a um dos grupos. Não há dados oficiais sobre a quantidade total de militantes e defensores da QTP atualmente em atividade no PDT.
Cabe ao PDT questionar se realmente quer relacionar-se com pessoas com visões de mundo incompatíveis com o Estado Democrático de Direito e a democracia. É preciso que a executiva nacional do partido se reúna urgentemente. Afinal, é o único partido à esquerda encampando candidaturas de expoentes ou pessoas aclamadas por militantes da QTP.
Inclusive, um dos principais “agitadores” da militância pedetista, frequentemente bebe da fonte desses grupos da QTP, sempre lançando teorias estapafúrdias que vão desde George Soros como líder mundial da esquerda (algo defendido também pelo bolsonarismo) até uma suposta aliança da CIA com o Partido dos Trabalhadores para sabotar a candidatura de Ciro Gomes (?). Q-anon puro.
Fontes próximas ao presidente da legenda, Carlos Lupi, afirmam que a situação, até o momento, passa despercebida pelo presidente do partido e que há uma articulação dos coletivos de diversidade para lidarem com a questão internamente. Em entrevista ao repórter Lucas Neiva, do Congresso em Foco, Lupi diz que expulsará os militantes extremistas.
Aos demais partidos de esquerda, cabe mais atenção na filiação e formação de seus militantes, que muitas vezes, por falta de uma boa base teórica, acabam por tropeçar nesses exotismos políticos.
Partidos como PT e PSB precisam também se atentar a isso, uma vez que quadros do partido já foram vistos com membros dessas organizações neofascistas. É como eu disse acima, militantes, embora poucos, já costearam com essas sandices.
Talvez isso seja o reflexo de uma deficiência no trabalho de formação política desses partidos, que acabam fazendo com que militantes abracem qualquer crítica ao capitalismo, mesmo que façam oposição a teses defendidas pela esquerda e muitas vezes agindo como linha auxiliar da extrema-direita.
A qualidade dos nossos políticos e da política feita no país todo caiu e muito! Não seria surpresa se isso também atingisse os partidos de esquerda e seus militantes.
A coesão e a consistência ideológica fazem bem a qualquer partido e evitam a tentação de coisas “exóticas”.
Ao PDT, eu pergunto: o que quer para o futuro?
Se tudo der certo, em 2023, o país deixará de ser governado por um extremista de direita. Retornando para a normalidade democrática, cabe aos partidos devolverem esses exotismos políticos ao ostracismo e, em alguns casos, até mesmo para a cadeia, se necessário.
O lugar do extremismo deve ser sempre as páginas policiais, nunca as colunas políticas.
* Tentei contato com a vereadora, mas não tive sucesso até o fechamento deste artigo.
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