Priscila Delgado de Carvalho*
Mulheres, evangélicos e agronegócio já eram atores coletivos esperados para a campanha eleitoral de 2022. Indígenas e sem terra ganharam visibilidade ao longo do pleito, nos debates sobre reforma agrária e meio ambiente, e também ao eleger candidatos próprios. Resultados do primeiro turno acabaram por evidenciar os grupos armamentistas, que em 2022 articulam estratégias de apoio a candidatos de peso com mobilizações de rua e angariaram visibilidade na imprensa.
Grupos armamentistas são conhecidos pelo lobby em defesa da flexibilização da política de armas. Apresentar demandas diretamente aos parlamentares é uma das principais atividades de grupos de pressão que se organizam para defender seus interesses. Em geral, a estratégia de contato direto é usada por quem tem maior poder econômico, que se traduz em acesso mais direto a parlamentares via relações pessoais ou assessorias contratadas.
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Desde 2018, grupos pró-armas ganharam visibilidade com a facilitação do acesso a armas para caçadores, atiradores e colecionadores (CACs) e pelo expressivo apoio da família Bolsonaro, mas em 2022 foram além dessa conexão.
Uma das atividades, em 2022, foi a divulgação de uma lista de candidaturas alinhadas com a agenda armamentista pela principal associação da área, a Proarmas. A lista – que não está mais no ar – chegou a 88 nomes, incluindo mais de trinta deputados estaduais e federais, dez senadores e seis governadores – estes últimos, todos do PL. Havia ali tanto candidatos diretamente ligados às organizações pró-armas, como outros sabidamente apoiadores de suas plataformas. O sucesso eleitoral de pessoas apoiadas pelo movimento, mas não diretamente associadas a ele, acabou sendo divulgado como vitória dos armamentistas – ao que parece, então, a estratégia da lista deu certo para gerar visibilidade sobre o tema na imprensa.
A estratégia de campanha gerou também resultados eleitorais diretos. Marcos Pollon, fundador do Proarmas e candidato pelo PL, foi eleito o deputado federal mais votado em Mato Grosso do Sul. Da lista, foram eleitos ainda sete senadores, 16 deputados federais e dez deputados estaduais. Cinco candidatos disputam o segundo turno, segundo levantamento da Folha de S. Paulo, que menciona também o financiamento às campanhas por proprietários de clubes de tiros e lojas de armas. Até aqui, foram três estratégias: candidatos diretos, visibilidade a apoiadores da causa e do próprio movimento e financiamento de campanhas.
PublicidadeHá uma quarta: o Proarmas, de Pollon, também foi às ruas, defendendo uso de armas sob o enquadramento da liberdade. Em julho, o III Encontro Proarmas reuniu centenas de apoiadores em Frente à Catedral de Brasília para uma manifestação, com carro de som e uma performance, difundindo seu enquadramento de que a defesa das armas é defesa da liberdade. Ativistas posicionaram-se a distâncias idênticas, formando quadrados no gramado da Esplanada, em frente a uma bandeira verde-amarela. Dois meses depois, nas comemorações do 7 de setembro, integraram ato pró-Bolsonaro na Esplanada dos Ministérios.
A mobilização de apoiadores no espaço público, para dar visibilidade à sua agenda e mostrar que tem apoio numérico relevante, é a principal estratégia de movimentos sociais, desde o século 19. O uso dessas estratégias por organizações e associações da direita e extrema-direita cresceu no Brasil a partir de 2013, alterando a configuração da sociedade civil no Brasil, com a chegada de temas antes inexistentes ou, pelo menos, pouco visíveis.
A eleição de candidatos simpáticos à flexibilização da legislação sobre porte e uso de armas não é novidade. A bancada da segurança pública – também conhecida como bancada da bala – cresceu paulatinamente no Congresso: de 210 deputados em 2011, para 306 na legislatura 2019-2023. A expectativa é que, em 2023, siga crescendo: o número de policiais e militares eleitos na Câmara aumentou 35,7% em 2022, segundo levantamento da CNN: dez candidaturas além das 28 do pleito anterior, a maioria do PL.
O empenho de ativistas armamentistas para chegar diretamente a cargos representativos dá pistas de como buscarão seguir influenciando a política institucional. A julgar pelos apoios entre políticos eleitos e em setores da sociedade, pode-se esperar que a agenda armamentista continue visível nos próximos anos.
* Priscila Delgado de Carvalho é pós-doutoranda no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (Inova Juntos). Pesquisadora do INCT IDDC. Investiga a atuação de atores coletivos em processos democráticos, com ênfase na transnacionalização de movimentos sociais e sindicatos rurais e percepções de cidadãos sobre autoritarismo e democracia. Doutora em Ciência Política pela UFMG.
Esse artigo foi elaborado no âmbito do projeto Observatório das Eleições 2022, uma iniciativa do Instituto da Democracia e Democratização da Comunicação. Sediado na UFMG, conta com a participação de grupos de pesquisa de várias universidades brasileiras. Para mais informações, ver: www.observatoriodaseleicoes.com.br.
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