Acredito que a maioria da nação está indignada com as revelações do escândalo que envolve a Petrobras, a chamada 7ª fase da Operação Lava Jato, durante a qual a Polícia Federal colocou na cadeia cerca de 20 pessoas, entre executivos da estatal e de empresas que mantinham contrato com ela. Essa é uma daquelas situações que me levam a abrir uma exceção e falar de tema diverso do habitual dos meus artigos – concursos público –, tal a gravidade e a repercussão dos fatos revelados diariamente pelas investigações. A Petrobras é um patrimônio nacional que está sendo desmoralizado pela corrupção que assola o Brasil!
Quando digo que ainda acredito na indignação dos brasileiros em relação a esse caso é porque às vezes me parece que o país está anestesiado diante de tanta falcatrua e do comportamento irresponsável do governo ao lidar com a situação, principalmente depois da reeleição da presidente da República. Apesar de tudo o que foi denunciado durante a campanha eleitoral sobre a corrupção na Petrobras, Dilma venceu, é verdade. Mas a reeleição não é um cheque em branco para isentá-la de responsabilidade pelo que aconteceu na (péssima) administração da nossa empresa estatal do petróleo. A presidente tem de dar satisfação à sociedade pelo que aconteceu, sobretudo por ter deixado as coisas chegarem até onde chegaram.
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Aliás, algo que me intriga é como tantos executivos se envolviam em roubalheiras com políticos sem que a presidente da estatal sequer desconfiasse que alguma coisa errada ocorria na empresa. Para piorar, mesmo depois que tudo veio à tona, ela permanece no cargo, como se nada tivesse acontecido! A exemplo de Lula e Dilma, Graça Foster também não sabia de nada! Se é esse o quadro, na minha opinião, qualquer medida administrativa para sanear a empresa tem de passar pela demissão da administradora.
Outro aspecto que me preocupa é a inércia de instituições que, no passado, foram às ruas e ao Congresso Nacional, para pedir, por exemplo, o impeachment do então presidente da República Fernando Collor de Mello. Refiro-me à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), à Associação Brasileira de Imprensa (ABI), aos sindicatos e às entidades estudantis, entre outras, que não se manifestaram em nenhum momento no julgamento do mensalão e também se fingem de mortas agora, quando o escândalo da Petrobras a cada dia mostra mais facetas da corrupção que assola o país, como uma epidemia para a qual não existe nem remédio nem vacina.
Por falar em reeleição, não me parece coincidência que esta “7ª fase” da Operação Lava Jato só tenha vindo a público agora, e não durante a disputa eleitoral. Tenho certeza de que houve algum tipo de interferência ou pressão do governo nesse sentido. O que agora está sendo revelado, como o envolvimento de empreiteiras no pagamento de suborno a diretores da Petrobras, é de uma gravidade estarrecedora. E os valores, não menos: R$ 59 bilhões, segundo a imprensa, uma quantia inimaginável e que não pode ter sido surrupiada sem que houvesse conivência do próprio governo federal.
O que me intriga é justamente isto: como foi possível tamanha fraude sem que ninguém no Planalto percebesse, sem que o Ministério de Minas e Energia desconfiasse, sem que a Abin pelo menos tivesse sido alertada para o que vinha ocorrendo. Estamos falando de um verdadeiro conluio para roubar dinheiro da estatal, mediante, por exemplo, o pagamento de R$ 139 milhões a mais, como aditivo de um contrato da Refinaria Abreu Lima encerrado cinco anos antes. Ninguém notou nada de errado nisso, e a vida seguiu normalmente, até o propinoduto estourar e começarem as “delações premiadas”, em que cada envolvido vai contando o que sabe, em troca de uma pena mais suave quando chegar a hora do banco dos réus.
O escândalo toma proporções incontroláveis agora, com a prisão de dirigentes e executivos das maiores empreiteiras do país. Alguns querem até devolver o dinheiro que embolsaram, uma bagatela de mais de R$ 400 milhões, segundo as informações que vêm sendo divulgadas pela imprensa. De minha parte, já firmei uma opinião: só com a conivência do mais alto escalão do Executivo é possível que empresários e funcionários do governo tenham praticado tais crimes por tanto tempo.
