Apesar de ser um direito do cidadão ter acesso a todos os documentos produzidos ou custodiados pelo poder público, Câmara e Senado se recusam a fornecer cópias de trabalhos encomendados por parlamentares que apenas no ano passado custaram aos cofres públicos quase R$ 27 milhões.
Deputados e senadores têm à disposição a verba indenizatória, valores que variam de R$ 21 mil a R$ 45 mil por mês para o custeio de despesas exclusivas do mandato e dentre elas a contratação de consultorias e assessorias externas.
Apesar do órgão de consultoria legislativa existente em ambas as casas e que é formado por servidores concursados altamente capacitados para elaborarem estudos, notas técnicas, minutas de proposições e pareceres, relatórios e pronunciamentos parlamentares, entre outros trabalhos, deputados e senadores contratam empresas para fazerem o mesmo serviço.
Os documentos gerados por estas consultorias externas, porém, estão longe do alcance do cidadão que deseja obter cópias, direito garantido pela Constituição Federal. A prática adotada pelas casas é a de se eximirem do dever e para isso emitem a mesma mensagem (leia abaixo) a quem quiser saber o que o dinheiro público está pagando.
Na Câmara, de janeiro até a primeira quinzena de abril deste ano, 160 empresas que prestam serviços de consultoria, pesquisas e trabalhos técnicos foram contratadas por 166 deputados, o que gerou até o momento mais de R$ 2,55 milhões em gastos.
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Líder do gasto na Câmara
O líder dos gastos na atual legislatura com este tipo de despesa é o deputado Vicentinho Júnior (PR-TO), que já foi ressarcido em R$ 90 mil neste ano. Se somados aos pagamentos efetuados desde que entrou na Câmara, Vicentinho já direcionou quase R$ 1 milhão.
Questionado sobre os motivos de optar por contratar consultorias externas ao invés de recorrer aos consultores da casa ou mesmo de não ter entre seus 29 funcionários de gabinete alguém que pudesse fazer o serviço, o deputado preferiu não se pronunciar.Na legislatura passada o contribuinte pagou mais de R$ 86 milhões pelos serviços de consultoria, pesquisas e trabalhos técnicos.
Não é preciso fazer este gasto
A deputada Carla Zambelli (PSL-SP), caloura na casa, disse que não usa e não usará de sua verba indenizatória para contratar empresas para este fim por considerar desnecessário. Segundo a parlamentar, além de contar com os consultores legislativos da casa, há entidades que podem auxiliar na elaboração de estudos gratuitamente.No Senado
No Senado a música é tocada no mesmo tom que na Câmara. Em 2019, dos 81 senadores, 31 já contrataram 50 empresas para realizarem os serviços, o que gerou um gasto de R$ 585 mil. Apenas no ano passado o valor chegou bem perto dos R$ 5 milhões.
Obter cópias dos referidos documentos ou mesmo visualizá-los é impossível ao contribuinte que se interessar em conhecer o que seu dinheiro anda pagando no Senado.
Lavando as mãos
Negar acesso aos documentos é uma convergência nas duas principais casas legislativas do país, responsáveis por criar leis que elas mesmos criaram.
O cidadão que solicitar na Câmara, via Lei de Acesso à Informação, ao invés da cópia dos trabalhos receberá a seguinte mensagem:
“No tocante às despesas com a contratação de consultorias, trabalhos técnicos e pesquisas socioeconômicas (Ato da Mesa n. 43/2009, art. 2º, inc. XI), ressaltamos que a norma reguladora da Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar não exige da deputada, para efeito de reembolso, a apresentação de outros documentos, além daqueles que já se encontram publicados no sítio eletrônico desta Casa (Ato da Mesa n. 43/2009, art. 4º, § 3º)”.
Se o cidadão contestar a resposta e informar que o fornecimento das cópias está previsto em lei e que a Constituição Federal é soberana sobre normas internas da casa, a resposta é sempre essa:
“A esta Casa cabe fiscalizar os gastos apenas no que respeita à regularidade fiscal e contábil da documentação comprobatória da despesa, cabendo exclusivamente ao Deputado responsabilizar-se pela compatibilidade do objeto do gasto com a legislação, fato que o parlamentar atesta expressamente mediante declaração escrita. Ademais, o reembolso da despesa não implica manifestação da Casa quanto à observância pelos Parlamentares de normas eleitorais, nem quanto à tipicidade ou ilicitude. Por tais razões, o Diretor-Geral INDEFERIU o pedido de recurso formulado pelo Interessado.”
No Senado o texto é outro, mas a mensagem é a mesma.
“Advocacia do Senado Federal entendeu que caberia ao próprio parlamentar optar pela disponibilização total ou parcial das notas fiscais de seus gastos públicos à consulta pública, ou que deveria ser realizada mediante solicitação da autoridade que presidisse investigação que versa-se sobre má utilização dos recursos públicos, em procedimento formal de controle, no âmbito do processo regular fiscalizatório, com as garantias do devido processo legal.”
Ação Colaborativa
O Instituto OPS, entidade que fiscaliza gastos públicos como os da verba indenizatória, entrará com uma representação no Ministério Público Federal contra a Câmara e o Senado por entender que estas casas estão desrespeitando a Lei de Acesso à Informação e proporá a criação de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) para que estes documentos sejam disponibilizados ao público nos portais das duas casas, juntamente com as notas fiscais dos serviços.
A sociedade é convidada de honra para fazer parte desta representação. Como é de costume, a OPS convoca mais uma vez cidadãos a participarem ativamente desta representação e para isso basta que solicitem cópia de trabalhos de consultoria e ao receber a reposta, enviá-la para luciobig@institutoops.org.br.
O texto padrão de solicitação está logo abaixo, mas o cidadão poderá criar o seu próprio texto. Assista ao vídeo para saber como proceder.
Com base na Lei de Acesso à Informação, solicito cópia do material produzido pela empresa XXXXX, cuja despesa foi ressarcida ao parlamentar fulano de tal, em xxx de xxxx de 2019, no valor de R$ XXXX.
Observo que não se trata aqui de obedecer a uma regra interna da casa em não exigir cópia dos estudos técnicos. Trata-se do cumprimento de uma Lei Federal, um pedido de informação baseado na Lei de Acesso à Informação, que diz: “Todas as informações produzidas ou sob guarda do poder público são públicas e, portanto, acessíveis a todos os cidadãos, ressalvadas as informações pessoais e as hipóteses de sigilo legalmente estabelecidas”.
Sendo assim, por não se tratar de informações pessoais (cujo custo não poderia ser arcado pelo poder público) e nem se enquadra em “sigilo legalmente estabelecido”, e ainda, por se tratar de material produzido ao parlamentar cujo custo foi pago com dinheiro público, por óbvio trata-se de documento de interesse público e, portanto, passível de ser fornecido a quem desejar. Dessa forma, esta casa tem por obrigação legal fornecer tais informações, exigindo-as do parlamentar, se necessário, para que se faça o cumprimento da lei.
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Essa prática é realizada desde a criação da Lei!
As perguntas que não querem calar:
1 – Será que o Lúcio Big desconhecia que sempre foi assim?
2 – Por que só agora ele vem externar essa realidade na mídia?
3 – Por que ele faz referência apenas ao ano de 2019? Não teria interesse em divulgar um histórico de todos os deputados e senadores desde a criação da LAI em 2011?
Por que será que não são dados ao conhecimento público? Ou de outra forma: alguém duvida que este dinheiro retorna, depois dos impostos pagos (16,33% se todos forem pagos) ao parlamentar?