O caso envolvendo o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) aflorou um dos mais intensos debates sobre limites das instituições e liberdade de expressão da história da nossa jovem democracia. Recentemente, Silveira foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal a oito anos e nove meses de reclusão, em regime inicial fechado, e multa de R$ 192,5 mil. Posteriormente, foi concedida graça (indulto) pelo presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, ao deputado federal.
Tanto a decisão do presidente em conceder o indulto como a própria condenação de Silveira foram alvo de intensos debates nas redes sociais e nos meios de comunicação. Afinal, alguém tem a razão neste conflito?
Para entender, precisamos voltar ao início do caso. Daniel Silveira foi preso com base no “inquérito dos atos antidemocráticos”, que investigou manifestações de rua com reivindicações ilegais, como o fechamento do Congresso Nacional e do STF. O próprio inquérito (bem como o processo penal oriundo dele) gerou muita polêmica, pois, neste caso, o STF figura como vítima, condutor das investigações e julgador.
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Ora, fica evidente, portanto, que o inquérito em si é inconstitucional. Não é aceitável, numa democracia, que a mesma instituição seja vítima, investigadora e julgadora do mesmo caso. É impossível haver um julgamento técnico e imparcial sob estas circunstâncias.
Portanto, a prisão e condenação do deputado Daniel Silveira, bem como todos os atos processuais em questão, são, de fato, inconstitucionais, pois o processo que o condenou deriva de uma investigação flagrantemente ilegal.
Isto não significa, em contrapartida, que Silveira seja inocente. Pelo contrário: ao publicar vídeos em suas redes sociais fomentando um golpe de Estado no Brasil, o deputado incorreu no crime de tentativa de impedir o livre exercício dos Poderes. É fato que Silveira se trata de uma figura controversa, cujo discurso deve, sim, ser combatido em forma de defesa do regime democrático.
Todavia, não é tolerável que o STF, cuja principal diretriz é proteger a Constituição Federal, viole nossa Carta Magna sob o pretexto de combate ao autoritarismo. A lei jamais pode ser rompida para punir criminosos. Tal contradição nunca pode ser tolerada em países que se dizem democráticos.
Cabe ressaltar que a penalidade excessiva decretada pelo Supremo (oito anos e nove meses de reclusão) não se dá apenas pela gravidade dos crimes cometidos por Daniel Silveira, mas como um nítido recado a um grupo tido como inimigo do Judiciário: os bolsonaristas. Ocorre que o STF não é um agente participante do jogo político e do debate público, que pode mandar recados a chefes de outros poderes. A Suprema Corte existe para preservar a Constituição, apenas isso; jamais para rasgá-la, sob hipótese alguma.
Sob esta ótica, é impossível afirmar que há ilegalidade na graça concedida por Jair Bolsonaro a Daniel Silveira. De fato, o indulto individual é ato soberano do presidente da República, conforme previsto no art. 84, inc. XII, combinado com o artigo 5º, inciso XLIII da Constituição.
A ilegalidade cometida pelo STF foi um “presente” para Bolsonaro, que se via perdendo o apoio da ala mais radicalizada. Muitos autoproclamados bolsonaristas diziam que o presidente estava abaixando a cabeça para a Suprema Corte e para a moderação de políticos experimentados como o ex-presidente Michel Temer, quando, na verdade, deveria combatê-la com mais veemência e virulência. Portanto, a oportunidade de conceder o indulto a Daniel Silveira não poderia vir em melhor hora para o presidente.
Esse tipo de anomalia jurídica emerge de um cenário onde nossa democracia está sendo massacrada e pisoteada. As instituições estão no limite do esgarçamento político e ninguém mais joga dentro das quatro linhas da Constituição. É necessário que uma nova leva de legisladores restabeleçam o império da Lei e a harmonia entre os Poderes. A continuar no caminho atual, seremos todos levados à total degeneração da República.
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