Já na primeira fase da Operação Lava Jato, cujas “estrelas” eram o o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Rousseff, estava óbvio que muito mais gente poderia estar envolvida, como agora se confirma. Entretanto, tudo foi colocado em banho-maria para não dar mais munição ao presidenciável da oposição, Aécio Neves, na luta eleitoral contra a presidente Dilma. Agora, a situação ficou tão séria que ela teve de falar sobre o caso até durante a última viagem que fez ao exterior. Todavia, como sempre, a presidente procurou se desvincular de qualquer responsabilidade, afirmando que o escândalo só veio a público porque o governo manda a Polícia Federal investigar.
Não é bem assim. O escândalo estourou porque o governo não conseguiu impedir o vazamento das investigações. Não se pode esquecer que todos os ex-diretores e funcionários envolvidos no propinoduto foram escolhidos pelo governo e estavam nos cargos a seu serviço. Desviar dinheiro para partidos políticos e se associar a grandes empreiteiras para a mesma finalidade são práticas recorrentes, que continuaram a ocorrer mesmo depois da condenação dos responsáveis pelo Mensalão por condutas similares.
Os crimes praticados pelos ex-integrantes da diretoria da Petrobras, presos durante a Operação Lava Jato, são de extrema gravidade. E os valores impressionam. Mesmo que alguém seja beneficiado pela delação premiada, espero que não escape de alguns anos de cadeia, já que os acusados praticaram, entre outros delitos, crimes de peculato, corrupção ativa e passiva, apropriação indébita e até mesmo formação de quadrilha. Não é exagero, basta consultar o Código Penal.
Por exemplo: o artigo 312 de nossa legislação penal descreve o crime de peculato: “Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio”. A pena prevista é de reclusão, de 2 a 12 anos, e multa.
É bom esclarecer: embora quem trabalha na Petrobras não seja servidor público, por se tratar de empresa estatal – uma sociedade de economia mista –, a regra do artigo 312 se aplica por força do artigo 327 e seus parágrafos, que consideram “funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública”.
Nos termos do parágrafo 1º, “equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública”. O parágrafo 2º determina que a “pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público”.
Existem ainda as figuras do peculato culposo, “se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem”, cuja pena é a detenção, de 3 meses a 1 ano; e do peculato mediante erro de outrem, tipificado no artigo 313: “Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem”. A pena é de reclusão, de 1 a 4 anos, além de multa.
No artigo 315, encontramos outro crime típico de servidor público que, em razão da mesma regra do artigo 327, pode ser aplicado aos envolvidos da Petrobras na Operação Lava Jato. Trata-se de dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei, o que pode resultar em detenção, de 1 a 3 meses, ou multa. Já o artigo 316 trata do crime de concussão, que é “exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida”. A pena é de reclusão, que vai de 2 a 8 anos, e multa.
Tem mais. Sem dúvida, os ex-dirigentes da Petrobras implicados na Operação Lava Jato praticaram, ainda, o delito de corrupção passiva. Está no artigo 317 do Código Penal: “Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem. Pena: reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.”
O crime de advocacia administrativa, capitulado no artigo 321, é outro que pode render mais alguns anos de cadeia à turma da Petrobras: “Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário”. Pela prática eles podem ser condenados a detenção de 1 a 3 meses, ou multa. Porém, se o interesse for ilegítimo, a punição pode ser maior: detenção, de 3 meses a 1 ano, além de multa.
O caso da Petrobras se torna ainda mais dramático porque há suspeita de que tais crimes podem estar ocorrendo em outras áreas da administração, como o setor elétrico. Este seria o próximo alvo da Polícia Federal, segundo especulações que já circulam nos bastidores da investigação da Petrobras. Não se trata de teoria da conspiração. Apenas, assim como Dom Quixote, eu não creio em bruxas, mas que elas existem, existem.
E ainda há nessa história do ‘”petrolão” o cometimento de improbidade administrativa – perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a contratação de serviços pela empresa estatal por preço superior ao valor de mercado. Essa conduta acarretará para os agentes públicos envolvidos e particulares a perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos. É A MAIS GRAVE das improbidades administrativas. Vamos torcer para que isso aconteça.
Não posso concluir nossa conversa semanal sem deixar uma mensagem de estímulo aos concurseiros e concurseiras, meus parceiros queridos no dia a dia de trabalho. Peço que não se deixem vencer pelo desânimo diante de eventuais dificuldades ou pela revolta contra essas falcatruas que assolam a nossa administração pública. Mantenham o foco, empenhem-se na aprovação, e, quando alcançarem o seu grande objetivo, tornem-se não apenas servidores públicos, mas baluartes da moralidade no seu setor de trabalho. Façam, assim, jus, com todo orgulho, ao seu feliz cargo novo.
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