Cândido Vaccarezza *
A reforma política voltará ao plenário da Câmara em maio e, justamente por não alterar o processo eleitoral em curso, tem boa chance de ser aprovada. Se promulgada pelo Congresso, será submetida a referendo no final de outubro. As mudanças propostas aperfeiçoam o sistema político, barateiam as campanhas e aproximam os eleitos dos eleitores, mas não será a panacéia para a crise da representação que atinge todas as democracias ao redor do planeta.
Cresce a convicção de que a democracia precisa ser reinventada para dar respostas a demandas cada vez mais complexas num mundo de recursos muito limitados. Para piorar, a frustração das necessidades leva ao descrédito das instituições.
A genialidade humana foi capaz de levar engenhocas para fora do sistema solar e colocar o mundo na ponta dos nossos dedos, mas foi incompetente para organizar as preferências individuais em interesses de toda a sociedade, transformando a disputa em cooperação e a capacidade individual em eficiência coletiva. Tudo isso preservando a liberdade e a igualdade de condições.
Se a tecnologia avançou muito mais que as organizações humanas, talvez ela deva nos oferecer os instrumentos que buscamos para aperfeiçoar as instituições e os processos políticos. Internet, redes sociais e outros aplicativos abrem possibilidades renovadoras para a vida de todas as pessoas. Resta treinar as mentes e corações para usá-las no sentido da verdadeira transformação.
A impaciência dos jovens e o descrédito dos velhos clamam por mudanças na condução da coisa pública, mas são incapazes de levá-los a uma simples reunião de condomínio. Querem maior participação nas decisões, eliminar os intermediários, mas têm dificuldades para se organizar coletivamente de forma consistente.
Não é que não se mobilizem, mas o engajamento precisa superar a visão do curto prazo, o interesse particular ou a percepção da superfície. Ir a fundo e perceber o todo exigem muito mais dedicação.
Acuada, a democracia representativa cada vez mais se submete às pressões dos interesses de curto prazo. Isso tende a se agravar num modelo de democracia direta quando os debates são menos mediados, pouco profundos e mais afeitos a teses da moda, que expressam demandas não contextualizadas na diversidade social e na amplitude do longo prazo.
A proposta em discussão na Câmara minimiza as distorções do atual sistema. Ela restringe as circunscrições eleitorais, aproximando eleitos dos eleitores e reduzindo custos de campanha, sem acabar com o sistema proporcional; torna as coligações permanentes; cria cláusula de barreira para acesso a fundo partidário e tempo de TV; acaba com voto obrigatório; e estabelece regras mais rígidas de financiamento.
É preciso dizer, no entanto, que transformar o modo de fazer política não vai acontecer apenas mudando as instituições, mas também a cultura de participação dos indivíduos. Um dos desafios para a nova democracia é justamente combinar democracia representativa com instrumentos de democracia direta, que resulte em decisões políticas cada vez mais influenciadas pela cidadania ativa.
* Deputado federal pelo PT-SP, foi o coordenador do Grupo de Trabalho da Reforma Política na Câmara.
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