Sim, com o senhor! É, com o senhor mesmo, deputado, e não se faça de desentendido. O que eu tô perguntando é como o senhor teve a ousadia de votar a favor dum projeto que vai ajudar a destruir a vida no Brasil e no mundo? Não? E como não? O senhor sabia que no Brasil houve um aumento brutal no uso de agrotóxicos? Preste atenção no nome: agro-tóxico. Se fosse bom será que tinha a palavra tóxico no nome? Ah, então não é agrotóxico, é “defensivo agrícola”, é “pesticida”, é “produto de controle ambiental”… Ora, me erre, cabra! Não é mudando de nome que vai fazer bem. É agrotóxico, sim, senhor! E esse troço mata. Porque é muito… tóxico! Este governo vagabundo aí, que o senhor apoia, liberou mais de 1.500 agrotóxicos e uns produtos parecidos, e muitos deles são proibidos em vários países porque causam câncer. Siiiim!, câncer, deputado, já ouviu falar em câncer? E inseticida de matar mosquito, o senhor conhece? Já bebeu? Claro que não, porque sabe que é tóxico, né? E mata! Pois então!
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Mas deputada, eu nem tava falando com a senhora! Mas já que veio, então a senhora escute também. Logo a senhora, que mora na Amazônia, devia ter mais respeito pelo meio ambiente. Tome vergonha e tenha mais atenção pelos votos que a senhora recebeu. A Amazônia da senhora, – aliás, da senhora não, do Brasil e do mundo – pois a Amazônia do Brasil e do mundo sofreu outro baque violento. Só de agosto de 2020 até julho do ano passado o desmatamento cresceu 22 por cento! É mole ou quer mais? Quer dizer: de cada dez árvores da floresta, as motosserras derrubaram duas. Duas! Não é nada? Como não é nada? Imagina se em cada ano a senhora perdesse dois desses seus dedos aí, onde a senhora coloca esses anéis? Dois dedos…por ano! Em cinco anos a senhora não tinha mais era dedo algum! Pois com esses projetos que vocês vêm aprovando aí, os cientistas garantem que em pouco tempo a Amazônia vai virar uma savana. Ah, não sabe o que é savana, né, madame? Pois vá se informar, a senhora é uma deputada, devia conhecer um pouquinho dessas coisas. Vá procurar no google que a senhora vai saber o que é uma savana. Umas arvorezinhas atarracadas, um pinheiro aqui, uma palmeira ali e tá acabado. Lá não tem arvorezona parruda como castanheira, sumaúma, jequitibá, gameleira, peroba rosa, nada disso! Nossa Amazônia é linda, né? Pois se a senhora continuar votando desse jeito ela vai acabar, deputada. Acabar!
Não fuja não, deputado, não fuja não que eu ainda não acabei! Venha cá porque eu sou uma coisa que o senhor não conhece. Sabe o que é que eu sou, deputado? Eu sou… povo brasileiro! E digo isso batendo aqui neste peito velho: povo brasileiro! E não consigo entender como foi que o senhor e seus colegas tiveram o desplante de votar a urgência pra garimpagem nas terras dos índios enquanto ali do lado de fora estava acontecendo o maior ato em favor da Terra de todos os tempos, com Caetano Veloso à frente e mais uma porção de artistas famosos. Inclusive um monte de indígenas. Sim! E todo mundo ouviu quando a Paula Lavine, mulher do Caetano, gritou: “Lyra não!”. Eu sou de pouco estudo mas conheço lira, é um instrumento musical muito antigo. Diz que aquele tal de Nero tocava lira enquanto o incêndio destruía Roma. Tem mesmo a ver. Porque ela estava falando era do deputado Lyra, o presidente da Câmara, que não teve o menor pudor e pôs pra votar o projeto bem na hora do protesto. Quer dizer, o Lyra foi tocar lira enquanto o protesto pegava fogo. Precisava? Não dava pra esperar nem até o dia seguinte? Será que foi por machismo mesmo, pra cantar de galo e mostrar quem é que manda no galinheiro? Só pode.
Não senhora, não senhora! Tem milhões de jeitos de se ganhar dinheiro sem devastar o meio ambiente! Não, não é não! Dá pra plantar e colher, sim, e ganhar dinheiro, muito dinheiro, sem agredir a natureza. Ah, então devastação não tem impacto, é tudo invenção de cientista comunista, é? Claro que tem impacto, deputada. E grande. Ou a senhora não tem televisão pra saber que essas catástrofes naturais já deixaram de ser naturais há muito tempo? Sim, senhora! As enchentes, como essa lá de Petrópolis, os furacões, as secas e o diabo, tudo isso está acontecendo não é porque a natureza quer, deputada! Tudo o que se faz com a natureza muda o clima, muda tudo. Isso tudo anda acontecendo porque os homens irresponsáveis – e as mulheres irresponsáveis, como a senhora, – não estão nem aí para este planetinha azul onde a gente vive. Só pensam é no bem-bom das rachadinhas, das emendinhas, das propinazinhas…
Falei, falei mesmo porque eu e todo mundo sabe que é verdade. Os deputados sérios, que fazem oposição, eles bem que se esforçam. Mas o resto não tá nem aí pra Amazônia, Pantanal, natureza, natureza, porcaria nenhuma! Agora, me diga aqui: e nós, o povo brasileiro, o povo do mundo, como é que nós pagamos a conta da destruição do meio ambiente que vocês estão fazendo? Ora, vá se catar!
Não corra não, deputado, me enfrente! O senhor não diz que é representante do povo? Meu nome? Não interessa meu nome. Pode ser João, Pedro, Manoel, o que for. O senhor sabe com quem está falando, deputado? Ah, ainda não sabe… É porque eu falei antes do senhor chegar, por isso eu vou repetir, abra bem as oiças que eu vou repetir bem alto:
– O senhor está falando com o povo brasileiro! Eu quero bem à natureza e por isso exijo respeito! Respeito! Porque respeito é bom e eu gosto, viu? Agora chega. Deixe eu trabalhar porque o movimento está aumentando e é hora de vender pente, caneca, carregador de celular pra esse povo, senão não tenho como botar o feijão na mesa. Por falar nisso, o senhor tá precisando de alguma coisa? Fique à vontade! Óleo de peroba? Não, isso eu não tenho aqui, vai ficar pra outra vez…
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