por Patricia Mota Guedes*
Em dezembro, o país assistiu à divulgação dos resultados do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), que oferece informações sobre o desempenho dos estudantes de 15 anos em 81 países. Os resultados trazem um retrato, ainda que parcial, das lacunas do ensino fundamental no Brasil. Seus desdobramentos nos convidam a refletir sobre a forma como o debate público em torno de avaliações precisa ocorrer em 2024. E reforçam o senso de urgência em torno das inovações possíveis e necessárias para nosso Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica).
Ao longo de suas edições, o Pisa vem se tornando cada vez mais útil para análises que vão além de rankings ou médias de pontuação em leitura e matemática. Oferece evidências a partir do cruzamento de dados de desempenho, como os de matemática, e aspectos fundamentais da experiência dos adolescentes – como a relação entre escola e família, crenças sobre a capacidade de aprender, vínculo com professores, segurança dentro e fora do ambiente escolar, pertencimento e engajamento. Assim, os resultados podem ser aliados essenciais na defesa por melhores condições de ensino e aprendizagem, inclusive por aquelas consideradas menos prioritárias nas tomadas de decisão.
Ainda no campo das inovações, o Pisa não se limita à leitura e matemática – no ano que vem, por exemplo, serão divulgados resultados sobre pensamento criativo. A lente da equidade também tem ganhado mais força em cada edição.
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Participaram do Saeb 2023, de forma censitária, estudantes do 5º e 9º anos do ensino fundamental e do 3º ano do Ensino Médio, e, de maneira amostral, estudantes do 2º ano do fundamental. Foram avaliados conhecimentos em língua portuguesa e matemática, e, para os alunos do 5º e 9º ano, ciências humanas e ciências da natureza, também de forma amostral. Mesmo que os resultados só sejam disponibilizados em 2024, ano que marca ainda a disputa nas eleições municipais, é mais do que propício nos prepararmos para um debate mais aprofundado não só sobre os resultados, mas sobre as revisões e melhorias que tanto o Saeb quanto o Ideb precisam.
O Saeb é um conjunto de avaliações que, desde 2007, permite ao Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) realizar um diagnóstico da educação básica brasileira e de fatores que podem interferir no desempenho do estudante ao longo de sua trajetória. No decorrer de quase duas décadas, tivemos um indicativo da qualidade do ensino brasileiro, com série histórica e subsídios para a elaboração, o monitoramento e o aprimoramento de políticas educacionais.
Mesmo com os aperfeiçoamentos teórico-metodológicos ao longo dos anos, o Saeb precisa de revisões mais robustas. Em suas últimas edições foram utilizadas, principalmente, matrizes de referência – documentos que orientam o que precisa ser avaliado – sem o devido alinhamento à BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Além de passar a contar com as aprendizagens de um Saeb alinhado à BNCC, no caso do Ideb, e revisão de indicadores, há o desafio de se considerar, por exemplo, as crianças e jovens fora da escola, e ilustrar melhor as desigualdades relacionadas à condição socioeconômica dos estudantes, sua cor/raça, localização, gênero, entre outras.
Cientes da necessidade de inovação, o MEC (Ministério da Educação) e o Inep realizaram em novembro o Seminário Internacional de Avaliação da Educação Básica, em Brasília. O evento reuniu lideranças do poder público, entidades representativas e especialistas para debater sobre inovações necessárias nas avaliações externas, inaugurando, assim, as reflexões sobre a revisão do Saeb. Já é um marco baseado em temas e experiências internacionais sobre modelos de itens, tipos de testes e oportunidades de atualização de provas que poderão nortear as novidades nas nossas avaliações em larga escala. Há ainda a expectativa de que as mudanças ajudem a identificar melhor quais alunos e regiões precisam de apoio adicional, com recursos e políticas específicas.
Sobre essa questão, uma das mais expressivas inovações diz respeito ao VAAR (Valor Aluno Ano Resultado), um dos três critérios de distribuição previstos no novo Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica). A partir de julho de 2023, uma resolução fixou as metodologias das condicionalidades de melhoria de gestão e dos indicadores para fins de distribuição da complementação VAAR. Para isso, as redes de ensino devem cumprir alguns requisitos perante o MEC. Um deles é garantir a participação de pelo menos 80% dos alunos no Saeb e apresentar melhorias na redução das desigualdades educacionais em relação ao sistema de avaliação realizado em 2019. Isso demonstra a importância das provas realizadas nesta edição: os resultados de 2023 serão utilizados para cálculo dos indicadores do VAAR dos anos de 2024 e 2025.
As avaliações cumprem sua missão quando podem fazer parte de mais debates e desenhos de políticas públicas e programas. Seu propósito precisa estar na garantia do direito à educação. Seu potencial se realiza quando ajudam a informar decisões que desenvolvam e mantenham os estudantes na escola, com aprendizado adequado na idade certa. Assim, ganham também os processos de avaliação das políticas nacionais em andamento, como a Escola em Tempo Integral, e também daquelas cujo desenho apenas começou, como a Política para os Anos Finais do Fundamental, por uma escola das adolescências. Nesse sentido, 2024 pode ser um divisor de águas, inaugurando uma nova geração de avaliações, cada vez mais a serviço da garantia do direito à educação para milhões de crianças e adolescentes.
* Patricia Mota Guedes é superintendente do Itaú Social, graduada em Ciências Políticas pela Universidade do Arizona do Norte, mestre em Administração Pública pela Universidade de Massachusetts Amherst e em Políticas Públicas pela Universidade de Princeton, nos Estados Unidos.
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