O presidente Jair Bolsonaro seguidamente transita de motocicleta sem capacete. Nessas ocasiões, muitas vezes é inclusive escoltado pela Polícia Rodoviária Federal, que faz vista grossa a essa que é considerada pelo Código de Trânsito uma infração gravíssima sujeita, inclusive, à perda da Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
Genivaldo de Jesus Santos era um homem preto e pobre. Andava de motocicleta sem capacete na cidade de Umbaúba (SE). Foi abordado por agentes da Polícia Rodoviária Federal, que o trancaram em um camburão e ali dentro jogaram bombas de gás lacrimogêneo. Genivaldo tinha 38 anos. Deixa mulher e dois filhos.
O presidente Jair Bolsonaro participou de uma motociata na sexta-feira em Goiânia. Ele estava de capacete. Mas na sua garupa estava o deputado Vitor Hugo (PL-GO), sem o equipamento de proteção. Não houve punição pela infração.
Há um nome para esse tipo de atitude que discrimina as pessoas pobres e as trata com violência desmedida e covardia: aparofobia. O termo une duas palavras gregas: aparos (pobre) e fobia (ódio ou rejeição). Ou seja, aparobia é a aversão a pobre. Se tivesse sido aprovado um projeto de autoria do deputado Fábio Trad (PSD-MS), o assassinato de Genivaldo praticado pelos policiais rodoviários implicaria uma pena de 12 a 30 anos de prisão.
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O projeto de Fábio Trad inclui no Código Penal como agravante, como qualificante (algo que qualifica o crime) o ódio às pessoas pobres, a aparafobia. O deputado propõe incluir no Código artigos com essa característica a aparofobia como qualificante nos casos de homicídio (art. 121), ofensa à integridade corporal ou à saúde (art. 129) e injúria racial (art. 140).
No caso de homicídio, por exemplo, a qualificação de que houve aparofobia dobra a pena. De seis a 20 anos, a pena passaria para 12 a 30 anos. “Equivaleria a um crime por motivo torpe, fútil”, explica Fábio Trad.
Diante do hediondo crime cometido contra Genivaldo e outras situações semelhantes que vêm ocorrendo, Trad resolveu fazer novamente andar seu projeto. Ele se encontra parado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Após a morte de Genivaldo, o padre Julio Lancelotti, pároco da paróquia de São Miguel Arcanjo, no bairro da Mooca, em São Paulo, que atua na assistência da população carente, mencionou o projeto e entrou em contato com Trad. Após isso, iniciou-se o processo para agora acelerar a sua aprovação. O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) aceitou tornar-se relator. E, na segunda-feira (30), ele já conversará com o presidente da CCJ, Arthur Maia (DEM-BA), para que se dê urgência ao projeto.
“Realidade nefasta e ignóbil”
Fábio Trad apresentou o projeto depois de conhecer o trabalho da filósofa espanhola Adela Cortina, professora de Ética e Filosofia Política da Universidade de Valência. Adela cunhou o termo aparofobia em 2017. Naquele ano, ele foi escolhido a palavra do ano pela Fundação Espanhola Urgente. “A palavra nos parece estranha, seja ortográfica, seja foneticamente, mas tem a proeza de nomear uma realidade nefasta e ignóbil”, avalia Trad.
No caso, fazer com que ela passe a constar do Código Penal dará visibilidade para um tipo de mazela infelizmente comum nas favelas e bairros de periferia das cidades brasileiras. “A legislação já busca combater mais gravemente crimes que ocorrem por preconceito de raça ou de gênero. Mas o preconceito pela condição social, pela pobreza, é uma lacuna que não pode permanecer sem ser preenchida”, considera o deputado.
“Há diariamente todo um processo ignóbil de ‘limpeza social’, como eles dizem, que não pode ser tolerado. São moradores de rua que são mortos, pessoas que são presas injustamente, que sofrem violência, que são agredidas”.
O terrível caso de Genivaldo, com a gritante diferença de tratamento dado a ele em comparação ao tratamento dado ao presidente da República, traz ao projeto atualidade e urgência, avalia o deputado. “Trabalharemos agora para que ele seja aprovado”.
Veja abaixo o projeto de Fábio Trad:
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