Há muito tempo não experimentamos uma comoção nacional como a que vivenciamos diante dos acontecimentos ocorridos em Santa Maria. A perda de centenas de vidas jovens em condições trágicas desencadearam tristeza, indignação e perplexidade em toda a população. Tudo já foi dito e uma solidariedade maciça transbordou nos quatro cantos do país. Guerras, crises e tragédias são momentos de aprendizado. A radicalização da vida realça fatos e traços que ficam submersos no cotidiano.
A tragédia de Santa Maria nos propicia um aprendizado importante sobre as diversas faces da ação do poder público e a ousadia e a coragem que são necessárias na ação do verdadeiro líder. Vários grandes estadistas já nos alertaram sobre a perversidade da demagogia, do populismo, da busca obsessiva da unanimidade, da preocupação excessiva com a popularidade. A busca excessiva e permanente de aprovação popular às vezes se torna o caminho mais curto para a mediocridade e o erro. O verdadeiro líder não toma só atitudes simpáticas, mas faz o que é necessário fazer.
É evidente que todo homem público se realiza na inauguração de um hospital, na entrega de casas populares, na abertura de uma nova estrada, na construção de uma escola. Esses são os momentos mais gratificantes da vida pública.
Há outros setores que só são valorizados quando o fornecimento do serviço público é interrompido. É o caso da energia elétrica, do fornecimento de água e da limpeza urbana.
No entanto, há determinadas políticas públicas que necessariamente são impopulares, criam atritos, afetam interesses específicos e, num primeiro momento, parecem antipáticas. São as ações de fiscalização, regulação, cobrança de impostos, exercício do poder de polícia do Estado. A convivência comunitária numa sociedade democrática pressupõe um pacto social que regula direitos e deveres, estabelecendo determinados limites às ações individuais. E ao governo cabe fazer cumprir o interesse coletivo e a observância das leis e das normas. Às vezes, com o sacrifício de alguns pontos nas pesquisas de popularidade.
Quando o Banco Central determina o aumento da taxa de juros para defender a moeda, quando a fiscalização tributária combate a sonegação, quando o Corpo de Bombeiro impede um “show”, quando uma prefeitura desobstrui as ruas de atividades ilegais, quando a vigilância sanitária interdita uma fábrica ou um restaurante, não é por maldade explícita, perversidade assumida ou sadismo escancarado. É na defesa de direitos e interesses coletivos. Muitas vezes, o interesse pontual contrariado põe a boca no trombone e nem sempre a sociedade compreende a ação do poder público.
Mas ao verdadeiro líder cabe ter a clareza e a coragem de, com habilidade e sabedoria, aplicar com rigor as leis e as normas democráticas. Fora disso, não há democracia.
Infelizmente, a consciência sobre a necessidade desse rigor só brota, muitas vezes, após tragédias que poderiam ser evitadas.
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