Há um dado perturbador na recente pesquisa do Instituto Quaest que mede a popularidade digital dos parlamentares. Além do fato de a pesquisa mostrar que os parlamentares de oposição dão de goleada nos deputados e senadores do governo no quesito popularidade nas redes sociais, a pesquisa manda um importante alerta sobre as estratégias adotadas. Aquela velha máxima do “fale mal, mas fale de mim” funciona à perfeição para os propagadores de ódio e fake news na internet.
No caso, a pesquisa avaliava a repercussão da absurda mise-em-scène do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) no Dia Internacional da Mulher, quando meteu uma peruca loira na cabeça e fez um discurso preconceituoso e transfóbico contra suas colegas Duda Salabert (PDT-MG) e Erika Hilton (Psol-SP), as duas mulheres trans eleitas para o Congresso Nacional.
Leia também
A pesquisa da Quaest mostra que mesmo criticar a atitude de Nikolas Ferreira acaba rendendo popularidade a ele. A estratégia de Nikolas, diz a Quaest, é justamente “criar polêmica” e ganhar visibilidade com isso. Assim, o resultado, segundo a pesquisa, é que o discurso de Nikolas Ferreira foi o assunto mais comentado nas redes sociais, ultrapassando o escândalo das joias sauditas dadas de presente ao ex-presidente Jair Bolsonaro, e a tentativa de fazê-las entrar no país como muamba.
O tema “Nikolas manda um recado para TODES (peruca)” 89,4 milhões de pessoas. O tema “Joias de Bolsonaro”, 78,2 milhões. Ou seja, se Nikolas queria desviar a atenção do tema das joias, conseguiu. Mas, principalmente, se queria “lacrar” com sua pantomima de peruca, conseguiu também.
A pesquisa foi feita antes da última polêmica envolvendo a “acusação” de “assédio” feita pela deputada Julia Zanatta (PL-SC) contra o deputado Márcio Jerry (PCdoB-MA). O episódio se deu na famosa reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na qual foi impossível se ouvir o ministro da Justiça, Flávio Dino, diante da brigalhada dos oposicionistas. Na ocasião, Zanata discutia com a deputada Lídice da Mata (PSB-BA) quando Jerry se aproximou por trás dela e disse alguma coisa no seu ouvido.
Oposicionistas publicaram duas fotos com recortes do episódio. Na primeira, Jerry chega por trás de Zanatta. Na segunda, ela se vira para ele. Com as duas fotos, montaram a acusação de assédio.
PublicidadeCom a utilização do vídeo completo, Jerry procurou mostrar que, na verdade, ele dissera a Zanatta: “Por favor, respeite a deputada que tem uma história no Congresso Nacional”. O primeiro mandato de deputada federal de Lídice foi em 1987. Ela já foi também senadora e prefeita de Salvador.
O dado preocupante mostrado pela Quaest, no entanto, com base no episódio de Nikolas, é que pouco pode importar, no caso, realmente esclarecer o que realmente houve. A postagem crítica acaba obtendo o mesmo propósito da postagem favorável de impulsionar o tema e levá-lo ao topo das interações.
Ou seja, nesse mundo virtual, verdade e mentira pode ser somente uma questão de escolha de quem lê. E, nessa linha, mais uma vez é preciso tirar o chapéu para as irmãs Wachowski (incrível! Elas mesmas mulheres trans!) e o que elas vislumbraram no filme Matrix em 1999, há 24 anos. No filme, as pessoas viviam o tempo todo em uma realidade virtual. A escolha entre se manter ou nesse mundo de mentira, no caso, se dava entre optar por uma pílula azul ou vermelha.
Nikolas Ferreira, Júlia Zanata e companhia limitada o tempo todo nos oferecem pílulas azuis ou vermelhas. Até quando nós iremos tomá-las?
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
Deixe um comentário