Márlon Reis e Bruno Magrani *
A Câmara dos Deputados acaba de aprovar, em prazo recorde, projeto de lei (PL 4470) que inibe o acesso de novas legendas partidárias ao fundo partidário e, com maior impacto, ao tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão.
O projeto, cuja constitucionalidade é posta em dúvida pelo evidente casuísmo, mostra como o Congresso pode ser hábil na formação de maiorias sempre que o tema envolve a preservação de privilégios. Essa velocidade contrasta com a letargia do Parlamento na realização da inadiável reforma política.
Mas essa medida adotada pela Câmara abre ensejo para um importante debate, ainda não devidamente enfrentado: a liberdade de expressão na rede mundial de computadores.
O número de usuários da internet no Brasil impressiona. Nosso país é o terceiro no mundo nesse quesito. E ocupa a primeira colocação quando se considera a quantidade de horas de acesso diário por internauta. Esses dados, recentemente divulgados pelo Ibope, mostram o tamanho do potencial desperdiçado pelos políticos no acesso à sociedade conectada.
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Dois fatores inibem o fluxo do debate político na internet: o preconceito e a inadequação dos marcos legais. De fato, a comunidade política reluta em compreender a importância da abertura do diálogo político nos sites, blogs e redes sociais. Há um temor de que essa liberdade sirva para colocar em xeque práticas que hoje favorecem o alcance e a permanência no poder. Calcada nesse preconceito, a legislação brasileira segue contaminada por sérias limitações.
Confundindo internet com televisão e rádio, a legislação impede que os usuários da web se manifestem publicamente sobre eventuais candidaturas. E essa proibição se estende até aos líderes que poderiam fazer uso desse meio para estreitar o vínculo com seus simpatizantes. Ficou célebre o caso do político carioca multado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) após anunciar no Twitter que acabava de ser convidado a integrar chapa que disputaria as eleições presidenciais.
A rede é plural e descentralizada, e regras como a suspensão de sites inteiros que contenham material publicado por usuários não melhora o debate político, mas o restringe. Da mesma forma, não faz sentido falarmos em direito de resposta na rede, pois a própria arquitetura da internet já assegura esse direito a todos. A liberdade de expressão deve ser assegurada com mais liberdade e não com menos espaços para expressão. Tratar a internet como se trata rádio e TV é visão equivocada e nada contemporânea.
É preciso reabrir a discussão sobre os marcos legais que definem a amplitude do debate político na internet e ampliar tanto quanto possível a voz do indivíduo na rede. Em lugar disso, temos testemunhado a exclusiva dedicação dos parlamentares ao tema da regulação do uso das mídias convencionais. É hora de captar o momento e rever a legislação restritiva que limita e dificulta o debate político na rede mundial de computadores.
* O colunista do Congresso em Foco Márlon Reis, juiz de direito e um dos fundadores do movimento de combate à corrupção eleitoral que levou à aprovação da Lei da Ficha Limpa, escreveu este texto em conjunto com Bruno Magrani, mestre por Harvard e professor do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV-Rio.
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