Prefeitos de algumas das mais populosas cidades brasileiras virão a Brasília na próxima quarta-feira (8) para fazer ao governo federal e ao Congresso Nacional um alerta: ou se encontram alternativas imediatas para financiar o transporte público ou o sistema de mobilidade urbana do país entrará em colapso. “Precisamos do apoio do governo para sair dessa crise, que é a maior que o setor já enfrentou nos últimos 30 anos”, afirma Edvaldo Nogueira, presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), entidade à frente da mobilização.
Os problemas decorrem da combinação de três fatores – a redução do número de passageiros causada pela pandemia de covid-19, os sucessivos aumentos do preço do diesel e a impossibilidade de repassar para a tarifa essa variação de custos ou as perdas ocorridas no faturamento das empresas de ônibus. “A tarifa já está cara para muitos brasileiros e isso inclusive levou várias pessoas a deixarem de andar de ônibus. Resolver a questão está além da capacidade dos municípios porque aumentar a passagem seria extremamente complicado na situação econômica atual do país e nenhuma prefeitura tem hoje como colocar subsídio na tarifa”, diz Edvaldo Nogueira (PDT), que no ano passado foi eleito pela terceira vez prefeito de Aracaju.
De acordo com a FNP, o diesel, que representa um quinto do custo total da passagem de ônibus, acumula neste ano uma elevação superior a 60%, enquanto a demanda por transporte público caiu em média 40% desde o início da pandemia. Conforme a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Rio de Janeiro, Porto Alegre, Goiânia, Manaus, João Pessoa, Natal e Maceió estão entre as capitais que registraram maior redução (veja os dados na tabela abaixo).
Demanda e oferta de transporte por ônibus durante a pandemia de covid-19
Cidade | Redução da demanda (%) | Redução da oferta (%) | Data da informação |
Aracaju | 45 | zero | Mai de 2021 |
Belém | 25 a 30 | 20 | Out de 2021 |
Belo Horizonte | 32 | 20 | Nov de 2021 |
Brasília | 45 | zero | Mar de 2021 |
Cuiabá | 40 | zero | Mar de 2021 |
Curitiba | 40 | 20 | Mar de 2021 |
Fortaleza | 36 | 17 | Set de 2021 |
Goiânia | 56,4 | zero | Set de 2021 |
João Pessoa | 50,4 | 15,5 | Abril de 2021 |
Maceió | 50 | zero | Dezde 2020 |
Manaus | 56 | zero | Fev de 2021 |
Natal | 60 | 30 | Mar de 2021 |
Porto Alegre | 56 | 49 | Nov de 2021 |
Recife | 40 | 20 | Ago de 2021 |
Rio de Janeiro | 50 | 20 | Mar de 2021 |
Salvador | 34 | 20 | Set de 2021 |
São Paulo | 32 | 14 | Set de 2021 |
Vitória | 20 a 25 | zero | Out de 2021 |
Fonte: Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU)
Houve uma tentativa de solucionar a questão por meio de um repasse federal no valor de R$ 4 bilhões. O Congresso aprovou projeto nesse sentido, mas ele foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro, em razão de problemas legais e de uma fragilidade reconhecida por Edvaldo. “Seria transferido dinheiro público diretamente para as empresas, o que realmente não é bom”, admite o presidente da FNP.
Em 21 de julho, os prefeitos levaram ao ministro da Economia, Paulo Guedes, uma proposta alternativa. O governo federal arcaria com a gratuidade garantida na tarifa para quem tem mais de 65 anos e para pessoas com deficiência, o que totalizaria uma despesa ao redor de R$ 5 bilhões. “Depois disso não conseguimos voltar a falar mais com o ministro Paulo Guedes, nem tivemos qualquer resposta do governo. Estamos tentando marcar uma nova audiência”, informou Edvaldo ao blog.
Levantamento da NTU indica que 51 empresas de transportes urbanos interromperam as atividades no país desde o início da pandemia. Cinco fecharam as portas definitivamente. As demais enquadram-se em uma das seguintes situações: estão em recuperação judicial, encontram-se sob intervenção ou tiveram seus contratos suspensos.
Quase metade da população urbana brasileira depende do transporte público para se locomover diariamente. Ou seja: a questão é, de fato, delicada. Se você já esqueceu, ou não tem idade suficiente para lembrar, vale observar que a elevação em vinte centavos da passagem de ônibus em São Paulo foi o estopim da série de protestos ocorridos no Brasil em junho de 2013. O tema é, portanto, explosivo.
Gastos com educação
A agenda dos prefeitos em Brasília também inclui o lobby pela aprovação da PEC 13/2021, já aprovada pelo Senado e à espera de aprovação na Câmara. A proposta altera a Constituição Federal para desobrigar os prefeitos, nos anos de 2020 e 2021, de cumprir a exigência constitucional de destinar à área de educação pelo menos 25% da receita do município.
“Com a pandemia, as escolas fecharam e os gastos com ensino caíram”, explica Edvaldo Nogueira. “Custos de limpeza e manutenção diminuíram, houve queda do consumo de água e luz, gastou-se menos com funcionários terceirizados, e assim por diante. O que a PEC faz é permitir que as despesas previstas para 2020 e 2021 sejam feitas até 2023, até para evitar que a prefeitura gaste dinheiro com aquilo que não precisa apenas para cumprir o percentual de 25%”.
Trata-se de tema vital para os prefeitos porque o descumprimento da regra dos 25% os torna inelegíveis, além de os sujeitarem a ações de improbidade administrativa ou mesmo a processos criminais.
Para tratar do assunto, e também do risco de colapso no transporte público, a FNP tem audiências marcadas com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).(Com Cynthia Araújo)
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