Sensações funcionam como espécies de leituras da realidade a partir de pressentimentos captados pelos nossos sentidos e da percepção que se tem sobre uma determinada situação real ou imaginária. As sensações afetam as emoções, influenciam nas formas pelas quais traduzimos e interpretamos o mundo e causam impacto nas decisões tomadas e ações desenvolvidas.
Mas o que elas têm a ver com a nossa realidade política? De que maneiras as sensações podem ser usadas estrategicamente ou manipuladas para influenciar o voto e a atuação dos agentes políticos nos mandatos e nas campanhas?
Imagine um governador candidato à reeleição em um estado com altos índices de assalto e violência. A sensação de insegurança da população pode ser explorada por um candidato de oposição em busca de votos. Essa sensação pode ser maior ou menor a depender do quanto seja propagada.
As sensações são usadas também como principal fonte de matéria-prima usada na fabricação de consensos e de realidades paralelas, como nos casos da sensação de que a Petrobras quebrou, a sensação da existência do kit-gay e da mamadeira de piroca ou a sensação de retorno do comunismo.
Leia também
Agora perceba uma coisa importante: se um eleitor vota com base na equação mental que ele constrói a partir de suas próprias sensações acerca da realidade e um político eleito, com base nelas, toma decisões estratégicas na sua campanha ou no exercício do mandato, é possível deduzir que a capacidade de manipular sensações – individuais ou coletivas – pode se converter numa importante moeda política.
PublicidadeVamos a mais exemplos? as redes e mídias sociais têm ganhado cada vez mais espaço como ferramenta de manipulação das sensações humanas, com finalidade não apenas comercial, mas, claramente política. O papel que outrora era desempenhado pelos tradicionais veículos de comunicação do país, agora tem sido desempenhado principalmente por essas plataformas, chegando à palma da mão do eleitor através do microdirecionamento de publicidade de acordo com o seu perfil psicológico. Com tudo isso, um dilúvio de fake news nas redes sociais, tende a ser mais eficiente e eficaz que um bombardeio contra um candidato no Jornal Nacional.
No caso dessas plataformas, há a influência orgânica e a intencional, por meio de impulsionamentos privados ou da não neutralidade das plataformas – são empresas privadas estrangeiras e, como tais, têm seus próprios interesses – e tem condições de facilitar ou frear a propagação de qualquer conteúdo nas redes ou mesmo distribuir pró-ativamente o que for do seu interesse. Toda essa influência se amplia nas bolhas, que são os grupos fechados em torno das mesmas tendências ideológicas, como os grupos de WhatsApp e Telegram.
Um exemplo desse caso é a sensação de poder combater quem você acredita representar o mal na política: isso pode se transformar num estímulo à propagação de quaisquer notícias, inclusive falsas, e pode ser amplificado pela sensação de pertencimento, caso você seja integrante de uma dessas bolhas.
Além disso, os canais de mídias tradicionais digitais também podem ser usados para propagar o resultado de uma pesquisa eleitoral, amplificando ou minimizando o impacto de um resultado real ou distorcendo esses resultados. Tal estratégia tem o potencial de estimular a arrecadação de recursos financeiros em favor do candidato que esteja com chances de vitória, serve para animar ou esmorecer militância a depender do resultado e ajuda a captar o voto útil daqueles que costumam votar em quem acreditam que vai ganhar, como pode ser usado para pressionar um candidato a ceder um lugar na chapa em favor de outro, ou a forçar que esse candidato amplie o seu leque ideológico agregando outros apoiadores e faça concessões em troca de apoio, pela sensação de medo de ser derrotado.
Para exemplificar, basta lembrar que a sensação comum em todo o país, meses atrás, de acordo com as pesquisas, era a tendência da vitória do ex-presidente Lula em primeiro turno. Esta sensação provocava desânimo entre os partidários do principal adversário, o presidente Bolsonaro, e os entusiastas da terceira via. Neste momento de publicação do artigo, 23 de março de 2022, “repentinamente” a sensação propagada é a de uma eleição mais acirrada.
O impacto dessa sensação põe em atenção os partidários do ex-presidente Lula, que buscam ampliar o leque de alianças, reanima a militância de Bolsonaro, que aumenta as concessões políticas usando a máquina do governo e esmorece mais ainda a tentativa de formação da terceira via.
Perceba: o tempo todo estamos lidando com sensações e emoções que impactam diretamente nas crenças, na percepção de realidade, nas ações dos agentes políticos e dos militantes e no apoio ou reprovação da população em geral. Por isso, é preciso ter cuidado, pois a construção das realidades paralelas está no ar vide nosso artigo sobre metaverso no Congresso em Foco e já provoca diariamente, de modo imperceptível, a alteração dos sentidos e a manipulação das emoções.
Para finalizar, algumas perguntas podem ser feitas a título de reflexão: é possível diferenciar sensações amparadas na realidade de sensações manipuladas artificialmente nos laboratórios políticos? Como não se deixar enganar?
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
Deixe um comentário