O apoio do chamado centrão à candidatura do tucano Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência da República não foi bem visto pelo eleitor que interage nas redes sociais. Sobrou até para Ciro Gomes (veja infográfico e leia mais abaixo), presidenciável do PDT que também andou conversando com o bloco de partidos que, a partir de 2015, sustentou o mandato e as ações do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), cassado, condenado e preso em decorrência da Operação Lava Jato. A repercussão negativa do apoio do centrão consta de estudo produzido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), por meio de sua Diretoria de Análise de Políticas Públicas.
Segundo a análise, que monitorou postagens no Twitter, o anúncio do apoio do centrão ao tucano gerou mais de 36 mil menções entre entre as 17h da última quinta-feira (19) e as 17h de sexta (20) – aumento de 715% quando os novos registros são comparados com as 24 horas anteriores (cerca de 4,4 mil referências). Segundo a FGV, dois picos de menção foram registrados no período analisado.
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E foi justamente quando o exame passou do mero registro do volume de menções à natureza delas que se pôde constatar o caráter negativo da repercussão. No primeiro pico de referências em postagens, instantes depois de publicadas as primeiras notícias sobre a aliança, percebeu-se que o viés das mensagens era essencialmente negativo.
“Ainda que as notícias mais compartilhadas apontassem a conquista de maior espaço para Alckmin no horário eleitoral, o que fortaleceria sua campanha, o presidenciável foi criticado por ter cedido a demandas, como a que envolve a busca de uma saída para o problema do financiamento dos sindicatos, devido ao fim da cobrança obrigatória do imposto sindical. Tal compromisso atenderia a demanda do deputado federal Paulinho da Força (SD). A exigência, no entanto, foi percebida como uma aproximação de Alckmin a uma pauta mais à esquerda – argumento potencializado pelas notícias de um possível estreitamento de laços com o MST”, diz trecho da análise.
Outra conclusão foi que o apoio do bloco partidário foi visto como uma sinalização de que Alckmin é um candidato que, caso seja eleito, manterá as estruturas de poder. “Tal abordagem permanece entre as referências registradas no segundo pico de menções, ainda que com menor intensidade. Também são recorrentes as críticas ao tucano por se associar a um grupo político que é visto por alguns usuários como base de sustentação de escândalos de corrupção em governos anteriores”, completa o material, com referência ao fato de que o centrão, em sua versão eleitoral formado por DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade, ter diversos membros investigados na Lava Jato e outras investigações.
Fator Ciro
O transcorrer do período analisado mostrou que a crítica inicial ao tucano passou a ceder espaço a menções favoráveis nas redes sociais, “especialmente em razão da aparente reação positiva do mercado ao fortalecimento de sua candidatura”. Na sexta-feira (20), também ganham volume registros referentes às consequências da decisão do centrão para a organização de outras candidaturas, principalmente aquelas identificadas como de esquerda.
Outro desdobramento da adesão do bloco partidário a Alckmin são comentários sobre a possibilidade da presença de Ciro Gomes contra Bolsonaro em um eventual segundo turno. Mas a hipótese passou a ser crescentemente percebida, sempre segundo a análise, como um cenário improvável. “Sem o apoio do centrão e possivelmente mais distante da esquerda, o pedetista aparece como um nome ‘isolado’ no cenário eleitoral”, acrescenta a FGV.
Mesa quadrada
O mapa de interações foi estruturado com base em 10.214 retuítes sobre a aliança entre Alckmin e o centrão. Quatro principais grupos protagonizaram as discussões. O mais numeroso (destacado em azul escuro no infográfico abaixo) representa 40% das contas, é formado por perfis da chamada direita ideológica e vocaliza discurso de apoio a outro presidenciável, o deputado Jair Bolsonaro (PSL).
O grupo direitista também critica o eventual casamento entre Alckmin e o centrão – que sofreu um abalo com a recusa de Josué Gomes (PR) em compor chapa com o tucano e só será, de fato, sacramentado depois das convenções partidárias, cujo prazo-limite é 5 de agosto. Tais críticas têm como pilar a temática da corrupção, num contexto em que os defensores de Bolsonaro dizem que ele jamais fecharia acordo com o centrão.
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Os segundo grupo mais relevante (destacado em vermelho) reúne, majoritariamente, perfis alinhados à esquerda ideológicas. Mas o que norteia os comentários dessa corrente de internautas são debates sobre os impactos da aliança Alckmin/centrão na candidatura de Ciro Gomes. “Entre as publicações mais retuitadas, a maior parte critica Ciro como uma espécie de ‘camaleão’ político, ora buscando apoio no centrão, ora em Lula/PT. Também surgem discussões sobre uma possível necessidade de reação dos partidos de esquerda com o objetivo de fazer frente a Alckmin, que passaria a contar com tempo maior de TV”, diz a FGV.
A análise também destaca a presença da imprensa nos dois grupos restantes (destacados em laranja e amarelo no infográfico). No primeiro grupo, continua a FGV, a imprensa se associa a perfis também ligados ao mercado, em que a decisão do centrão é abordada como uma possível primeira vitória de Alckmin rumo a um segundo turno com Bolsonaro. “Neste núcleo, é recorrente a construção de uma narrativa que associa a aliança a uma reação positiva do mercado”, constata o estudo.
Por fim, a análise conclui que, no grupo amarelo, perfis de jornalistas e meios de comunicação expõem compartilhamentos de notícias que abordam desde a conquista de Alckmin até o realinhamento de Ciro em direção a partidos de esquerda após a “derrota” na queda de braço com o tucano.