A pandemia trouxe uma série de transformações para as relações sociais. Algumas foram superadas ao final da excepcionalidade, outras permaneceram. A degradação das práticas no trânsito, infelizmente, é uma dessas permanências que inova negativamente a paisagem brasiliense.
Tenho mais de 20 anos de Brasília e era muito raro ver certos comportamentos no trânsito. Hoje motoristas abandonaram o uso de rotatórias e fazem o “retorno” no meio das ruas do comércio. Outros sentem-se muito à vontade para subirem com seus carros em calçadas, estacionarem na grama ou mesmo circular com veículos pesados por ciclovias e áreas destinadas a pedestres. Furar semáforo talvez tenha se tornado um hobby coletivo, tantos o praticam.
Os motociclistas, um bom número deles, entendem hoje qualquer superfície plana como apta a aceitar seus percursos. Entregadores sobem em calçadas, ciclovias, estacionam onde bem entendem. Tanto motos quanto carros desinibiram-se de andar na contramão.
Acredito que a causa disso foi a pandemia. Por um lado, as ruas vazias proporcionaram a sensação de liberdade aos motoristas, e, aparentemente, abusou-se dela para dirigir como cada um bem entende-se. Por outro, o mundo delivery exigiu uma profusão de entregadores, e a cobrança de prazos foi a isca perfeita para que cada um inventasse atalhos onde bem entendesse a fim de economizar segundos.
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O fato é que hoje Brasília assiste a um número de transgressões legais e falta de respeito com a coletividade que assusta. A atávica propensão do brasileiro por não cumprir regras, sentir-se acima delas, encontrou o estado de natureza do trânsito pandêmico e ambos parecem ter se dado muito bem.
Brasília já foi exemplo de educação no trânsito quando conseguiu criar a cultura de respeito ao pedestre e o uso das faixas. Na época, muito se fez em termos de educação no trânsito, muitas campanhas. Desde então, o que eu tenho na memória é apenas um acirramento dos controles eletrônicos por meio de radares, mas nenhuma campanha de conscientização.
Acredito que não temos uma horda de bárbaros com comportamentos irreversíveis no trânsito. Como bem provou o sucesso passado com as faixas de pedestre, precisamos sim lembrar a cada pessoa que eles são cidadãos e tanto precisam cumprir as regras quanto se beneficiam de seu cumprimento. A velha ideia de que eu posso “dar um jeitinho” e “me dar bem” é a fórmula para o mal-estar geral. Brasília precisa urgentemente de campanhas de educação no trânsito. Que fique o apelo ao governo do DF.
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